Um dos jogos mais conhecidos do videogame, o Street Fighter completa 35 anos nesta sexta-feira (12). Para muitos, ele inaugurou o gênero de luta na indústria dos games e foi capaz de criar personagens que se tornaram ícones da cultura pop, em uma trajetória que está distante do fim. Nesta data, os fãs esperam por uma novidade: o lançamento do Street Fighter VI, o que, segundo a Capcom, a dona da saga, deve ocorrer em 2023.
A história do jogo japonês se confunde com a evolução das plataformas: ele está presente nos fliperamas (ou arcades) populares nas décadas de 1980 e 1990 e nos mais modernos consoles de hoje.
Para entender o protagonismo nas últimas décadas, GZH conversou com fãs e desenvolvedores, que opinam sobre os motivos que levaram o jogo a se tornar um dos mais importantes da história.
O primeiro jogo da série foi desenvolvido para fliperamas e lançado em 1987. Nele, o guerreiro Ryu enfrenta adversários em sequência para se tornar o grande vencedor do torneio Street Fighter. A primeira versão já trazia golpes que se tornariam clássicos nas versões seguintes, como o hadouken e o shoryuken. As máquinas do jogo tinham dois botões, que, a depender da força com que se batia, o lutador aplicava um golpe fraco, médio ou forte. No gabinete havia uma segunda entrada, que podia ser utilizada por outra pessoa para escolher outro personagen, o Ken, e desafiar Ryu.
De acordo com Everton Baumgarten Vieira, CEO da Izyplay, uma empresa de desenvolvimento de jogos de Pelotas, no sul do Estado, a primeira versão não fez sucesso naquele momento, mas serviu de laboratório para o que é considerado o antes e o depois na história dos jogos de luta: o Street Fighter II.
Nele, o jogador enfrenta o adversário em combates de um contra um em séries de três rounds. Além de Ryu e Ken, outros seis personagens foram apresentados nessa versão, entre eles Blanka, um humano que sofreu uma mutação após sofrer um acidente de avião na floresta amazônica brasileira.
Para o desenvolvedor, a criação do segundo jogo foi um "salto gigante em tudo", que não ficou restrito a essa indústria: o sucesso do game migrou para outras plataformas, com a criação de histórias em quadrinhos, séries e filmes nos anos seguintes e garantiu a injeção de dinheiro para a sequência da saga. Havia, assim, um universo ligado ao Street Fighter.
Segundo o desenvolvedor, outra característica do jogo é que ele conseguiu se manter entre os mais importantes nos anos seguintes. Foi, também, base para que concorrentes, como o Mortal Kombat e o Tekken, fossem criados:
— Décadas depois, ele é referência de jogabilidade, de balanceamento e nas estratégias de lutas. Os concorrentes tinham o Street Fighter como exemplo e, mesmo assim, não conseguiram replicar a profundidade e a jogabilidade. Ele foi um marco na indústria, um jogo à frente do seu tempo — comenta.
Ele foi um marco na indústria, um jogo à frente do seu tempo
EVERTON BAUMGARTEN VIEIRA
Desenvolvedor de jogos e CEO da Izyplay
Outro destaque, para o desenvolvedor, é que o jogo foge da saída binária "de matar ou morrer", ao permitir que jogadores assumam a estratégia para o combate. Assim, com um único personagem é possível jogar de formas diferentes porque cada um tem uma forma própria de atacar e de se defender. Quando perguntado sobre o que mais lhe chama atenção na parte da jogabilidade, Everton entende que é uma característica apresentada desde o início, que melhora o confronto em qualquer situação, chamada de balanceamento.
— É difícil escolher dois personagens e ter certeza que as chances de vitória serão as mesmas. O Street Fighter garante isso: independentemente de qual seja o embate, o jogo será justo e ambos jogadores terão a mesma chance de ganhar. Isso é muito difícil de se fazer em um jogo — explica.
Alessandro Carlos Martinello, 36 anos, desenvolvedor de jogos e dono da Hammer Games, conheceu o Street Fighter aos sete anos. Hoje, quase 20 anos depois, diz aguardar ansioso o lançamento da nova versão. Para ele, o jogo foi capaz de dar as bases para o que seria desenvolvido na indústria nos anos seguintes e foi o responsável por dar o "último sopro de vida" dos fliperamas no país nos anos 1990.
— É um jogo icônico, que criou o gênero de luta moderna como conhecemos hoje, com um modo versus (que permite mais de um jogador), sistema de combo de golpes, estratégias, posicionamento de personagens e projéteis para atacar a distância. Foi um sucesso comercial e fez os outros copiarem essas ideias —diz.
Do bug surgiu a marca característica
Segundo ele, os famosos combos de golpes do Street Fighter têm origem no que seria um erro da segunda versão do jogo. Assim, sem querer, os criadores desenvolveram um dos movimentos mais conhecidos do videogame.
— Foi um defeito na programação. Eles (os desenvolvedores) foram testando e viram que isso deixava o jogo mais dinâmico e divertido. O principal fundamento nasceu de um "bug" e virou o principal tempero. Depois dessas regras, nasceu o jogo de luta moderno que é a possibilidade de fazer combo e lutar um contra o outro — explica.
— É um jogo icônico, que criou o gênero de luta moderna como conhecemos hoje
ALESSANDRO CARLOS MARTINELLO
Desenvolvedor de jogos e dono da Hammer Games
O jogo tem dezenas de spin-off (derivações), mas cinco versões são as consideradas cânones, numeradas de um a cinco. A última foi lançada em 2016. Nos 35 anos de trajetória, o jogo acumula distinções, e algumas fizeram parte do Guinness World Records de 2008, o livro dos recordes mundiais.
Nessa edição, o Street Fighter II foi considerado "primeiro jogo de luta usando combos", "jogo de luta mais clonado de todos os tempos" e "jogo arcade de lutas mais vendido de todos os tempos". De acordo com o Fandom, um site especializado em jogos, a segunda versão do jogo, de 1991, faturou US$ 17 bilhões (cerca de R$ 86 bilhões) em valores atualizados. Isso coloca o jogo na quarta posição entre os mais vendidos da história.
Vinicius Ribeiro dos Santos, 30 anos, acompanha a série desde criança. O designer gráfico relata ter tido diversos videogames desde os três anos e que o Street Fighter foi, desde o início, o que mais lhe agradou. Ele destaca dois entre os que mais gosta da série: o terceiro e o quinto.
— Para mim, o Street Fighter sempre significou a união com meus amigos. Quando eu era criança, cada um queria ficar melhor que o outro e treinávamos para isso. Vi o jogo pela primeira vez quando meu tio estava jogando. Fiquei louco, quis aprender os golpes, como funcionavam os botões. Hoje continua sendo um hobby para mim, e gasto bastante dinheiro com ele — pontua.
Quando perguntado sobre o que mais gosta no game, o designer cita duas características: a comunidade que hoje se relaciona com o jogo - o que envolve os próprios amigos e a parte profissional da indústria - e o equilíbrio do game, que garante uma boa experiência para os jogadores.
— É um jogo justo. Então, todos jogam no mesmo nível, todos têm o mesmo desafio e a curva de aprendizado. A pessoa acaba aprendendo a jogar com todos os personagens. Existem muitos termos técnicos, que é preciso saber. Então, para mim isso tudo torna a diversão melhor — comenta.
Um lugar com clima de nostalgia
Se para um fã o Street Fighter é sinônimo de diversão, para Rafael Dias Borges, 34 anos, o jogo é um dos motivos que o levou a abrir um negócio. Em 2020, Rafael e outros dois sócios criaram o Arcadea Gaming Pub, localizado no bairro Floresta, em Porto Alegre. O estabelecimento é inspirado no clima de nostalgia que os jogos antigos despertam nos fãs.
A casa tem diversos consoles, dos mais antigos ao mais modernos, e máquinas que simulam os fliperamas populares no passado. Um dos jogos disponíveis é o Street Fighter, que pode ser jogado em diversas versões.
— Era o jogo que eu mais jogava quando era moleque. Tinha em casa no videogame, mas no fliperama era mais divertido, porque era possível jogar com amigos e outras pessoas desconhecidas — diz.
O empresário relata que a época dos fliperamas mostrava um "lado mais inocente" dos jogos, porque a tecnologia estava distante de se tornar um mercado profissional, como ocorre hoje em muitos cenários. Assim, as reuniões juntavam quem conhecia e que queria aprender sobre o jogo, com o objetivo de se divertir. E o Street Fighter foi, conforme ele, o jogo que oportunizou essa "experiência agradável" com os amigos:
— Podem fazer milhares de jogos, mas nenhum deles será Street Fighter. Não há quem não conheça. Ele não é um jogo de luta, ele é o Street Fighter, tem uma categoria própria, está em um patamar diferente — pontua.