As armaduras não parecem mais pesar uma tonelada. O senso de humor melhorou bastante. Mas quando o primeiro inimigo aparece e o brilho de um disparo é seguido pelo som de uma motosserra, não há dúvida: Gears of War está de volta.
Lançado há pouco, o quinto jogo da franquia e quarto título da saga chegou para fazer a necessária ponte entre a velha e a nova geração – de sistemas operacionais, de personagens, e, principalmente, de jogadores. E da mesma forma que Star Wars – O Despertar da Força, o faz de maneira triunfante.
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A história de Gears of Wars 4 já era conhecida antes do lançamento: 25 anos depois do fim da guerra contra os Locusts, os humanos vivem em relativa paz quando uma nova ameaça subterrânea emerge. Só que tudo – incluindo o próprio planeta – mudou. E não foi para melhor.
A vitória dos homens revelou-se uma Vitória de Pirro: eliminou os Locusts, mas quase causou também a extinção da raça humana. Com a população e a capacidade de gerar recursos reduzidas, a CGO (Coalizão dos Governos Ordenados) fez o que qualquer organização militar faria: instaurou uma ditadura, onde o contingente humano sobrevivente é obrigado a viver em acampamentos murados sob lei marcial – que, entre outras coisas, "incentiva" as mulheres a terem o máximo de filhos que puderem para repovoar o mundo.
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Quem não concorda com a nova ordem estabelece-se em povoados nas áreas selvagens do planeta e vira alvo da CGO. Ou seja, se nos primeiros Gears o exército era visto como a única resposta para uma crise, agora ele é o problema. E não apenas pelo sua pouca disposição ao diálogo, mas pela inclinação à mentira e dissimulação para se manter no poder, como se revelará mais tarde.
Entre estes renegados estão J.D. Fenix, filho do herói de guerra Marcus Fenix, e seu amigo Del, ambos desertores do exército, e Kait, filha de uma líder tribal. Os três executam missões de pilhagem em acampamentos da CGO para conseguir suprimentos para a população marginal. Numa delas, encontram o primeiro novo inimigo se impõe: robôs criados para "manter a ordem", mas que usam munição letal. Qualquer semelhança com estados policialescos que utilizam do seu aparato de segurança para reprimir com violência as reivindicações da população não é mera coincidência.
Em um dos cercos das máquinas ao assentamento da mãe de Kait, a matriarca é levada por monstros até então tratados como lendas urbanas. Resta ao trio recorrer a Marcus Fenix, que desde o fim da guerra contra os Locusts e a chegada da CGO ao poder, abandonou tudo para viver no campo. A relação com o filho, claro, é tão complicada quanto a que tinha com o próprio pai, Adam. Mas ele não perde a chance de sair fatiando monstros (e robôs) quando a oportunidade aparece.
Como jogo, Gears of War permanece o mesmo: alterna longas caminhadas pelos belíssimos cenários (quando os personagens conversam entre si e parte da história vai sendo revelada) com momentos de ação frenética – incluindo uma fuga de motocicleta em alta velocidade e a uma escapa alucinante utilizando cabos de sustentação de um elevador. O sistema de troca de armas permanece o mesmo e, às já conhecidas metralhadoras e pistolas, foram acrescidos armamentos que podem ser coletados dos robôs destruídos.
Mas o mais importante, mesmo, foi o excelente trabalho feito com a história do jogo. A busca pela mãe de Kait leva o jogador até um epílogo não mostrado em Gears of War 3, quando o exército decide enterrar os corpos dos Locusts em minas desativadas. Só que os bichos, supostamente mortos pela radiação que destruía todas as criaturas que tiveram contato com a emulsão, na verdade estavam apenas hibernando. E acordaram metamorfoseados em outra coisa – uma coisa que, a exemplo dos humanos, também precisa se reproduzir o mais rápido possível para expandir seus domínios e garantir a supremacia sobre o planeta. E pretende fazer isso incubando... humanos.
Mas diferentemente de Marcus, Dom, Cole e Baird, o quarteto original, J.D., Del e Kait não são soldados de coração. Por mais que vivessem descumprindo ordens, os primeiros Gears era guerreiros leais (legítimas engrenagens de guerra facilmente substituíveis) dispostos a dar sua vida pelo exército porque tinham a esperança de que a instituição restauraria o mundo como eles o conheciam.
O novo trio de protagonistas nunca conheceu uma realidade diferente da de um governo totalitário erguido sobre uma civilização em ruínas. Talvez por isso, sejam mais relaxados e confortáveis com o ambiente onde vivem. E mesmo que se atirem com fervor às batalhas, J.D., Del e Kait não acreditam que essa seja a solução. Para eles, família e amigos vem antes de qualquer sistema governamental ou ideologia. Se puxam o gatilho, é para garantir a segurança dos seus, e não para cumprir ordens de sabe-se-lá-quem. O inimigo não é o monstro rugindo contra eles, mas aqueles que os abandonaram quando mais precisaram.
É uma interessante mudança de postura da série. O tonel de testosterona, o tom francamente militaresco e o caráter sisudo que deram a tônica dos três primeiros jogos da franquia agora aparecem diluídos. Gears of War 4 é um produto do seu tempo, com os valores do seu tempo. Um tempo em que a intolerância e a intransigência têm cada vez menos espaço e todo esforço é feito para a conciliação. O cheiro de Napalm no ar há muito deixou de ser desejado e era hora de avançar. E Gears of War fez isso da melhor maneira possível.