A queda na busca por carteiras de habilitação para carros e motos já era esperada pelo Detran-RS. Afinal, o ano foi marcado pela pandemia e Centros de formação fechados por quase dois meses. Entretanto, um dado surpreendeu a autarquia: a procura por carteiras do tipo AB. Um levantamento identificou que o número de pessoas que buscaram Centros de Formação de Condutores (CFCs) para tirar pela primeira vez a Carteira Nacional de Habilitação (CNH) do tipo AB (para motocicletas e carros) em 2020 é o maior dos últimos seis anos. O dado integra um estudo feito pelo órgão a pedido de GZH.
De acordo com o levantamento, entre os meses de janeiro e novembro de 2020, 25.964 pessoas se inscreveram para realizar os testes do tipo AB, que dá aos aprovados habilitação para conduzir motos e carros. O número é 29,1% superior ao mesmo período de 2019, quando 20.109 pessoas também se inscreveram para obter a CNH do mesmo tipo.
Houve queda, porém, nos índices de pessoas que obtiveram as habilitações apenas para um dos veículos. A procura por CNH do tipo A (motos) caiu 11,8%, e do tipo B (carros), 2,7%
O Detran acredita que a busca por recolocação no mercado de trabalho, aliado às multas por demissões sem justa causa no FGTS, podem ter ocasionado esse crescimento. Para o chefe da Divisão de Habilitação do Detran, Jonas Bays, as possibilidades de novos empregos ajudam que procura por CNH do tipo AB.
— Muita gente perdeu o emprego, mas recebeu um seguro e aproveitou para fazer a carteira. É possível fazer essa leitura. Ter habilitação é um fator importante — disse.
Ainda conforme Bays, como muitas atividades ficaram por um longo período suspensas (aulas de escolas e universidades, por exemplo), o que proporcionou mais tempo para as pessoas se dedicarem à procura pela habilitação de carro e moto.
— As pessoas estão com mais tempo. Quem faz essa primeira habilitação geralmente é quem é mais jovem —complementou.
Investimento e oportunidade
A pandemia de coronavírus mudou a vida de Juliano Alves Stefenon, 35 anos. Ele atuava há sete anos como cobrador em uma empresa de ônibus de Porto Alegre. Com a queda na demanda, a companhia demitiu funcionários no final do mês de março, e ele acabou desempregado.
Com o dinheiro da rescisão, decidiu não ficar parado. Juliano investiu na carteira de habilitação do tipo AB. O objetivo era abrir novas oportunidades de emprego, ou como autônomo, ou em algum trabalho com carteira assinada.
—Fui demitido e investi o dinheiro. Comprei uma moto e decidi fazer a habilitação A e B. Ainda preciso aguardar a carteira permanente, mas é uma forma de abrir novas portas como vendedor, representante, motoboy ou motorista de aplicativo, por exemplo. Depende, é claro, de passar da carteira provisória para a carteira permanente, mas é importante — cita ele.
De acordo com a coordenadora do Departamento de Relações com o Mercado de Trabalho, da Fundação Gaúcha do Trabalho e Assistência Social (FGTAS), Ana Rosa Fischer, a carteira de habilitação abre oportunidades, especialmente para vagas como representante comercial e vendedor. Ela ressalta, entretanto, que qualificações são importantes no geral.
— Além daquele mercado informal, de aplicativos e entregas, aparecem vagas de vendedor pracista, algo que exige carteira de motorista. É um trabalho formal, mas não com as garantias de um emprego. A pessoa tem comissões e vai ganhar pelas vendas. Além disso, vagas para caminhoneiros são comuns de aparecerem aqui conosco, especialmente de longa distância – comentou.
Dinheiro e tempo para tirar a carteira
A perda do emprego diante da pandemia foi a oportunidade encontrada pela técnica de enfermagem Andreza Santos, 23 anos, para ir atrás do objetivo da CNH. Moradora de Porto Alegre, ela atuava há um ano e 10 meses no Hospital São Lucas, da PUCRS. O valor da rescisão do contrato de trabalho foi direto para a habilitação.
– A redução do quadro do hospital fez com que eu fosse desligada. E com esse dinheiro da rescisão, consegui pagar a carteira à vista. Se eu não tivesse sido demitida, eu não conseguiria fazer tão cedo. Sempre tinha uma coisa ou outra para fazer – disse.
Apesar da dificuldade para marcar as aulas, o tempo de sobra foi importante, pois Andreza não queria ficar parada em casa. A realização de atividades teóricas online também permitiu que ela avançasse rapidamente.
– Eu fiz todas as aulas online. Eles facilitaram bastante em relação a fazer duas aulas. Em seis dias, eu fiz 12 aulas. Eu tinha tempo, eu estava em casa – ponderou.
Procura pela primeira CNH tem elevação de 0,8%
Um dado que chamou atenção do Detran-RS diz respeito ao número de pessoas que procuraram, de forma geral, os Centros de Formação de Condutores (CFCs) no Estado para realizarem a primeira habilitação. Segundo levantamento da autarquia, foram abertos 0,8% mais Registros Nacionais de Carteira de Habilitação (Renachs) entre janeiro e novembro de 2020 do que no mesmo período do ano passado. Também houve procura maior pelas carteiras C, D e E, para pessoas que já possuem uma habilitação.
Entretanto, a emissão total de CNHs entre janeiro e novembro de 2020 teve queda na comparação com 2019. Isso se deve principalmente em razão do atraso das aulas teóricas e práticas por causa do fechamento de CFCs por quase dois meses.
Para Anderson Zimmer, tirar a carteira em meio à pandemia tornou-se fundamental no trabalho. Morador de Gravataí, ele trabalha com o irmão administrando uma distribuidora de botijões de gás. Em dezembro do ano passado, Anderson decidiu fazer a carteira de habilitação do tipo D. Durante 2020, a demanda por gás de cozinha aumentou bastante, e o administrador também passou a fazer as entregas dos botijões.
– A ideia era tirar mais para cobrir as férias de alguém, ou quando precisasse. Com a pandemia, as pessoas ficaram mais em casa. E daí precisaram de mais botijões. Então, foi muito bom já estar com a carteira, porque eu consigo administrar a empresa e fazer as entregas – comentou.
A primeira habilitação é voltada para pessoas que nunca dirigiram e buscam tornar-se aptas a dirigir carros e/ou motos. Depois, o motorista pode fazer outros cursos para incluir mais categorias. Se um condutor tem carteira para dirigir veículos de duas rodas, ele pode procurar o serviço para se habilitar a conduzir veículos leves de quatro rodas, por exemplo.
Já a mudança de categoria diz respeito a pessoas que já possuem, pelo menos, a carteira B (para veículos leves). Com as qualificações, o condutor poderá ainda dirigir veículos das categorias C (veículos de carga), D (transporte de passageiros) e E (todos os veículos de quatro rodas ou mais, e caminhões com veículos com unidades acopladas).