ELY, Nevada – Uma equipe de cinco zoólogos usando macacões, capacetes e lanternas de cabeça subiu os flancos de uma montanha coberta de zimbros e ultrapassou fortes barras de aço para entrar em uma mina abandonada que os morcegos usam como hibernáculo.
Enquanto o grupo se embrenhava terra adentro por um longo túnel estreito e escuro, as luzes ocilantes das lanternas escaneavam as rachaduras e fendas nas paredes. Quando alguém via um morcego – mamífero castanho do tamanho de um camundongo –, tirava-o com cuidado da parede e colocava-o numa bolsa branca de pano. O Townsend de orelhas compridas e o Western de pés pequenos são as duas espécies mais abundantes por lá. Um grande morcego marrom solitário também foi coletado.
Um dos morcegos, perturbado com a algazarra científica, saiu voando e as lanternas iluminaram suas asas membranosas, finas como um négligé.
Na inspeção feita em novembro, os morcegos estavam na fase de pré-hibernação, pendurados na parede de rocha cinzenta pelas pequenas garras que são os pés, respirando suavemente. Agora estão em hibernação profunda.
"São biologicamente interessantes", disse Catherine G. Haase, pesquisadora de pós-doutorado na Universidade de Montana, enquanto segurava carinhosamente um dócil morcego. "E são muito fofinhos."
Fofinhos, interessantes e com um futuro totalmente incerto. Uma doença virulenta entre os morcegos, chamada de síndrome do nariz branco, é invasiva, fúngica e está se alastrando rapidamente pelo oeste. A incursão é parte de um esforço continental, do Canadá a Oklahoma, para sondar as minas e cavernas na esperança de descobrir como a doença vai evoluir quando atingir a população nativa.
"A síndrome do nariz branco representa uma das doenças do nosso tempo mais nocivas para a fauna", escreveram os autores de um recente artigo publicado na "mSphere", uma revista da Sociedade Americana de Microbiologia. Desde 2006, "a doença matou milhões de morcegos e ameaça extirpar ou extinguir várias espécies que antes eram abundantes".
A síndrome do nariz branco, causada pelo fungo Pseudogymnoascus destructans (Pd), recebe esse nome devido às manchas felpudas que surgem no nariz e nas asas dos morcegos.
Nos últimos dez anos, órgãos estatais, federais e tribais, juntamente com ONGs, vêm trabalhando no país todo para tentar se adiantar à doença e encontrar um remédio que salve as 47 espécies de morcegos da América do Norte. Até o momento, a síndrome está vencendo os esforços.
Após apanhar uns 30 animais das paredes da mina, os pesquisadores trilharam o túnel de volta, puseram os macacões em sacos plásticos para higienização e lavaram os capacetes e outros equipamentos com álcool para evitar que o fungo se disseminasse acidentalmente, caso estivesse presente.
A seguir, levaram os sacos com sua minúscula coleta para um pequeno trailer sem janelas, equipado com um aparelho de ressonância magnética para animais e um respirador com dúzias de tubos plásticos transparentes emaranhados, para pesar e realizar várias medições dos morcegos.
"Essa pesquisa nos informará quais morcegos serão suscetíveis e quais serão resistentes, e fornecerá dados para uma estratégia de conservação e intervenção", afirma Sara H. Olson, diretora associada de saúde da WCS (Sociedade de Conservação da Vida Selvagem).
"A síndrome do nariz branco representa uma das doenças do nosso tempo mais nocivas para a fauna"
A doença foi descoberta numa caverna no condado de Schoharie, nos arredores de Albany, Nova York, em 2006; é provável que tenha sido trazida inadvertidamente da Eurásia. Desde então, o agente patogênico se espalhou por pelo menos 36 estados e sete províncias do Canadá, matando colônias inteiras de morcegos. Há relatos de pesquisadores que dizem ter visto cavernas com o chão totalmente coberto de carcaças de morcegos, às vezes muitos milhares em uma única caverna. Até agora, mais de 6 milhões de morcegos morreram no Canadá e nos EUA.
Essa perda pode ter sérias consequências: os morcegos têm um importante papel ecológico na polinização de plantas em alguns lugares e no controle de mosquitos e outros insetos.
Depois de devastar a maior parte da Costa Leste e de contaminar uma região isolada na periferia de Seattle, a síndrome do nariz branco está se dirigindo para o oeste no ritmo de até um estado por ano, e apareceu no extremo leste da região, matando morcegos em Dakota do Sul, Oklahoma e no leste do Wyoming.
Isso significa que em alguns anos poderá atingir os milhares de cavernas e minas abandonadas das Montanhas Rochosas, o reduto dos morcegos hibernantes. "Morcegos hibernantes são mais passíveis de ser afetados pela síndrome do nariz banco" diz Jonathan Reichard, coordenador-assistente do programa sobre a síndrome do nariz branco pelo USFWS (Serviço de Vida Aquática e Selvagem).
Biólogos já começaram a inspecionar cavernas no oeste para o caso de haver novas infecções durante este inverno.
