Uma operação da Polícia Civil, deflagrada nesta quinta-feira (19), cumpre mandados de busca e apreensão em domicílios vinculados a um funcionário de um Centro de Registro de Veículos Automotores (CRVA), credenciado do Departamento Estadual de Trânsito do Rio Grande do Sul (Detran-RS), e a dois despachantes. Os três foram afastados do serviço. Eles são suspeitos de trabalharem para facções criminosas, legalizando carros clonados, fazendo automóveis batidos passarem em vistorias e transferindo veículos de forma fraudulenta. Até veículos que não existem mais (baixados do cadastro) ganham nova vida com os golpes, afirmam os policiais que investigam o caso.
As investigações são uma parceria da Corregedoria do Detran com a Delegacia de Polícia de Investigação de Crimes Carcerários (Dicar), ligada à Coordenadoria de Recursos Especiais da Polícia Civil (Core). As fraudes ocorrem de forma virtual e são, segundo os policiais, realizadas por dois despachantes (ambos da Região Metropolitana) e pelo coordenador de um CRVA localizado em Xangri-Lá (no Litoral Norte). O esquema propicia o "esquentamento" (legalização) de veículos com problemas. Os crimes seriam encomendados inclusive por apenados, de dentro de presídios.
O esquema envolve fraudes nas vistorias, inserção de informações falsas nos sistemas de informática do Estado, falsificação de dados, modificação das características de veículos e, até mesmo, o registro de automóveis e informações inexistentes nos bancos de dados públicos.
— Veículos adquiridos por facções não passam por vistorias, mas mesmo assim são legalizados e podem ser comercializados com vítimas, como se estivessem em situação regular — detalha o delegado Marcos Souza, que comanda as investigações conduzidas pela Dicar.
Entre os golpes identificados pelos policiais, no inquérito, estão vários similares ao do esquema criminoso desnudado em abril. Por exemplo:
- Regularização de veículos sem qualquer vistoria. Inclusive os baixados por demolição ou batidos.
- Automóveis com problemas para circular, que não seriam aprovados em vistoria, são legalizados.
- Registro de carros inexistentes, apenas para forjar documentos. A papelada era usada para simular patrimônio e contrair empréstimos bancários.
- Vistoria e transferência de veículo inexistente, para constar como patrimônio.
Em abril, um outro grupo foi desarticulado, atuando de forma similar. Entre os indiciados na época está um servidor graduado do Detran.
O delegado afirma que tanto os despachantes como o funcionário do CRVA trabalhavam como mercenários, para mais de uma facção, inclusive as que são rivais entre si. Conforme Marcos Souza, criminosos buscam os escritórios de intermediação de serviços automotivos, que aí contatam o servidor do Detran. Esse, mediante senha, consegue adulterar os documentos ligados aos veículos-alvos.
Para fazer passar por vistoria um veículo clonado ou batido, os criminosos pagam em média R$ 2 mil, informa o delegado.
A investigação surgiu por meio do monitoramento de facções, de apreensões de veículos clonados que estavam com documentos válidos e também da vistoria das senhas utilizadas.
— Percebemos um padrão, que foi confirmado a partir de investigações internas do Detran — conclui Marcos Souza.
O delegado chegou a pedir as prisões preventivas dos três suspeitos, mas a Justiça não as concedeu, com o argumento de que os crimes praticados não envolvem violência. Foram determinadas buscas e apreensões em endereços dos envolvidos e o afastamento deles do trabalho, além da proibição de que se comuniquem. Os envolvidos vão responder a inquérito por peculato (corrupção praticada por funcionário público), estelionato, fraudes diversas e associação criminosa.