Uma antiga característica popular nas noites de Pelotas, a dos lanches na rua, pode ser diretamente afetada por uma das principais medidas propostas pelo Pelotas pela Paz, projeto que começa a sair do papel neste mês como forma de atacar a explosão da violência na cidade do Sul. O projeto do Código de Convivência Democrática, segundo a prefeita, ainda está em construção e, quando finalizado, passará pelo crivo da Câmara de Vereadores. Mas seus principais pontos já estão expostos desde o lançamento do estudo. Entre eles, a proibição do consumo de bebidas alcoólicas nas ruas da cidade no intervalo entre 22h e 4h.
A medida é inspirada em Diadema, na Região Metropolitana de São Paulo, onde foi imposta a "lei seca", bem mais restritiva do que a proposta em Pelotas. Lá, um estudo da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) demonstrou que essa medida evitou, diretamente, 11 homicídios por mês no intervalo de dois anos. Uma queda de um terço do que era registrado na cidade até 2002. De acordo com Alberto Kopittke, a proposta em Pelotas é muito mais flexível e construída em conjunto com os empresários locais.
– Deparamos com o dado estarrecedor de que quase 30% dos moradores têm medo de sair à noite. Isso prejudica a todos. Então, a medida pode parecer restritiva, mas, na verdade, vai estimular os estabelecimentos comerciais e tornar as nossas ruas mais seguras – avalia a prefeita.
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Para representantes do comércio local, este é ainda um ponto pendente de maior discussão.
– É evidente que algumas coisas podem trazer prejuízos para algum setor. Mas a violência é um tormento tão grande para a sociedade que não podemos submeter a segurança a interesses menores – diz o presidente do Sindicato do Comércio Varejista (Sindilojas), Gilmar Pazanella.
A produtora cultural, diretora da Câmara dos Dirigentes Lojistas (CDL) do município, Adriane Silveira, é mais cautelosa em relação ao álcool:
– O pacto vem atender a uma necessidade social e é um compromisso de todos os órgãos públicos e da sociedade civil. O CDL, sem dúvida, é parceiro. Sobre o Código de Convivência Democrática, a ideia é a construção desse processo conjuntamente. Nos sentimos contemplados, uma vez que seremos ouvidos a respeito do assunto.
A outra inspiração está nas medidas adotadas em lugares como Nova York, nos Estados Unidos, e Bogotá, na Colômbia, para conter a violência.
– São ações para combater pequenos delitos, que acabam desencadeando crimes mais graves – diz Kopittke.
A proposta é de multa entre R$ 2 mil e R$ 5 mil para quem for flagrado brigando na rua, agredindo mulheres, com armas de brinquedo, consumindo drogas ou para os pais de menores flagrados sozinhos.
– Alguns desses casos são crimes.
A multa vai se somar à punição já prevista penalmente. O CPF da pessoa multada é cadastrado e, na inadimplência, poderá entrar no cadastro de devedores – explica o consultor.
O código dará maior suporte legal às ações já iniciadas com os plantões contra a perturbação do sossego. Não há restrição prevista, por exemplo, ao consumo de bebidas dentro de estabelecimentos. A promessa, no entanto, é endurecer a fiscalização sobre possíveis irregularidades nesses locais.
Para novos empreendimentos, a ideia é exigir, entre os diversos licenciamentos já necessários, também um Estudo de Impacto de Segurança.
– Os estabelecimentos precisam se responsabilizar pelo seu impacto ao entorno. Um novo não pode se tornar alvo de preocupação, mas um aliado – acredita Kopittke.