O dono da voz que aparece em uma sequência de áudios com falas racistas, misóginas e gordofóbicas, além de uma ameaça de morte, direcionadas a uma suposta policial negra, prestou depoimento à Polícia Civil nesta quinta-feira (9). O caso é investigado pela Delegacia de Polícia de Combate à Intolerância (DPCI) da Capital e pela Corregedoria-geral da Brigada Militar.
A sequência de três áudios em que uma voz masculina profere os xingamentos circulou pelas redes sociais e aplicativos de mensagem na quarta-feira (8). Após recebê-las de diversas pessoas, a delegada Andréa Mattos, titular da DPCI, fez um registro de ofício e deu início à investigação.
Em depoimento na delegacia, o suspeito teria afirmado que a conversa seria antiga e teria sido descontextualizada. Os áudios teriam sido compartilhados em um grupo de WhatsApp e divulgadas por uma ex-namorada dele. Ela teria recebido o material de um amigo com quem ele teria brigado.
Segundo o homem, a história contada no áudio seria fictícia, por isso é narrada em primeira pessoa, e a blitz mencionada jamais teria acontecido. Ele alegou que há outros áudios que poderiam comprovar que a história foi descontextualizada, mas não os apresentou na delegacia porque teria trocado de celular recentemente.
— Ele assumiu a autoria dos áudios, mas disse que estão fora de contexto. Disse também que tem outros áudios que confirmariam. Ele disse que estaria narrando uma história que teria acontecido com uma terceira pessoa que ele não lembra quem é — conta a delegada.
Nesta sexta-feira (10), a ex-namorada prestou depoimento na DPCI e negou que tenha divulgado os áudios. Conforme a delegada, o casal teria permanecido junto por cerca de dois meses e a separação teria ocorrido três meses atrás. A mulher tinha uma medida protetiva contra ele.
Na próxima semana, amigos do investigado, que poderiam ter salvo os supostos áudios que o inocentariam, serão convocados a depor.
Nota da defesa
O advogado Samir Hofmeister Nassif, que representa o investigado, emitiu uma nota na qual afirma que “a busca pelos responsáveis na divulgação dos áudios será investigada para que haja a reparação tanto na esfera penal como cível”. O texto reitera a tese de que a história relatada é fictícia e que foi descontextualizada.
“A blitz policial nunca ocorreu, a referida policial não foi identificada no quadro da corporação e, por isso, nunca foram proferidos quaisquer xingamentos, ao contrário do que faz crer o áudio divulgado. Segundo confirma a BM, o crime de desacato e injúria é passível de prisão em flagrante, e constaria nos registros da corporação caso o fato tivesse ocorrido”, diz a nota.
Conteúdo caracteriza crime de racismo
Nas gravações, o homem relata que o conflito teria iniciado porque a PM teria insinuado que ele estaria sob efeito de álcool durante uma barreira policial na Rua Luciana de Abreu, no bairro Moinhos de Vento. Ele segue contando que um agente da Empresa Pública de Transporte e Circulação de Porto Alegre (EPTC) teria realizado o teste do bafômetro constatando que ele não teria ingerido álcool.
A partir disso, ele segue desferindo uma série de xingamentos sobre a cor da pele da policial e sobre o seu peso. Ao relatar que ela teria ameaçado de prendê-lo por desacato, o homem conclui dizendo “mato ela, mas não vou preso, raça desgraçada. Nojo!”
A delegada informa que a Polícia Civil ainda investiga se a blitz ocorreu, de fato, ou se a versão do homem procede e a história é fictícia. Ela explica que, caso a história não seja fictícia, o caso pode ser enquadrado como racismo.
— O fato caracteriza o crime de racismo, pois ele questiona como uma pessoa negra poderia ocupar esse cargo. Isso não atinge apenas uma pessoa, mas um grupo, uma coletividade. Tanto que nem é preciso ouvir a vítima para investigar o caso — diz a delegada.
Brigada Militar se posicionou
Na quarta-feira (8), a Brigada Militar já havia emitido uma nota de repúdio, rechaçando o conteúdo e afirmando que a Corregedoria-geral abriu uma investigação por meio do programa “PM Vítima” para analisar as gravações. A policial militar que teria sido alvo do ataque ainda não foi identificada.