Uma mensagem de celular foi a porta de entrada para uma série de transtornos e resultou num prejuízo de pelo menos R$ 32 mil para uma moradora de Porto Alegre. Após ser convencida de que sua conta bancária estava em risco, a mulher de 32 anos foi orientada pelos estelionatários a fazer transferências de valores. É o chamado golpe do 0800 ou da mão fantasma, que levou a Federação Brasileira de Bancos (Febraban) a emitir alerta na última semana.
No fim da manhã de 30 de agosto, a nutricionista recebeu um SMS no celular. A mensagem informava uma compra em análise no valor de R$ 897,13 numa loja e indicava um 0800 para ser contatado, caso a cliente não reconhecesse a transação.
— Quando liguei, caí numa espécie de central telefônica do banco. Um rapaz se identificou e perguntou no que podia ajudar. Relatei a mensagem, a compra, e ele pediu para confirmar os dados, como nome, CPF — recorda a vítima, que preferiu ter a identidade preservada.
Do outro lado da linha, o golpista solicitou que a mulher abrisse o aplicativo do banco e consultasse o que havia de saldo e empréstimos disponíveis. Na sequência, disse ter realizado análises da conta e que havia um aparelho com acesso remoto ao celular dela, e que esta pessoa estava tentando fazer compras em nome da vítima.
— Ele me deu até uma dica de segurança para usar o cartão virtual. Disse que alguém havia hackeado meu celular numa compra. E que o procedimento padrão era fazer o congelamento da conta — explica.
Foi a partir desse "congelamento" que os golpistas efetivaram a trapaça. O estelionatário explicou à vítima que ela precisava retirar todos os valores disponíveis na conta com a desculpa de que assim não seriam acessados pelo hacker.
— Me induziu a acessar tudo que tinha de crédito e transferir o Pix para contas que seriam de gerentes. Recebi mensagem pelo WhatsApp com um número que tinha o símbolo do banco. Ali, a pessoa me enviava links para pagamentos — relembra.
A vítima tinha cerca de R$ 8 mil na conta, mas o estelionatário orientou que ela deveria acessar também o limite e os valores disponíveis para empréstimos. Assim, a mulher fez, em cerca de 10 minutos, três transferências nos valores de R$ 2.699, R$ 7.916 e R$ 18 mil, num total de R$ 28 mil.
Durante as transações, o aplicativo passou a pedir confirmação de segurança, para verificar se era mesmo a cliente, e o estelionatário confirmou que era um procedimento padrão. Na última transferência, de R$ 3 mil, a transação foi bloqueada pelo banco.
A vítima então enviou o valor para conta que mantinha em outro banco. O criminoso orientou que ela fizesse também o "congelamento" dessa conta. Assim, foram transferidos mais R$ 3.617 para os golpistas. Logo depois, o falso atendente informou que em até uma hora os valores seriam devolvidos para a conta da cliente.
— Disse: "Fica tranquila, que vai ter o seu dinheiro de volta". Fez de tudo para criar essa atmosfera de segurança. Por fim, ainda me pediu nota para o atendimento dele — recorda.
"Roubei mesmo", diz golpista
Quando passou a suspeitar da situação, a mulher decidiu entrar em contato com o 0800 do banco impresso no cartão. Foi neste momento que descobriu que tinha sido vítima de golpe. Após constatar a trapaça, a mulher voltou a fazer contato com o número indicado na mensagem dos golpistas. Durante a conversa, ela teve uma nova surpresa. Ao exigir que seu dinheiro fosse devolvido, recebeu como resposta de uma das atendentes:
— Roubei, roubei mesmo. Quem tu mandar atrás vou roubar também. Vou roubar tua avó, teu pai, todo mundo.
A vítima passou a tentar reaver os valores que tinham sido repassados e registrou o fato por meio da Delegacia Online da Polícia Civil.
— A gente se sente extremamente vulnerável. É um sentimento de insegurança em várias camadas — relatou a vítima, que busca resolver a situação junto ao banco.
"Tudo não passa de uma encenação", explica delegado
O golpe do 0800 se tornou uma trapaça conhecida das polícias nos últimos anos. À frente da Delegacia de Repressão aos Crimes Informáticos e Defraudações do Departamento Estadual de Investigações Criminais (Deic), o delegado Thiago Albeche afirma que não é comum os estelionatários aproveitarem-se também de valores de empréstimos disponíveis. Mas alerta que é necessário desconfiar sempre desse tipo de mensagem.
— Quem está do outro lado da linha é um criminoso, que inclusive vai ter dados verdadeiros como parte do número do CPF, o número do telefone, tudo com intuito de dar um ar de verdade a essa mensagem e a esse atendimento. Tudo não passa de uma encenação para que a pessoa seja convencida a efetuar um pagamento via Pix, uma transferência bancária ou então pagar um boleto. Isso tudo faz parte do golpe — diz.
Como forma de auxiliar a população a não cair nesse tipo de armadilha, o Deic lançou uma campanha com série de vídeos explicativos sobre golpes divulgados nas redes sociais.
Alerta da Febraban
A Febraban emitiu alerta sobre esse tipo de golpe, que usa estratégias para enganar as vítimas e induzir a pessoa a realizar transações financeiras. A federação atenta ainda para as variações da trapaça. Em alguns casos os criminosos enviam mensagens informando que as milhas ou pontos do cartão de crédito estão prestes a vencer, e pedem que o cliente entre em contato para não perder a vantagem. Também há mensagens sobre falsos prêmios.
Diretor do Comitê de Prevenção a Fraudes da Febraban, Adriano Volpini orienta os clientes a ligarem para os canais oficiais ou para o gerente. Segundo o diretor, os bancos ligam para confirmar transações, mas jamais pedem dados como senhas ou outras informações pessoais:
“Também nunca ligam e pedem para que clientes façam transferências ou Pix ou qualquer tipo de pagamento para supostamente regularizar problemas na conta. Os bancos nunca ligam para fazer um estorno de transação por meio de um telefonema. Desligue se pedirem para digitar senha ou qualquer dado em seu aparelho de telefone. Ao receber uma ligação suspeita, desligue e de outro telefone, ligue para os canais oficiais de seu banco.”
Segundo a Febraban, além da realização de campanhas educativas, os bancos investem cerca de R$ 3,5 bilhões por ano em sistemas de tecnologia da informação (TI) voltados para segurança. A federação afirma que os bancos associados contam com o que há de mais moderno em relação à segurança cibernética e prevenção a fraudes, que estes processos são continuamente aprimorados, e que os bancos atuam em parceria com forças policiais para auxiliar na identificação e punição dos criminosos virtuais.
Como se proteger do golpe
- Nunca realize ligações para números de telefone 0800 recebidos por SMS ou outras mensagens. Ligue sempre para o número da central de atendimento do seu banco ou para seu gerente.
- Os bancos ligam para os clientes para confirmar transações suspeitas, mas nunca pedem dados como senhas e outras informações pessoais nessas ligações.
- Os bancos nunca ligam para pedir aos clientes que façam transferências ou Pix ou qualquer tipo de pagamento.
- Se receber esse tipo de ligação, desconfie na hora. Desligue e entre em contato com a instituição pelos canais oficiais, de preferência de outro telefone, para saber se algo aconteceu mesmo com sua conta.
Fonte: Febraban e Polícia Civil