O homem considerado o principal foragido do Rio Grande do Sul, detido nesta semana no Pará, tinha uma peculiaridade para tentar despistar as autoridades, segundo a Polícia Civil. O criminoso conhecido como Zoreia tem condenações que somam 243 anos de reclusão e chama atenção o fato de que ele ingressou em presídios com pelo menos três nomes diferentes: Alex Marcelo, Sandro Alexandro e Vilmar Silvano, todos com sobrenome De Paula.
O titular da Delegacia de Capturas do Departamento Estadual de Investigações Criminais (Deic), delegado Gabriel Casanova, diz que o investigado é conhecido por já ter usado dezenas de nomes falsos. Ao ser detido no norte do país, Zoreia portava documentos em nome de Leandro José da Silva. Segundo apuração, ele estaria pensando em fazer uma cirurgia plástica, para dificultar ainda mais sua identificação.
O homem que chegou a ser conhecido como "Rei da Maconha" no noroeste gaúcho teria passado por vários países da América do Sul depois de romper a tornozeleira eletrônica em fevereiro de 2023. Zoreia cumpria pena em prisão domiciliar humanitária, por questões de saúde. O delegado Casanova acredita que ele estava no Pará, onde foi preso, para negociar o contrabando de drogas a partir da Bolívia ou até para obter novos documentos.
Conforme apuração do Deic, o investigado tem condenações desde o ano de 1997. Até 2004, quando as autoridades perceberam o problema, ele teria ingressado em presídios com pelo menos três nomes distintos. De acordo com o titular da Delegacia de Capturas do Deic, Poder Judiciário, polícia e Instituto-Geral de Perícias (IGP) se uniram para confirmar esta hipótese.
Casanova diz que, para evitar que o fracionamento das condenações levasse à impunidade, os delitos atribuídos às três supostas pessoas foram direcionados a um dos nomes e as penas somadas. Com isso, Zoreia acumulou 243 anos de reclusão a cumprir, dos quais 25 já foram cumpridos.
— O impasse sempre foi identificar digitais e atribuir somente a ele (Zoreia) todos os crimes. Mas fica uma questão: quem realmente ele é? Digo isso porque ele mesmo nos falou que usou documentos com os nomes falsos — diz o delegado.
A prisão de Zoreia na quarta-feira (26), no Pará, foi registrada com o nome de Sandro Alixandro de Paula, apesar de ele portar documento em nome de Leandro José da Silva.
Nome do irmão
Além do nome, a idade de Zoreia também é um mistério. Gabriel Casanova ressalta que o homem entrou cedo na vida do crime, mas, mesmo assim, a idade conhecida dele, pouco mais de 40 anos, não fecha com os 25 de prisão já cumpridos.
O delegado diz que este ponto exigirá investigação mais detalhada, mas uma hipótese é que Zoreia tenha, por vários anos, usado o nome de um irmão mais novo, já falecido. Conforme Casanova, Sandro Alexandro de Paula morreu tendo como único documento uma certidão de nascimento, que o criminoso pode ter usado para confeccionar uma carteira de identidade que apresentou em algumas das abordagens.
Outro nome usado por Zoreia é Vilmar Silvano de Paula, também registrado somente em certidão de nascimento, sem RG. Casanova acredita que este é o nome verdadeiro do detido. O delegado relata que o próprio criminoso teria confirmado isto informalmente a agentes e este também é o nome que consta na certidão de nascimento de uma filha dele, com cerca de 10 anos de idade.
Nas duas certidões — de Vilmar Silvano e Sandro Alexandro — constam os mesmos pais. O delegado diz ainda que Sandro de Paula faria 41 anos nesta quinta-feira (27) e Vilmar teria 44 anos, já que a certidão registra nascimento em 13 de janeiro de 1979 em Tangará da Serra, Mato Grosso.
Casanova admite que é difícil, no momento, precisar o nome e a idade do homem preso:
— Apesar de ter digitais, tudo indica que são do irmão falecido, já que os dois só tiveram certidões de nascimento. Um registro foi feito no Mato Grosso, anos depois, em nome de Sandro Alexandro (que estaria morto), o que indica ter sido pelo criminoso detido por nós nesta semana no Pará. Seria necessária uma apuração administrativa, com trabalho pericial, se for o caso, em cartórios gaúchos e do Mato Grosso para confirmar tudo isso — explica.
Prisão no Pará
Além de ter antecedentes criminais como mandante de homicídios e roubos a joalherias, conforme a polícia, Zoreia poderia estar no Pará para tentar negociar o contrabando de drogas da Bolívia e Colômbia para o Rio Grande do Sul. Esta investigação deve ser feita pelas polícias gaúcha e paraense.
O delegado Gabriel Casanova, do Deic, relata que o "Rei da Maconha" fugiu inicialmente para a Argentina. Segundo depoimento, ele rompeu a tornozeleira em fevereiro e fugiu para o país vizinho com o objetivo de se esconder de rivais e das autoridades. Em seguida, foi para a cidade de Encarnación, no Paraguai, onde teria ficado a maior parte do período desde fevereiro.
Casanova diz que Zoreia também teria ido algumas vezes para a Bolívia e para a Colômbia. A suspeita é de que teria negociado drogas nestes países. A polícia diz que pretendia prendê-lo no Paraguai na semana passada, mas com a informação de que o investigado estava no Pará, os planos foram alterados.
Há duas hipóteses principais de motivos para a ida dele ao norte do Brasil. O delegado acredita que o objetivo era usar uma tradicional rota de barco até a cidade de Belém e, a partir de lá, encaminhar drogas por via terrestre ou aérea para o noroeste do Rio Grande do Sul. Outra possível razão teria ligação com o uso de nomes falsos. Casanova diz que policiais locais informaram que a região do Pará onde ele foi preso seria usada por facções de várias partes do país para a confecção de documentos oficiais com dados falsos.
Por enquanto, a polícia diz que tudo está sendo investigado.
— A prisão de um indivíduo com essas características demonstra a importância em se ter na Polícia Civil uma delegacia especializada neste tipo de investigação. A equipe analisou as especificidades deste foragido (Zoreia), driblou as dificuldades e, com suas técnicas investigativas, logrou êxito em localizá-lo. Isso nos dá a certeza de que não importa o quão “esperto” ele é, sendo ou não um especialista em fugas e no uso de nomes falsos. Mais cedo ou mais tarde nós vamos sempre encontrá-lo, recapturá-lo e trazê-lo de volta ao sistema prisional — diz a diretora do Deic, delegada Vanessa Pitrez.
Preso no Distrito de Mosqueiro, uma das ilhas de Belém do Pará, Zoreia foi encaminhado nesta quinta-feira (27) para a Penitenciária de Alta Segurança de Charqueadas (Pasc). Ele já esteve preso nesta unidade, tendo sido, inclusive, o segundo preso da história a fugir desta casa prisional.