"Vocês entraram na casa errada".
O grito era de um dos criminosos em direção aos comparsas antes de embarcar em um carro e arrancar cantando pneus no chão de terra do pequeno Beco Ambaju, Bairro São Vicente, em Gravataí, na madrugada deste domingo. À essa altura, os moradores já estavam em pânico. E na suposta casa enganada uma chacina estava feita. José Carlos Líbano, 43 anos, que trabalhava na capina da cidade, seu genro, o chapista Vinícius Marinho Vianna, 25 anos, e o vizinho, o motorista de van escolar Édson da Silva Rodrigues, 29 anos, estavam mortos.
Mais de 40 tiros de 9mm, calibre 12 e até de fuzil 5.56 haviam sido disparados no local e ao longo do beco.
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As marcas da violência do ataque, ocorrido pouco antes das 3h, também atingiram outras moradoras que chegavam ao local, de carro, naquele momento. Elas acabaram cruzando o caminho de um dos veículos dos criminosos, que dispararam. Duas mulheres, de 35 e 55 anos, além de uma menina de nove anos, foram atingidas de raspão. Nenhuma delas corre risco de vida.
De acordo com o delegado Rafael Sobreiro, que responde pela investigação na Delegacia de Homicídios de Gravataí, já há uma linha de investigação e algumas suspeitas. Disputas do tráfico de drogas estariam por trás do crime. Ele evita revelar detalhes da investigação, mas admite: é possível que as vítimas tenham sido mortas por engano.
O ataque
No momento em que dois carros, ainda não identificados, apareceram na entrada do beco e os disparos começaram, em torno de seis pessoas ainda estavam na casa de José Carlos. Encerravam um churrasco em comemoração ao aniversário de Édson, que morava na casa em frente à dele.
– Eu ouvi aqueles estouros e comecei a gritar para eles correrem para dentro de casa. Estavam recolhendo as cadeiras naquela hora – contou a esposa de José Carlos, Lecir Ramão França, 49 anos.
Um dos carros já havia cruzado todo o beco e fazia a volta quando os criminosos viram Édson e Vinícius correndo. José Carlos, que já dormia no quarto da frente de sua casa levantou com os tiros. Dois atiradores perceberam a correria e invadiram a casa. Eles gritavam que eram policiais e estavam "atrás dos vagabundos". Às mulheres que estavam no local, a ordem era para que fechassem os olhos.
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Não adiantou dizer que eram todos trabalhadores. Rendido e com as mãos atrás da cabeça, Vinícius foi executado na entrada da casa. Édson ainda tentou se refugiar em um dos quartos e também foi abatido. O mesmo aconteceu com o dono da casa.
– Não tem nem o que dizer sobre isso, porque eu não consigo entender até agora. O Édson tinha acabado de dar boa noite para a filha de dez anos, o Vinícius também tinha uma menina de quatro anos. Eles sempre trabalharam, nunca vi envolvidos com nada. Hoje mesmo (domingo), eu e meu marido iríamos trabalhar – desabafou a faxineira Lecir.
Na manhã deste domingo, boa parte dos moradores do beco estava na rua. Cada um com a sua cadeirinha, mas era diferente dos domingos comuns: todos choravam e se consolavam. Nos carros estacionados, as marcas dos vidros e latarias perfurados por tiros não deixavam dúvida do estrago não cicatrizado.