Eu não sei exatamente quando aconteceu. Só sei que, um dia, eu cheguei em casa e tinha muito tempo livre. Primeiro, fiz aquele movimento tradicional de zapear a TV olhando somente a tarja no rodapé mostrando a programação de cada canal. Nada me interessou. Segui então para a Netflix. Liguei o videogame, selecionei o aplicativo. Fui nos adicionados recentemente. Zapeei novamente. Humm. Nhé. Afff. Bah. Pfff. Voltei para o menu de seleção do console. Abri The Witcher 3. Meu coração palpitou e minhas pupilas dilataram.
Era essa a sensação que eu estava procurando. Era esse arrebatamento. Ali, naquele momento, tudo o que eu queria encontrar em um filme eu encontrei naquele jogo.
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Isso faz um tempo. Outros jogos vieram. Não abandonei o cinema nem as séries de TV. Mas sempre que eu quero algo que me instigue, algo que me faça salivar, eu vou para The Witcher. E nunca – repito, NUNCA – me decepciono. Em nenhum momento, seja trabalhando em uma tarefa paralela, seja cumprindo a missão principal, jamais quis estar em outro lugar – diferente do cinema ou da TV, que via de regra me empurram para o celular.
Mas por que? Por que um jogo, este jogo, The Witcher 3, causa esse efeito em mim? Efeito que antes era restrito ao cinema e a música? O que ele tem de certo que outros produtos audiovisuais apenas tateiam?
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Eu aposto no roteiro. Como jornalista, sou um contador de histórias. Logo, estou o tempo todo em busca de boas histórias para contar. E também quero ouvir boas histórias. The Witcher conta excelentes histórias, dezenas, centenas delas, originais, instigantes, emocionantes, espalhadas por quilômetros de cenário.
Mesmo as mais simples e corriqueiras – como encontrar a frigideira perdida de uma idosa ou encontrar alguém desaparecido na floresta – dizem algo a respeito daquele universo, de algum personagem, situação ou da própria condição humana. Não há linha desperdiçada no roteiro de The Witcher, tudo está alí por alguma razão.
A maioria das histórias cultiva também uma saudável área cinzenta. Ninguém é totalmente bom ou mau. Benevolência e mesquinhez podem coexistir tanto no pedido de destruição de um monstro que assola uma vila quanto no auxílio de uma noiva em encontrar seu amado. E cabe a você decidir o que fazer e arcar com as consequências das suas decisões – que serão boas ou ruins dependendo apenas de um ponto de vista.
Claro, essa interatividade não existe no cinema, mas ela não é o que me faz preferir abrir The Witcher ao invés da Netflix toda vez que ligo meu XBox. É a deliciosa sensação de descobrir os mistérios de um universo rico, contraditório, complexo, perigoso e desafiador como nenhum filme mais me parece fazer sentir. É compartilhar das suas histórias incríveis, de seus personagens capazes de qualquer coisa, porque humanos, demasiadamente humanos. É ser parte, de fato e de direito, da construção de uma jornada.
E vocês? Também sentem essa chave virando? Sentem que games estão preenchendo um espaço antes dedicado a alguma outra arte? Ou estão acomodando tudo numa boa? :)