Uma marca profunda de queimadura no braço direito de um bebê de um ano e meio, morto na última sexta-feira (6) em Canoas, na Região Metropolitana, leva a Polícia Civil a suspeitar que a criança era torturada. O garoto deu entrada em uma unidade de pronto atendimento (UPA) já sem vida. A madrasta, uma haitiana de 28 anos, acabou presa em flagrante por suspeita de ter espancado o enteado até a morte.
A mulher procurou a unidade de saúde entre 10h30min e 11h com a criança já sem vida. A equipe médica tentou reanimar o menino, mas não foi possível. Assim que a equipe de saúde percebeu que ele poderia ter sido agredido, em razão da série de lesões, a Brigada Militar e a Polícia Civil foram acionadas.
Em um primeiro relato, a mulher informou versões diferentes, de que outra pessoa teria agredido o enteado e que ele havia sofrido uma queda. Segundo o delegado Pablo Rocha, da Delegacia de Proteção à Criança e ao Adolescente (DPCA), o bebê tinha lesões e hematomas nas costas, nos braços e na cabeça. O quadro levou à suspeita de que a criança havia sido espancada.
A equipe de investigação seguiu até a casa onde a família vivia, no bairro Guajuviras, onde testemunhas foram ouvidas. Conforme o delegado, duas vizinhas relataram ter presenciado a madrasta agredindo o bebê ainda no início da manhã. Elas contaram que ela estava batendo na criança, que teria caído com o rosto no chão.
As mulheres teriam visto o momento em que o bebê entrou em casa caminhando, o que indica que ele teria sido espancado novamente dentro da moradia. Além das vizinhas, a polícia ouviu também uma garota de seis anos, filha da haitiana e do pai do bebê. Em depoimento, ela confirmou que o irmão era espancado pela mãe frequentemente.
— Ela disse que o irmão acordou e a mãe tinha batido nele, que ele desmaiou. Uma coisa que me chamou atenção é que criança não percebeu a morte do irmão. Para ela, o irmão tinha desmaiado, mas ela não estava apavorada, aquilo era algo comum. Ela mostrou em gestos os locais onde a mãe bateu no irmão e eles conferem com as lesões — detalha o delegado.
A menina, que se comunica bem em português, contou aos policiais que também apanhava da mãe, mas que as agressões não eram tão violentas como em relação ao irmão. O bebê é fruto de uma relação extraconjugal do marido da suspeita. A polícia ainda tenta localizar a mãe da criança, também haitiana, que reside em outro Estado.
Lesões anteriores
O pai, que estava trabalhando no momento em que aconteceu a morte do filho, não teria relação com o homicídio. Mas é apurado ainda se ele tinha conhecimento sobre as agressões anteriores. O menino não tinha sintomas de desnutrição, por exemplo. Segundo os policiais, a casa da família estava organizada e não havia vestígios de sangue.
— Além do homicídio qualificado, pelo qual foi presa em flagrante, ela será investigada por tortura. Essa criança tem uma série de lesões anteriores significativas e graves. Por exemplo, há uma queimadura bastante extensa e profunda em um dos braços. Aquela lesão nos leva a crer que ela mesma queimou a criança, com ferro de passar roupa. Isso teria acontecido há 10 dias — afirma o delegado.
Após o flagrante, a polícia solicitou que fosse decretada a prisão preventiva da mulher. O Judiciário atendeu o pedido e determinou que o consulado do Haiti no Brasil, em Brasília, seja comunicado sobre a prisão. A Justiça requisitou novas imagens do bebê e o depoimento gravado da menina, que também foram remetidos pela polícia.
— A criança foi violentamente espancada, disso não há dúvidas. O espancamento é claro. As testemunhas também confirmaram as agressões graves que certamente resultaram na morte. Mas vamos aguardar a perícia para apontar a causa exata — explica Rocha.
Conforme o policial, no depoimento formal, a mulher alegou que não se comunica bem em português, e preferiu permanecer em silêncio. Ela estaria residindo no Brasil há pelo menos dois anos. Na menina de seis anos não foram encontradas lesões aparentes de agressão. Por enquanto, a menina permanecerá aos cuidados do pai.
— Ele não estava presente no local dos fatos. A criança se mostrou muito afetiva à presença dele e ele da mesma forma. Acompanhamos o retorno da menina para casa, por uma questão humanitária. Ficamos com ela até adormecer — contou o delegado.