Como será andar em um veículo na Lua ou em Marte? Quais tipos de ações e tecnologias devem ser empregadas para superar rochas, buracos e terrenos acidentados em outros mundos? Dificuldades enfrentadas por astronautas no satélite natural e por veículos no planeta vermelho serão simuladas por quatro alunos de Bagé, na Campanha, nos próximos dias. Isso porque o grupo gaúcho é o único representante brasileiro no Human Exploration Rover Challenge (Herc), da Nasa, a agência espacial dos Estados Unidos.
A competição anual estimula estudantes a desenvolverem protótipos de rovers, assim chamados os veículos de exploração espacial. Os gaúchos frequentam o curso técnico em Mecânica da Escola Estadual de Ensino Médio Frei Plácido. Eles embarcaram em Porto Alegre nesta sexta-feira (14) para Huntsville, no Alabama, para competir com outros 60 grupos de estudantes de 29 países.
— Tivemos vários desafios, foi difícil para todos, mas nos unimos, discutimos e conseguimos resolver os problemas. Representar o Brasil nos Estados Unidos já é, para nós, uma grande vitória — diz Carlos Eduardo Munhoz Ferreira, 18 anos, um dos pilotos do rover gaúcho.
No veículo, Carlos Eduardo terá a companhia de Isabélli Marques, 16 anos, que viu a oportunidade da competição no site da agência espacial e estimulou a criação do projeto. A jovem é dona do perfil @lugardeciencia, no qual trata de assuntos sobre o universo científico.
— Meu sonho é ser astronauta, então nada melhor do que participar de uma competição organizada pela Nasa — resume a estudante.
Isabélli e Carlos Eduardo serão os responsáveis por guiar o rover. Entre segunda-feira (17) e quarta-feira (19) ocorrerão as montagens e os ajustes do veículo. A competição, que terá três provas entre os dias 20 e 22, será transmitida pelo canal Nasa TV. O grupo retorna com o rover ao país no fim do mês.
— Estou me sentindo nervosa, mas muito feliz. É a realização de um sonho, nunca imaginei ir para os Estados Unidos aos 15 anos. A exploração espacial não me chamava atenção, gostava mais de matemática. Aí chegou a Isa (Isabélli), que gosta muito de Nasa, do espaço, e, no fim, acabei gostando também — disse Sofia Cuadros, 15 anos, antes do embarque no Aeroporto Salgado Filho.
Os jovens tiveram o projeto aprovado em outubro do ano passado. Depois disso, construíram o veículo movido a pedaladas para a competição nos Estados Unidos. Finalizado há cerca de um mês, o protótipo foi enviado por uma transportadora e deve chegar aos Estados Unidos na próxima semana. O equipamento foi batizado de "Robotchê" após votação nas redes sociais.
— Ajudei na montagem, no desenvolvimento das peças. A parte da roda foi muito complicada, porque a gente tinha de aquecer o material (alumínio) e não bater forte para não amassar, porque, se amassasse, era preciso refazer o processo. Sabemos que será difícil ganhar, porque há grandes competidores, mas vamos tentar. Passamos as férias no projeto, mas é algo que valeu a pena — acrescenta Bernardo Freitas, 15 anos.
A escola Frei Plácido tem cerca de 1,8 mil alunos do curso técnico em Mecânica integrado ao Ensino Médio. Os quatro estudantes foram coordenados pelo professor Rodimar de Oliveira, que não pôde viajar com o grupo devido a um problema de saúde. Por isso, Sonia Trindade, diretora da escola, acompanhará os jovens na competição.
— Estamos orgulhosos, pois é uma equipe da escola que vai representar o Estado e o Brasil lá fora. Os alunos abriram mão das férias, desde novembro estão trabalhando nesse projeto e conseguiram concluir. É um grande mérito — afirma a professora.
Após a aprovação do projeto, os alunos fizeram uma “vaquinha” para custear a ida para o exterior e a construção do veículo. No entanto, o governo estadual ajudou a escola com as despesas, que segundo a diretora, foram de cerca de R$ 300 mil. O estudantes pagaram apenas a emissão dos documentos para a viagem.
Como será o desafio
A competição exige que dois alunos, pelo menos uma mulher, usem o veículo para percorrer um percurso de cerca de 800 metros. O deslocamento é feito em um campo que simula detritos de asteroides, pedregulhos, erosão e fendas. Não é qualquer protótipo que pode participar: os rovers devem caber em uma área com no máximo de 5 pés (1,5 metro) de comprimento por 5 pés de altura por 5 pés de volume.
As medidas respeitam o armazenamento do módulo de pouso da missão Apollo 14, responsável pela terceira visita do homem à superfície lunar, em 1971. As regras do concurso também dialogam com a logística da exploração do satélite da Terra. As equipes terão oito minutos no percurso, o que simula um hipotético tempo disponível de oxigênio para um explorador na Lua. Ou seja, o deslocamento ultrapassar o limite significa que os estudantes ficarão “sem ar” para respirar, o que resultará na perda de pontos.
A competição também se inspira na Apollo 15, que explorou a Lua em 1971, missão na qual os astronautas utilizam o primeiro veículo automotivo, o Lunar Roving Vehicle (LRV). Com este rover, a equipe conseguiu coletar mais amostras lunares do que nas duas missões anteriores. Além dos obstáculos, sem sair do rover, os estudantes têm de coletar líquidos durante o trajeto que são localizados em pontos de difícil acesso sem misturar o que foi captado.
O percurso é composto por 10 obstáculos e cinco tarefas de missão. Cada obstáculo terá um desvio, e as equipes poderão escolher tentar vencê-lo para obter pontos ou contorná-lo para não receber pontuação. Os vencedores serão os que tiverem mais pontos. Os vencedores das 14 categorias serão anunciados no dia 23. A Nasa não informou qual será a premiação dos primeiros lugares.