Acampamento Farroupilha é lugar de festa, de comemoração, de contar causos e fazer poesia. Mas, atualmente, também é local de dividir experiências de assaltos. Na quarta reportagem da série Uma história de muitas, visitamos o Parque da Harmonia, em Porto Alegre.
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Piratini anuncia medidas para aumentar PMs nas ruas
Ainda na montagem dos piquetes, não foi difícil encontrar quem já teve algum contato com ladrões, seja pessoalmente ou na família. As obras e o preparo do almoço foram interrompidos para que a pergunta pudesse ser feita e respondida: "Quem já sofreu algum tipo de violência ou que tenha um familiar próximo que foi vítima da criminalidade?"
Dos 12 peões e patrões ouvidos, 11 apresentaram suas histórias. Três foram assaltados com facas ou armas de fogo. Perderam celular, dinheiro e documentos. Dois tiveram suas casas arrombadas por três vezes. Outros dois perderam seus veículos. Medo, impotência e revolta foram as palavras mais ouvidas. Todos falam em providências que precisaram ser tomadas. Investimento que chegou a ser feito. Rotinas que foram alteradas. Tudo para não voltar a deparar novamente com bandidos. Pelo menos, por enquanto.
A campanha do Grupo RBS, que dá rosto aos alvos da criminalidade, teve início na segunda-feira, quando uma turma de cursinho pré-vestibular contou suas histórias de violência.
"Está muito complicado em Porto Alegre"
GUSTAVO AZAMBUJA
Metalúrgico, 40 anos, prima sequestrada com metralhadora
Há um ano e meio, a prima do metalúrgico Gustavo Azambuja, 40 anos, foi abordada por ladrões armados de metralhadora. Desceram de uma caminhonete, aproveitaram o momento que ela saía da residência de uma prima e entraram no carro dela, um HB20 recém-saído da concessionária. A cena foi flagrada pela mãe da jovem, que via tudo do carro de trás. O horário: 19h. O local: Rua Coronel Manoel Py com General Couto de Magalhães, bairro Higienópolis.
Os ladrões andaram uma quadra com a mulher até deixá-la em uma esquina. - Eles queriam só o carro. Falaram para ela. E a minha prima foi muito tranquila. Ela é psicóloga. Ela se acalmou. Viu a situação e percebeu que os ladrões a deixariam rapidamente. A mãe da jovem, por precaução, já havia deixado o bairro Auxiliadora com medo dos assaltos e se mudou para Nova Petrópolis. Azambuja adotou a mesma providência: deixar Porto Alegre e buscar uma cidade mais afastada para não mais conviver com tantos assaltos:
– Moro há dois anos em Charqueadas. Eu me sinto muito mais seguro lá, apesar de também ouvir falar sobre violência na cidade, mas não é como aqui em Porto Alegre. Lá, consigo sair com o meu carro tranquilo. Já aqui, não. Tenho de descer, olhar para os dois lados, ver se vem alguém. Está muito complicado em Porto Alegre.
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"Quando vi, já estavam em cima de mim"
DERLI DOS SANTOS
Garçom, 52 anos, assaltado na parada de ônibus
"Trabalhei no Higienópolis. Peguei o último ônibus da noite, às 23h40min. Desci na Santa Casa. Caminhei até a (avenida) Salgado Filho, quando fui assaltado. Os dois saíram de uma boate. Quando vi, já estavam em cima de mim. Os dois armados. Não reagi. Daí, eu disse: 'leva a bolsa. Sou garçom, estou saindo do serviço e estou indo embora para a casa. Só me deixa o dinheiro para a passagem'. Levaram a bolsa e deixaram R$ 5. Levaram R$ 280. Primeira vez que isso aconteceu. E ninguém faz nada. Ninguém socorre ninguém. Nós estamos sem segurança em qualquer lugar. Já vi dois assaltos no Centro e ninguém fez nada. Tenho medo de sair à noite. Se for muito longe, não vou trabalhar. Se tiver de pegar dois ônibus, não vou."
"Hoje a gente não tem segurança"
PAULO ROBERTO MACHADO
Domador de cavalos, 50 anos, casa arrombada três vezes
"Tive a casa arrombada três vezes no Lami. A gente liga para a polícia, que não vem. Não aparece. Hoje, não se tem segurança. E até tem um posto policial perto, mas a gente não tem atenção. Na última vez, há seis meses, minha esposa e eu saímos a cavalo, por volta das 11h, e ficamos umas três horas fora. Quando voltamos, a casa estava arrombada. Levaram uma moto, todas as roupas. Fizeram uma limpa. Só não levaram geladeira porque não passava pela janela. Fiquei sem roupa. Só tinha a bombacha, que estava usando. Nem ocorrência fiz porque não vale a pena. Tu ligas, e eles não vêm. Por que fazer ocorrência?"
"Pensei em reagir, mas achei que não deveria"
ALDORI DOS SANTOS OLIVEIRA
Funcionário público estadual, 62 anos, assaltado há dois anos na porta de casa
"Eu estava chegando a pé em casa na Restinga, em torno de 22h30min, e cinco elementos se aproximaram e puxaram o revólver. Um disse para o outro colocar munição. Pensei em reagir, mas achei que não deveria. Afinal, documento, eu tiro de novo, celular, compro de novo, e eu perderia só R$ 80. Tive também a casa arrombada três vezes. Na primeira vez, levaram uma televisão e um DVD. Na segunda, uma televisão, mais um DVD, um violão e um cachorrinho poodle. Na terceira vez, arrombaram pelos fundos e levaram utensílios domésticos. A gente fica meio abalado. A batalha é grande. Adquire as coisas com sacrifício. Daí, chega um delinquente, leva as coisas e tu ficas a ver navios. Botei alarme em casa e, agora, amenizou a situação por enquanto".