O Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJRS) aceitou denúncia do Ministério Público (MP) contra Cintia Maria Schindler, síndica do Condomínio Edifício San Remy, no bairro Menino Deus, em Porto Alegre. Ela é acusada de injúria racial e perseguição contra uma empregada doméstica do local.
Cintia terá 10 dias para oferecer resposta à acusação. A vítima, que pediu para não ser identificada, é funcionária de uma das moradoras há 23 anos — sete deles trabalhando no local. Ela alega que Cintia a ofendeu, pela primeira vez, em 19 de julho do ano passado, com termos que faziam referências a sua cor, raça e etnia. Antes disso, segundo a vítima, era proibida pela acusada de entrar pela frente do condomínio e de utilizar o elevador.
— Eu tenho problema causado por varizes em uma das pernas. Tentei explicar, e ela disse que eu não podia ter contato com os moradores, que sou negra e não posso estar no mesmo lugar. Teve um episódio em que entrei pela porta da frente e ela estava me esperando dentro do elevador. Estava chovendo, e ela disse que eu era um macaco, que não era gente para andar ali e para me colocar no meu lugar — afirma.
Além dos ataques, a empregada doméstica disse à reportagem de GZH que era perseguida por Cintia no condomínio e, como forma de intimidação, diversas câmeras foram instaladas no local. A vítima, que reside em Alvorada, na Região Metropolitana de Porto Alegre, diz que atualmente toma antidepressivos para ir ao trabalho.
Investigação
Em novembro de 2022, o caso foi levado até a Delegacia de Intolerância de Porto Alegre pela empregadora da vítima, que testemunhou na ação e auxiliou na contratação de um defensor. A investigação ouviu a doméstica, duas testemunhas e intimou a síndica a prestar depoimento. Cintia não compareceu. Segundo a delegada Tatiana Bastos, ela foi indiciada pela polícia, em março deste ano, por injúria qualificada discriminatória, com uso de elementos referentes a raça, cor, etnia e origem.
— O depoimento e as declarações trazidas pela vítima na ocorrência policial foram ratificadas por pelo menos duas testemunhas, também moradoras do condomínio. Com isso, a conclusão do procedimento foi no sentido do indiciamento, imputando a responsabilidade desse crime de preconceito contra a suspeita — aponta a delegada.
Processo civil está próximo de ser concluído
Além da esfera criminal, uma ação cível por danos morais foi movida pela defesa da vítima. No processo, o condomínio San Remy também é mencionado. No episódio em questão, a empregada doméstica participou, por meio de uma procuração deixada pela empregadora, de uma reunião do condomínio, na qual houve eleição para síndico. No encontro, segundo ela, expôs o que estava sofrendo, mas ninguém a apoiou e a ofenderam ainda mais. Um dia depois, Cintia foi reeleita síndica.
— Depois da eleição, ela me esperou no elevador. E foi quando ela disse que entrei com a denúncia no lugar errado, que deveria ter procurado o Ibama, que é onde defendem os macacos. Ela só parou de me ofender há uns dois, três meses — conta.
Segundo o advogado Diego Cândido, defensor da vítima nos dois processos, houve omissão do Conselho do condomínio, na medida em que a doméstica os procurou, mais de uma vez, e reclamou das ofensas. Como não houve reação e a síndica foi reeleita, foi movida a ação.
— O processo já está em fase de réplica, ou seja, está bem mais avançado, diferentemente do caso envolvendo a ação criminal. A vítima já está em processo de adoecimento e tem depressão. Ela tem que tomar remédio para ir trabalhar. Foi o que gerou o processo cível — afirma o advogado.
Na contestação, apresentada pelos advogados Ricardo Cesar Côrrea Pires Dornelles e Ana Paula Maciel, a defesa da ré alega que não existem fatos e causa que apontem o cometimento de alegados atos por Cintia.
A defesa de Cintia pediu sigilo do processo. Os defensores também afirmaram que a empregadora da doméstica não teria testemunhado as alegadas ofensas e que teria conflitos com a síndica.
Contraponto
GZH tenta contato com Cintia e a defesa dela desde quarta-feira (25), mas até a publicação desta reportagem não houve manifestação sobre os processos nas esferas cível e criminal.