Correção: em 10 anos, o DPVAT indenizou mais de 4,5 milhões de acidentados, e não mais de 4,5 mil como publicado entre 19h18min de 11 de novembro e 11h46min de 12 de novembro de 2019. O texto já foi corrigido.
O presidente Jair Bolsonaro decidiu extinguir, por meio de uma medida provisória, o seguro obrigatório de veículos, o Dpvat.
Em 10 anos, o seguro foi responsável pela indenização de mais de 4,5 milhões de acidentados no trânsito brasileiro (485 mil desses casos foram fatais). Além de indenizações por mortes, o seguro também cobre gastos hospitalares e sequelas permanentes.
Nos casos de morte, o valor da indenização é de R$ 13.500 e de invalidez permanente, de R$ 135 a R$ 13.500. Já para os casos de reembolso de despesas médicas e suplementares, o teto é de R$ 2.700 por acidente.
Bolsonaro também extinguiu o Seguro de Danos Pessoais Causados por Embarcações (DPEM), seguro voltado a danos pessoais causados por embarcações. Segundo o ministério, esse seguro está sem seguradora que o oferte e inoperante desde 2016.
De acordo com o governo, a extinção ocorre para evitar fraudes e amenizar os custos do setor público com a manutenção do seguro, atendendo a uma recomendação do Tribunal de Contas da União (TCU).
Só em 2018 foram identificados 12 mil fraudes ao seguro. O custo total do seguro ao governo federal é de R$ 8,9 bilhões. O governo estima que seriam necessários R$ 4,2 bilhões para cobrir os valores pagos às vítimas. Outros R$ 4,7 bilhões seriam referentes à administração e fiscalização do recurso.
Segundo o governo federal, as vítimas e acidentados no trânsito brasileiro (só de mortes são mais de 36 mil por ano), continuarão assistidos pelo SUS, pelo INSS e pelo Benefício de Prestação Continuada (BPC).
Conforme a Seguradora Líder, gestora do seguro, do total do valor arrecadado atualmente, 45% é destinado para o Sistema Único de Saúde (SUS) "para custeio da assistência médico-hospitalar às vítimas" e 5% para o Departamento Nacional de Trânsito (Denatran), para "investimento em programas de educação e prevenção de acidentes de trânsito".
Pela proposta, os acidentes ocorridos até 31 de dezembro de 2019 continuam cobertos pelo Dpvat. A gestora do seguro permanecerá responsável até 31 de dezembro de 2025, pela cobertura dos sinistros ocorridos até 31 de dezembro deste ano, quando o benefício será extinto.
Segundo o Ministério da Economia, o "valor total contabilizado no Consórcio do Dpvat é de cerca de R$ 8,9 bilhões, sendo que o valor estimado para cobrir as obrigações efetivas do Dpvat até 31/12/2025, quanto aos acidentes ocorridos até 31/12/2019, é de aproximadamente R$ 4,2 bilhões".
De acordo com a pasta, o valor restante, cerca de R$ 4.7 bilhões, será destinado, em um primeiro momento, à Conta Única do Tesouro Nacional, em três parcelas anuais de R$ 1.2 bilhões, em 2020, 2021 e 2022. As parcelas seriam suficientes, segundo o governo, para compensar as estimativas de repasse ao SUS e ao Denatran, em atendimento a Lei de Responsabilidade Fiscal.
O seguro
Atualmente, para receber o benefício, é preciso apresentar à Seguradora Líder, gestora do seguro, documentos como atendimento médico e boletim de ocorrência que comprovem o acidente.
Em 2018, conforme a Líder, a parcela destinada ao SUS totalizou R$2,1 bilhões. Para o Denatran, foram R$233,5 milhões. Nos últimos 11 anos, essa destinação soma mais de R$ 37,1 bilhões, diz a seguradora.
Para o governo, "a medida provisória não desampara os cidadãos no caso de acidentes, já que, quanto às despesas médicas, há atendimento gratuito e universal na rede pública, por meio do SUS (Sistema Único de Saúde)".
"Para os segurados do INSS (Instituto Nacional do Seguro Social), também há a cobertura do auxílio-doença, aposentadoria por invalidez, auxílio-acidente e de pensão por morte", acrescentou o ministério.
Criado em 1974, o seguro obrigatório tinha como objetivo criar uma ampla rede de pagadores os donos dos veículos responsáveis pela indenização de qualquer vítima do trânsito, inclusive pedestres.
Para Ernesto Tzirulnik, presidente do Instituto Brasileiro de Direito do Seguro, essa foi a principal virtude para a criação do Dpvat, num país com baixo volume de contratação de seguros.
Ele elogia também o fato de o seguro não levar em conta quem foi o responsável por causar o acidente ao pagamento das indenizações.
Para Tzirulnik, porém, o seguro se tornou uma grande máquina de arrecadação e que não necessariamente tinha os seus recursos aplicados em benefício dos acidentados. Para ele, os gargalos do seguro se acumularam ano após ano.
— As indenizações são pífias, existem muitos intermediários que atuam no setor sem qualquer necessidade, custo operacional alto e gasto de energia alto da seguradora ao tentar questionar judicialmente que uma vítima não merecia o valor requisitado — enumera.
Tzirulnik defende que uma reforma no sistema era possível, antes que o seguro fosse extinto de vez.
Luiz Carlos Mantovani Néspoli, superintendente da Associação Nacional de Transportes Públicos (ANTP) lamenta que ainda não estão claros os motivos que fizeram o governo federal extinguir o seguro. Para ele, é preciso ter segurança sobre os efeitos às vítimas de trânsito.
— É preciso entender a qual o custo que o cidadão terá em nome de não pagar mais o seguro obrigatório. Será que as pessoas no trânsito continuarão a ser atendidas por outros seguros? — questiona.
Para Maurício Januzzi, ex-presidente da comissão de direito de trânsito da OAB de São Paulo, o fim do seguro obrigatório é salutar pela desoneração ao motorista. Januzzi também critica o Dpvat por ser muito burocrático.
Aliada do presidente, a deputada Christiane Yared (PL-PR) diz acreditar que a extinção do seguro se deu por causa do alto índice de fraudes. Ela diz se preocupar, porém, com as famílias que utilizam o recurso para dar um funeral digno às vítimas de trânsito.
— (Além disso,) Com todos os problemas que o Dpvat tem, ainda deixa para o país uma quantidade muito significativa de recursos para os hospitais que trabalham com sequelados. É realmente preocupante — disse.
A mudança foi feita por Medida Provisória (MP), ou seja, tem força de lei a partir de sua edição. A nova regra deve ser votada pelo Congresso, que pode modificá-la, em até 120 dias. Caso contrário, caduca; nesse caso, isso significa que voltaria a existir o Dpvat.