Passar a noite mais fria do ano em São José dos Ausentes requer alguma coragem, mas enfrentar os -3,1°C da madrugada deste sábado (6) dentro de uma barraca, no topo de colinas à beira dos cânions do interior do município, é só para os fortes. Foi o que fizeram cerca de 150 participantes do 4º Encontrão Trip Montanha, evento de esportes na natureza do maior grupo de montanhismo do Sul do Brasil.
Para as atividades deste fim de semana, que incluem trilhas, salto de pêndulo e voo de balão, eles chegaram na tarde de sexta-feira e, de cara, encontraram dificuldades para montar as tendas sob uma temperatura abaixo de zero e com vento cortante. Montanhista experimentado, acostumado aos frios extremos da Patagônia, Rodrigo Alcine, 38 anos, precisou de duas horas para deixar a barraca em condições. Teve de desistir de montá-la em um ponto com paisagem de tirar o fôlego.
— Estava frio demais, padrão gringo, e o vento deitava a barraca — relatou.
A solução foi instalar-se em um local mais abrigado. Para passar a noite, o morador de Curitiba usou um saco de dormir apropriado para temperaturas de até 14 graus negativos, colocado sobre um outro saco de dormir térmico, para garantir o isolamento do chão gelado.
— Eu estava preparado, mas o frio realmente surpreendeu. Não dá para fazer esse tipo de coisa sem estrutura, não pode vir "na louca" — ressaltou.
Perto da barraca de Alcine, junto a um tanque de água para cavalos que ficou com uma camada de três centímetros de gelo na superfície, um grupo de cinco campistas sofria para tentar acender o fogo e preparar café quente às 8h deste sábado. Eles haviam se conhecido na sexta-feira, em um grupo de WhatsApp do Trip Montanha, e combinaram de alugar um carro em conjunto para seguir até o topo dos Aparados da Serra.
Saíram de Porto Alegre à noite e chegaram a Ausentes durante a madrugada. Montaram suas barracas, mas não dormiram.
— Se a gente dormisse, não acordava mais. Ficamos dentro da barraca bebendo vinho e jogando "Verdade ou Consequência", o que ferrou nossa vida — disse Camila Ferreira, 24 anos.
Para aguentar o frio, todos os integrantes do quinteto usavam pelo menos duas meias e duas calças, mas Gabriel Baldo, 30 anos, preferiu usar três de cada — a terceira meia ele precisou tomar emprestada de Viviane Spengler, 33 anos, porque não estava sentindo os pés.
Apesar das condições climáticas extremas, com os termômetros incapazes de marcar temperatura positiva, o quinteto estava faceiro com a experiência.
— Vale pelo cenário, pelo nascer do sol incrível e pelas pessoas que se conhece — disse Viviane.
O carioca Roberto Castilho, 42 anos, destacou o momento único, em que era possível "desapegar de coisas fúteis e ter um encontro consigo mesmo".
— O frio é só um detalhe — acrescentou.
Camila concordou:
— Metade é psicológico. E a gente quer frio, quer neve. Dá pra escrever um livro depois.