Após três anos de espera pelo exame de balística, a Polícia Civil de Caxias do Sul decidiu concluir sem indiciamentos o inquérito sobre as mortes de Micael dos Santos Amaral, 18 anos, e João Augusto Alves de Oliveira, 69. O duplo homicídio, no bairro Charqueadas em dezembro de 2013, era a investigação mais antiga em aberto na Delegacia de Homicídios e Proteção à Pessoa. O relatório cita cinco homens que foram presos em flagrante no dia seguinte ao crime com um carro e armas de calibre compatíveis aos utilizados no crime. Contudo, sem a perícia que compara as munições utilizadas com as armas apreendidas, não foi possível comprovar a autoria dos assassinatos.
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O caso, infelizmente, não é uma exceção. Essenciais para esclarecimento de homicídios, alguns laudos de balística levam mais de quatro anos no Rio Grande do Sul para serem feitos. O Instituto Geral de Perícias (IGP) alega a histórica defasagem de efetivo para a falta de respostas. O quadro funcional está 73% abaixo do ideal. Quem ganha com isso são os autores de crimes.
Outra dificuldade é que esse exame só é feito em Porto Alegre, onde há o comparador balístico. Ou seja, todas as perícias solicitadas pela Polícia Civil gaúcha são remetidas para a mesma equipe. Em um Estado que 2.973 pessoas foram assassinadas apenas no ano passado, a fila de espera só aumenta.
Ciente da deficiência, o perito Airton Carlos Kraemer busca apoio para a criação de um laboratório de balística em Caxias do Sul. Ele é o responsável pela 2ª Coordenadoria Regional de Perícias (2ª CRP), que atende 55 municípios da Serra. O investimento de aproximadamente R$ 400 mil é considerado viável diante do apoio encontrado na região, principalmente do Ministério Público (MP) e do Poder Judiciário que recentemente cederam R$ 270 mil para compra de uma carreta para o transporte de corpos. A dificuldade, novamente, é a falta de servidores.
– O projeto está parado até que tenhamos um aporte de servidores. A esperança é as duas vagas de engenheiros para Caxias que estão previstas no novo concurso do IGP (o edital foi publicado em 19 de abril). É um sonho possível para o ano que vem – aponta.
Uma das ideias é que o laboratório fique na nova sede da Polícia Civil, prestes a ser inaugurada na esquina das ruas Irmão Miguel Dario e Humberto de Campos no bairro Jardim América. A obra se arrasta desde 2011 por diversos problemas: burocracia, modificações no projeto e adequações no terreno. O novo prazo de entrega é para final de junho.
– A hora que implementarmos será um salto de qualidade impressionante para a perícia. Os resultados não demorarão cinco anos e a Polícia Civil não precisará transportar armas, semanalmente, para Porto Alegre – argumenta Kraemer.
INVESTIMENTO
Para a realização das perícias de balística na Serra, além do comparador balístico e dos peritos, são necessários uma sala com cerca de 30m², uma bancada de tiro, um exaustor, um computador e um ar condicionado. O investimento estimado é de pouco menos de R$ 400 mil.
Esse valor seria recuperado pelos cofres públicos em pouco tempo, afinal todas as semanas policiais civis precisam transportar armas para Porto Alegre para perícias, o que resulta em gastos. Qualquer arma apreendida pela polícia precisa ser submetida a um teste de funcionamento para que o suspeito seja indiciado e processado. Essa perícia também só é feita na Capital.
Relembre o caso
:: As mortes de Micael dos Santos Amaral e João Augusto Alves de Oliveira ocorreram por volta das 22h30min de 1º de dezembro de 2013. Testemunhas apontaram que homens em um Kadett branco chegaram na Rua Maria Blandina Rigoni, bairro Charqueadas, e efetuaram diversos disparos de arma de fogo contra uma casa onde estavam as duas vítimas. Amaral morreu na hora. Oliveira foi socorrido, porém morreu três dias depois no Hospital Pompéia.
:: Na tarde seguinte ao crime, a Brigada Militar prendeu cinco homens, entre 20 e 29 anos, com cinco armas de fogo e um Kadett branco na Rua José Perini, no Vila Amélia. Eles foram autuados por receptação, porte ilegal de arma de fogo e formação de quadrilha. As armas tinham calibre compatível às utilizadas no duplo homicídio e o carro encontrado batia com a descrição de testemunhas. Por isso, os cinco presos passaram a ser investigados pela Delegacia de Homicídios.
:: Na época também surgiu uma denúncia anônima que apontava dois dos presos como autores do duplo homicídio no Charqueadas.
:: Dos cinco presos pela Brigada Militar (BM) naquele dia 2 de dezembro, dois foram assassinados em crimes diferentes no ano de 2014, um está preso em Pelotas, outro é foragido da Justiça há pouco mais de dois anos e o quinto está em liberdade provisória.