O julgamento do PM Ronaldo dos Santos, 58 anos, acusado de matar o filho recém-nascido e outras quatro pessoas foi dissolvido na tarde desta terça-feira (30). O júri teve início às 10h, no plenário da 4ª Vara do Júri do Foro Central, e foi encerrado por volta das 15h30min. O novo julgamento ficou agendado para fevereiro do ano que vem.
O primeiro a depor foi o policial militar Daniel dos Santos Fagundes, que atendeu a ocorrência na época. Em seguida, o réu foi ouvido. Já havia começado a fase de debates e o Ministério Público fazia sua explanação quando o promotor Eugênio Paes Amorim reclamou que o advogado do réu, Leonardo Duarte, não parava de passar de um lado para o outro. O defensor afirmou que não iria parar. Foi aí que a discussão teve início.
— Ocorreram alguns incidentes durante a fala da acusação. Foi necessário interferência. A princípio, estava resolvido e a sessão prosseguiria. Entretanto, veio no intervalo a informação de que a defesa se sentia prejudicada com tudo que foi dito. Entenderam que foi muito prejudicial — explica a juíza Cristiane Busatto Zardo, que presidia o julgamento e acatou o pedido de dissolução do júri.
A Ordem dos Advogados do Brasil (OAB-RS) ficou sabendo sobre o ocorrido e o vice-presidente da Comissão de Prerrogativas, Mateus Marques, esteve no local. Ele explica que não havia como dar continuidade ao julgamento.
— Em razão das ofensas e da forma abrupta como o promotor acabou agindo nesse momento a Ordem (dos Advogados do Brasil) foi chamada, compareceu e em entrevista com o colega advogado e a juíza entendeu que não havia como dar continuidade em razão da disparidade de armas, que estava evidente — explica Marques.
Ao final da sessão, a juíza leu os motivos para dissolução do júri e o promotor Eugênio Paes Amorim argumentou:
— O defensor exasperou-se com esse promotor. Em consequência, esse promotor exasperou-se. Mas que fique claro que a primeira exasperação foi dele. O Ministério Público lamenta e entende como uma manobra desleal e covarde da defesa.
O advogado do réu, Leonardo Duarte, não quis se manifestar.
"Eu não matei nem mandei matar ninguém", diz réu
O crime aconteceu em 2016, no bairro Jardim Itú-Sabará, na zona norte da Capital. A chacina foi descoberta uma semana após o crime, quando os corpos já estavam em estado avançado de decomposição. Lourdes Felipe, 64 anos, os filhos dela Walmyr Felipe Figueiró, 29, e Luciane Felipe Figueiró, 32, e os netos João Pedro Figueiró, cinco anos, e Miguel, de um mês, foram assassinados dentro de casa.
O motivo do crime, segundo a acusação do Ministério Público (MP), seria a insatisfação do PM com o bebê, um filho que o réu teve com Luciane, com quem ele manteria relação extraconjugal. Em seu depoimento, o réu negou o crime.
— Eu não matei nem mandei matar ninguém — disse Ronaldo, ao ser questionado pelo seu advogado.
Uma das hipóteses levantadas pela defesa do réu é de que alguém cometeu o crime em decorrência do tráfico.
Ainda em seu depoimento, Ronaldo disse que conheceu Luciane em Santa Catarina. Ele deu sua versão de como era o relacionamento dos dois — ela morava em Porto Alegre e ele, em Santa Catarina.
Segundo ele, foi informado por uma conhecida que a mulher estava grávida de um filho dele. O PM afirmou que viajou para Porto Alegre para tentar esclarecer os fatos e que tentou achar uma clínica para fazer o teste de paternidade, mas que teria desistido por não ter encontrado alguma aberta na Capital. Ele afirmou ainda que, por esse motivo, foram a Tubarão fazer o teste. Foi neste município que o menino nasceu.
"Pediria a pena de morte", diz promotor
Antes de a discussão que dissolveu o júri ter início, o promotor sustentava que Ronaldo planejou o crime. Ele disse que o réu primeiro foi até a casa das vítimas para visitar e, depois, voltou para a chacina.
— O tráfico não mata com 22 (revólver calibre 22). Ele entrou e matou com 22, porque num ambiente fechado essa arma tem menos barulho — disse Amorim.
O promotor sustentou que Ronaldo fez uma série de preparativos para o dia das execuções. Entre eles, os fatos de comprar berço e dar dinheiro para a mãe da criança. Disse que o policial não usou o celular no dia do crime:.
— O chip (do celular) simplesmente queimou no dia do crime. Ele sabia que se usasse o celular, saberiam onde ele estava.
Amorim disse que Ronaldo simulou uma execução motivada pelo tráfico de drogas. Citou que porções de droga foram espalhadas ao redor do corpo de uma das vítimas.
— Vocês acham que o Willian (uma das vítimas) iria traficar drogas na frente da mãe dele? Claro que colocaram aquilo lá — destacou o promotor.
O promotor por mais de uma vez citou que o réu não tinha álibi na noite do crime.
— Eu pediria a pena de morte para ele, mas no Brasil não pode — encerrou Amorim.
Posicionamento
A OAB-RS emitiu nota. Confira na íntegra:
A OAB/RS vem a público manifestar seu repúdio acerca dos comentários proferidos pelo Promotor de Justiça Eugênio Amorim durante a realização de Júri Popular na tarde da terça-feira (30). As afirmações violam a Lei 8.906/94 que, no seu artigo 7º, fixa como dever de todos os atores do processo o respeito e a urbanidade, que devem permear o ambiente da sessão de julgamento, além de ferir a paridade de armas, indispensável para que haja o Direito à ampla defesa.
A OAB/RS não tolera qualquer ofensa às prerrogativas dos advogados, bem como já atendeu o caso por meio da Comissão de Defesa e Assistência das Prerrogativas (CDAP), obtendo a imediata dissolução do Conselho de Sentença. Seguiremos adotando todas as medidas cabíveis em relação ao fato ocorrido.
A Ordem gaúcha não aceitará ataques e ofensas desta natureza, que atingem toda a advocacia, e exige respeito à atividade, que é múnus público e indispensável à administração da Justiça nos termos do artigo 133 da Constituição Federal de 1988.