Um mês depois do acidente que devastou famílias inteiras de Porto União e União da Vitória, na divisa do PR com SC, dor e esperança são os sentimentos que unem as duas cidades de onde partiram as pessoas que se tornariam vítimas da maior tragédia rodoviária de Santa Catarina - foram 51 mortos, com oito sobreviventes.
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A dor, obviamente, ainda é mais visível. Em cada esquina ou comércio, alguém consegue dar nome e sobrenome ao sentimento, seja pelo parentesco, seja pela amizade ou até por ouvir e repetir as histórias de vida e sonhos que surgem sempre que se mergulha a fundo na lembrança de cada vítima da tragédia ocorrida em 14 de março em uma curva da Serra Dona Francisca.
- Ai que saudades da minha neta, meu Deus do céu!
A frase que ecoa pela casa da aposentada Ana Maria Pires, de 63 anos, é repetida a cada porta aberta. São três cômodos intocados na casa. Ana Maria perdeu a filha, de 43 anos, e a neta, de 23. A filha de Ana Maria era Sônia Regina Vieira, conhecida na cidade por jogar basquete em vários clubes de Santa Catarina, do Paraná e de São Paulo. A neta, recém-formada em pedagogia, era Lariana Regina Vieira, mãe do menino Arthur, último dos sobreviventes a receber alta, na semana passada.
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Caminhando de um lado para o outro da casa, Ana Maria não deixa passar um único detalhe dos três cômodos. Num quartinho, nos fundos da casa, estão as roupas da formatura de Lariana, bichos de pelúcia, vestidos e quadros.
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Lembranças
No quarto onde Lariana dormia, a cama está impecável, com a colcha estendida como ela deixou. Roupas nos armários, calçados devidamente guardados. E muitos bichinhos de pelúcia. É nesse lugar que Ana Maria passa o tempo todo falando com Deus.
- Eu não entendo por que uma menina tão linda perdeu a vida assim. Eu queria entender, mas não entendo - diz a avó, que ainda não consegue olhar os quadros com as fotos da filha.
Mas a casa também guarda um cômodo cheio de esperança. É num cantinho, perto da cozinha, onde estão os brinquedos do bisneto Arthur Vieira Telles de Abreu. Ele é o sobrevivente mais jovem do acidente, de um ano e nove meses, que deixou o Hospital Infantil de Joinville na semana passada.
Os carrinhos e a motoca que o levavam pela casa estão aguardando pela recuperação dele. Arthur ainda se recupera de lesões nas duas pernas. Ele estava no colo da mãe, Lariana, no momento do acidente. Bombeiros e socorristas acreditam que foi a proteção da mãe que o salvou.
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Lembranças em todos os lugares
Nas ruas dos bairros São Cristóvão, em União da Vitória-PR, e Santa Rosa, em Porto União, no lado catarinense, onde morava a maioria dos passageiros do ônibus, o acidente é o assunto principal em quase todas as conversas. Muitos familiares das vítimas se mudaram e as casas estão vazias.
- As famílias se uniram mais, todo mundo conhece alguém que perdeu um familiar, um namorado, um amigo - diz Claudete Libino, do São Cristóvão. Muitas casas têm laços pretos em sinal de luto.
O padre Levy Godói, que representou a Igreja Católica numa das cerimônias realizadas em homenagem às vítimas e que leu um e-mail enviado de Roma pelo papa Francisco, diz que é muito difícil se recuperar de uma perda tão grande e não há muitas palavras para confortar as famílias.
Segundo ele, é na fé, na esperança, na presença e no carinho dos que ficaram que os sobreviventes e familiares das vítimas vão reencontrando motivos para buscar a felicidade e acalmar a dor da perda.
- Se não há palavras que confortem, é importante a presença, o carinho, o estar junto - diz o padre.