Como se demarcassem o limite entre os bairros Menino Deus e Cidade Baixa, em Porto Alegre, marcas de sangue no asfalto na Rua Barão do Gravataí não são os únicos vestígios do assassinato de uma adolescente de 17 anos, ocorrido na noite de terça-feira. Na manhã desta quarta-feira, moradores relatavam o medo vivido ao ouvirem os mais de 15 tiros disparados contra Shaiene da Silva Machado, que depois foi arrastada sob um carro por cerca de 60 metros.
– É chocante quando a violência literalmente está na tua porta – afirma Marilene Martins, funcionária pública de 55 anos.
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Moradora da Barão do Gravataí, Marilene conta que está acostumada a presenciar brigas e confusões, mas que uma execução como esta é "difícil de acreditar que aconteceu tão perto". O medo de assaltos já a assombrava e provocou mudanças na rotina da família.
– Nesta época em que o calor começa, a gente já costumava sair pra caminhar no bairro, tomar um chimarrão nas pracinhas. Isso não existe mais pra gente. Às 18h30min, é como se tivéssemos um toque de recolher – relata Marilene.
Moradora do bairro Menino Deus desde que nasceu, há 39 anos, uma funcionária da prefeitura, que prefere não se identificar, aponta o crescimento populacional da região como uma das causas do que ocorreu.
– Antigamente, Deus o livre falar, até os traficantes a gente conhecia. E não tinha violência. Agora, eu vejo os puxadinhos crescerem da minha janela e já não reconheço quem é de bem. Já sentia que isso (assassinato) ia acontecer aqui – conta a servidora, que mora em uma das casas que ainda resistem em meio aos prédios.
A região é formada predominantemente por casas. Dona de um dos raros bares que existem ali, uma empresária de 50 anos, que também pediu para falar anonimamente, diz que arriscou abrir o estabelecimento há dois meses porque não tinha medo.
– O bairro sempre foi tranquilo, todo mundo se conhece. Os tumultos acontecem quando vem gente de fora – relata.
Conhecida dos moradores mesmo não residindo há muito tempo ali, Shaiene costumava passear com outros amigos com uma bola debaixo do braço, rumo a campinhos de futebol. Para a dona do bar, foi um susto deparar com o corpo da menina no meio da rua.
– Fui dormir com uma angústia no peito. Uma angústia que permanece aqui – diz ela, com a mão sobre o peito.
Uma de suas funcionárias interrompeu a conversa. Queria reclamar da (falta de) polícia.
– Todo dia tem assalto ali (no supermercado localizado na Rua Múcio Teixeira). Os guris saem anunciando que roubaram comida e levam pra vila. Nunca tem policial pra impedir – reclamou ela.
Entre os moradores que passeavam pelas calçadas do bairro na manhã desta quarta-feira, estava um casal com uma dupla de cães e o filho de quatro meses num carrinho. A família disse não sentir medo.
– Claro que não é supernormal (a morte), mas absurdo mesmo é ter três batalhões de polícia quase do lado que, além de não evitarem a violência, demoraram para chegar – disse a assessora jurídica Ana Carolina Hoerlle, 30 anos.
Opinião diferente tem a autônoma Scheila Rangel, 45 anos, que também passeava com seu cão. A mulher cogita seriamente se mudar, mas não para outro bairro: quer mudar de cidade.
– Gosto muito de Porto Alegre. Vim de Carazinho para cá há 13 anos, mas me sinto cada vez mais sufocada aqui – revela.
Onde foi o assassinato: