Por Daniel Marchi
Economista, membro do Instituto Carl Menger
Até o dia 14, o acesso à internet nos EUA era classificado pela Comissão Federal de Comunicações (FCC, na sigla em inglês) como "utilidade pública", o que incluía o chamado princípio de neutralidade das redes. Tendo sido implantada em 2015 pela FCC, sob administração Obama, essa medida foi revogada. Ela se junta ao pacote de desregulamentação da economia americana promovido por Donald Trump.
Como de costume, as notícias que envolvem serviços amplamente utilizados acabam por despertar debates passionais, nos quais muitos argumentos prevalecem mais pelo alarmismo do que pela razão. Não foi diferente nesse caso. De repente, toda a liberdade de circulação de informações nas redes passou a depender dessa norma aprovada dois anos atrás, e sua revogação seria o sinal verde para uma espécie de distopia empresarial para a internet. As grandes corporações americanas, agora, teriam todo o incentivo para cobrar preços mais altos ao consumidor final e filtrar as informações indesejadas.
Nada é mais falso. A bem da verdade, de meados dos anos 1990 até 2015 a internet se desenvolveu extraordinariamente baseada em princípios de livre concorrência. Um ambiente de inovação, respeito à propriedade e gestão eficiente permitiu que um leque incrível de serviços prosperasse, incluindo o sensível acréscimo de fontes de informação, bem como das redes sociais. Em mercados livres, é a demanda dos consumidores que guia os empresários.
Então veio a decisão da FCC em 2015. Por trás das boas intenções da imposição da "rede neutra", ela implicava, na prática, uma medida burocrática que vedava a gestão ativa e empresarial da infraestrutura de acesso. É, portanto, a própria antítese das razões que levaram ao contínuo progresso da rede mundial de computadores. É um instrumento de ingerência, burocratização e ameaça de judicialização de um setor que se desenvolveu, a contento, com base em relações de mercado.
Por fim, um lembrete sobre o caso brasileiro. Ao contrário dos EUA, cuja aplicação em 2015 se deu por uma decisão de sua agência reguladora (portanto mais fácil de ser revertida), aqui a neutralidade de rede se fez presente por meio de uma lei federal de 2014, o famoso Marco Civil da Internet. E as leis, por sua natureza congressual, são bem mais complicadas de serem revogadas por completo. Teremos a oportunidade de observar os frutos de cada contexto.