Ainda falta muito por saber sobre a síndrome, bem como sobre o comportamento e as características dos morcegos. Ecologicamente, a vida dos morcegos na aridez do oeste difere daquela nas regiões mais úmidas do leste. Cientistas acreditam que a chave para elaborar uma estratégia de combate à doença requer uma melhor compreensão da fisiologia de hibernação dos morcegos.
Mas, embora a doença mate tantos animais, alguns especialistas acreditam que o esforço para tratar – ou até pesquisar – a doença é equivocado, um desperdício de dinheiro que pode mais prejudicar que ajudar.
A NSS (Associação Nacional de Espeleologia), um grupo de exploradores de cavernas que também estudam e trabalham pela conservação das cavernas, se opõe a esse tipo de trabalho, especialmente ao fechamento geral das cavernas para o público na tentativa de impedir a propagação da doença. "Condenamos essa prática", escreveram numa carta ao então secretário do Interior, Ryan Zinke, no ano passado.
Merlin Tuttle, um texano especialista em morcegos, também acha que essas colaborações entre agências para conter a doença são imprudentes e podem causar danos aos morcegos. Ele considera que interromper a hibernação aumenta o estresse no momento em que estão mais vulneráveis.
"Não há a menor possibilidade prática de diminuir ou acabar com a infestação, de acabar com ela na natureza, pois milhares de ninhos já estão contaminados", declara. "Deve-se deixar que siga seu ciclo natural. Estamos apenas desperdiçando recursos tentando encontrar a cura. Deveríamos estar usando nosso dinheiro para proteger ao máximo os morcegos que sobreviveram e ajudá-los a recuperar e reconstruir a população."
Na fase de dormência, de novembro a abril, os morcegos estão em estado de torpor, quando a atividade fisiológica – batimento cardíaco e respiração – fica lenta por três semanas seguidas. A frequência cardíaca de 750 batimentos por minuto em vigília cai para 150 durante o torpor. Então, por dois dias, eles acordam para beber água, acasalar e tratar de outros assuntos, antes de pegar no sono novamente.
No entanto, os morcegos infectados acordam uma vez por semana em vez de a cada três semanas, porque a doença do nariz branco causa desidratação e eles têm de beber água. Embora esse período acordado seja curto, há mais dispêndio de energia.
"Durante o torpor eles quase não gastam energia", informa Nathan W. Fuller, biólogo do Texas com pós-doutorado, que faz parte da equipe, enquanto prepara os frascos com tubos de plástico para colocar os morcegos e medir as inalações e exalações. "Durante a vigília, eles queimam muita. Embora sejam apenas 5% do tempo, são 95% da energia. A questão central é a frequência dos períodos de vigília."
O dispêndio a mais de energia esgota a gordura que armazenam para sobreviver à hibernação e eles vão ficando esqueléticos durante a dormência. Podem morrer na caverna, ou então, morrendo de fome, deixam a caverna cedo demais para procurar comida, e só encontram um mundo coberto de neve, num inverno em que não conseguirão sobreviver.
É por isso que a equipe gastou tanto tempo e dinheiro em equipamento hipersensível de primeira linha para desvendar os segredos da hibernação dos morcegos. "Podemos tirar a respirometria de uma única mosca-das-frutas", comenta Fuller com orgulho perante a torre de aparelhos que compõem o respirômetro.
Além disso, os pequenos mamíferos são colocados num longo tubo transparente de plexiglass e enfiados na ressonância magnética. Em apenas alguns minutos, medem-se os níveis de massa muscular, gordura e água.
Uma vez colhidos os dados de referência, "em áreas como esta – aonde o vírus ainda não chegou –, podemos chegar a um modelo preditivo baseado em ecologia, fisiologia, genética e química da epiderme", informa Reichard.
Os biólogos têm considerado a possibilidade de colocar comida nas cavernas, ou alimentar os morcegos com probióticos ou eletrólitos, ou aplicar tratamentos químicos para matar o fungo na pele. Já falaram em desumidificadores. Em alguns lugares, encheram cavernas com nuvens de antifúngicos como o B-23, produzido a partir das hastes de abacaxi selvagem.
Um tratamento promissor que está sendo testado é expor os morcegos infectados à luz ultravioleta. "A luz UV mata o fungo no laboratório, mas não temos um método viável na prática", diz Reichard.
Tuttle adverte que experimentos desse tipo podem dar errado. "O uso de um mata-fungo vai matar outros fungos ou micro-organismos na caverna, e isso causará outras reações em cadeia, e depois problemas muito maiores do que os iniciais." O morcego tratado também pode ser reinfectado.
Enquanto os pesquisadores se concentram no aqui e agora, há a expectativa de que o aquecimento global venha a desempenhar algum papel no futuro dos morcegos e talvez no dessa doença, embora ainda seja cedo para saber qual.
"A temperatura dentro de uma caverna é a mesma que a temperatura externa média", diz Fuller. "Portanto, à medida que vai esquentando, o morcego usará mais energia, mesmo estando em torpor. A mudança climática terá um papel importante."
Por Jim Robbins