Na zona norte de Porto Alegre, está localizado o eixo das investigações contra o tráfico de drogas no Rio Grande do Sul. Nessa região fica o Departamento Estadual de Investigações do Narcotráfico (Denarc), que desde novembro de 2020 passa por reforma completa, num investimento de mais de R$ 1,5 milhão.
A nova cara do prédio no bairro Navegantes foi possível por meio de investimentos do poder público e também de empresas. Além da revitalização de todo o departamento, a sede de uma das delegacias e um canil serão inaugurados nesta quarta-feira (30).
Os problemas estruturais que assolavam o prédio levaram à interdição de parte do espaço, que passou a ter áreas sem uso pelos servidores. Infiltrações nas paredes e presença de cupins estavam entre os principais problemas do imóvel público que abriga seis delegacias do Denarc. Por meio de parcerias com Ministério Público do Trabalho (que repassou a maior parte dos recursos), Ministério Público, Receita Federal e empresas privadas, foi realizada a obra, que transformou a edificação.
— A gente tem duas opções: ou cruza os braços e diz que não tem condições de trabalho, e fica esperando receber o salário no fim do mês, ou vai em busca de alternativas — diz o diretor da Divisão de Investigações do Narcotráfico (Dinarc), delegado Carlos Wendt.
O policial está à frente do projeto que buscou parcerias para fazer a recuperação do prédio. Detalhista, vistoria e coordena diariamente o andamento dos trabalhos. Confere as pinturas nas paredes, os materiais usados e o resultado. Por vezes, é preciso pedir que as equipes refaçam um ou outro serviço que não ficou a contento.
— No dia que colocaram, eu não estava aqui. Não ficou bem centralizado – pondera ao observar a distância entre os símbolos da Polícia Civil fixados na parede junto ao pátio.
De espírito proativo, Wendt já esteve engajado em outros projetos, como a Central de Polícia de Viamão em 2018, quando foi delegado regional, e a criação de força-tarefa para conter os roubos a transportes coletivos na Capital em 2016, que mais tarde se transformou na primeira delegacia do Brasil com essa especialização, e conseguiu derrubar a incidência desse crime.
Quando chegou à sede do Denarc, no início de 2019, deparou com cenário complexo. Policiais trabalhavam em condições precárias, incluindo uma delegacia que convivia com a infiltração de esgoto dos banheiros do andar superior. As janelas estavam enferrujadas e emperradas, e um galpão aos fundos não podia ser usado porque corria risco de desabamento.
— Gosto de trabalhar muito com resultado e cobro muito os policiais. Mas o mínimo que temos de dar são condições de trabalho. Quando assumimos aqui, tínhamos sérios problemas estruturais, como questões básicas: faltava banheiro para os policiais. Tinha delegacia que eles trabalhavam com urina e fezes caindo na cabeça, por infiltração. Era um mau cheiro insuportável — recorda.
Modernização e humanização
No amplo galpão onde atualmente funciona a garagem, as vigas de madeira estavam comprometidas, e foram substituídas por alumínio e ferro. Toda a cobertura também estava danificada e precisou ser renovada. Dentro de todo o prédio, as janelas, que estavam emperradas e permitiam pouca passagem de luz, foram substituídas por aberturas amplas de vidro. Uma das salas também em desuso devido ao estado que se encontrava foi transformada em auditório com 50 lugares – os móveis usados são resultados de apreensões.
Um antigo depósito foi transformado para receber a nova sede da 3ª Delegacia de Investigação do Narcotráfico. O espaço, que agora conta com cozinha e sala de investigações, além de outros cômodos, foi totalmente modificado para abrigar a equipe. Antes disso, duas delegacias precisavam dividir o mesmo espaço dentro do prédio, repleto de infiltrações.
Os ambientes receberam novos equipamentos de ar-condicionado (doados pela Receita Federal), já que os antigos, além de nem sempre funcionarem adequadamente, consumiam muita energia elétrica.
— Isso vai gerar uma boa economia de custo para o Estado. Trocamos todo o sistema de iluminação por led e os novos ar-condicionado são mais econômicos. Uma gama de parceiros, vendo que queríamos melhorar, resolveu abraçar a causa e nos ajudar — comemora Wendt.
Trazer mais humanização para o espaço é um dos objetivos da reforma. No pátio, floreiras foram instaladas e plantas passaram a ser cultivadas na área próxima ao novo canil. Agora, cada um dos cães farejadores, que reforçam os trabalhos de investigação de drogas no Estado, conta com espaço amplo e mais adequado.
A obra também foi pensada para propiciar espaço melhor para aqueles policiais que chegam de outros municípios com apreensões de drogas ou para participar de operações. Um alojamento foi construído, e no pátio foi instalada cobertura para quando é preciso descarregar as cargas de narcóticos apreendidos em dias de chuva.
— Trabalhamos com o pior da sociedade. Todo o dia a gente vê coisas ruins. Nada melhor que o policial ter um ambiente que lhe motive a vir trabalhar. Que seja um local acolhedor, bacana. A gente também sempre pensa nas vítimas. Geralmente, quem procura a polícia é alguém que já foi vitimizado e está abalado. A pior coisa é chegar num órgão policial pedindo ajuda e ser revitimizado, muitas vezes num ambiente inadequado — afirma Wendt.
Pensando nisso, a sala que recebe vítimas de crimes foi reformada. Foram construídos também banheiros para os presos que precisarem permanecer no local durante os flagrantes. A obra, que será inaugurada na tarde desta quarta-feira, está em fase de retoques finais. Por último, será feita a instalação do novo sistema de monitoramento.
R$ 45 milhões apreendidos do tráfico
Embora as melhorias estruturais sejam as mais visíveis, a revitalização também passa pelas ferramentas que os policiais têm disponíveis para investigar criminosos. As equipes receberam R$ 300 mil em softwares do Ministério Público de Viamão, com o compromisso de que eles fossem utilizados no combate às lideranças de facções.
— Geralmente, é mais difícil chegar nos grandes líderes. Acabamos pegando o pessoal que transporta drogas, mas os líderes, muitas vezes, ficam impunes. Através desses softwares e equipamentos estamos conseguindo chegar nessas lideranças, conseguindo responsabilizá-las criminalmente, além de fazer o sequestro do patrimônio, que é a lavagem de dinheiro — diz o diretor de investigações.
De janeiro de 2019 a março de 2022, foram apreendidos e sequestrados R$ 45 milhões em bens do crime organizado. No mesmo período, o Denarc retirou das ruas 9,4 toneladas de maconha, 1,126 tonelada de cocaína, 49,2 mil comprimidos de ecstasy e 188 quilos de crack.