Do trio de assaltantes que aterrorizou estudantes, pedestres e motoristas durante a tarde de crimes que se encerrou com o latrocínio da vendedora Cristine Fonseca Fagundes, na quinta-feira, todos tinham antecedentes.
Um deles, Fabrício Farias, 20 anos, preso minutos depois de Cristine ter sido baleada diante da filha na frente do Colégio Dom Bosco, no bairro Higienópolis, havia deixado a cadeia quatro meses atrás, onde ficou recolhido durante cinco meses por assalto. Além disso, foi preso de novo em julho e solto no dia seguinte. A situação foi alvo de críticas do promotor de Justiça Eugênio Amorim, da 1ª Vara do Júri de Porto Alegre:
"Tenho dito aqui há muito tempo que o Judiciário tem de assumir sua culpa e cortar na carne, sem corporativismo... Pois bem. Pois bem. Fabrício Farias, o cidadão preso por matar a mulher ontem (quinta-feira) no latrocínio em Porto Alegre, foi preso em 26 de novembro de 2015 e solto em 12 de abril de 2016 sob alegação de excesso de prazo de prisão cautelar (meros cinco meses). O Ministério Público não concordou com a soltura, mas a juíza Vanessa Gastal de Magalhães colocou o criminoso nas ruas. Nas ruas, foi preso por outro assalto em 15 de julho de 2016 e, mesmo estando respondendo a outro processo por roubo, e no novo roubo com reconhecimento pelas vítimas já no registro de ocorrência, foi solto no dia seguinte, provavelmente na festejada audiência de custódia, por um juiz plantonista, também contra a vontade do Ministério Público, que recorreu. Quarenta dias depois, destrói uma vida e uma família, solto, armado e fazendo o que sabe fazer: roubar. A pergunta que faço é: sem as mentiras de que foi apenas cumprida a lei, e sem terceirizar a culpa, o que o Poder Judiciário tem a dizer à população e que medidas efetivas tomará além de culpar os políticos de costas largas?", escreveu o promotor em postagem no Facebook.
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No processo referente ao crime de julho, consta que Farias, acompanhado de um adolescente, roubou dois celulares de um casal na Avenida Salgado Filho, no Centro. Reconhecido pelas vítimas, ele negou ter sido o autor do ataque e disse que teria sido confundido com outra pessoa.
A reportagem tentou entrevistar a juíza Vanessa, mas a assessoria de imprensa do Tribunal de Justiça (TJ) do Estado informou que ela não se pronunciaria e indicou o desembargador Túlio de Oliveira Martins, presidente do Conselho de Comunicação Social do TJ, para se manifestar:
– Juízes prendem e juízes soltam. O promotor pede (a prisão) e o pedido pode ser deferido ou não. Se ele (o promotor) não gostou (do resultado), deve recorrer e não ofender as pessoas.
Detido ainda na quinta-feira em buscas nas proximidades de onde Cristine foi morta, Farias confessou ter circulado pela Zona Norte acompanhando os comparsas durante os delitos em pelo menos três bairros de Porto Alegre.
A primeira vítima foi o motorista de um Palio vermelho que saía do carro e acabou sendo levado com o veículo pelo trio, por volta das 17h. A partir daí, os criminosos rodaram o bairro, atacando pessoas aleatoriamente até chegar em Cristine.
O objetivo dos criminosos, segundo Farias, era roubar dinheiro e celulares – dois aparelhos foram encontrados em um bolso nas vestes dele. Apesar disso, o suspeito nega participação ativa nos crimes.
– Não roubei, não fiz nada, estava só dentro do carro – defendeu-se ao conversar com os policiais.
O delegado responsável pela investigação, Alexandre Vieira, da 9ª Delegacia de Polícia da Capital, acredita que os telefones seriam revendidos no Centro.
No depoimento, Farias alegou que rouba para sustentar o filho recém-
nascido. A detenção pelo envolvimento no latrocínio da vendedora e nos assaltos que o antecederam é a terceira dele por roubo. Com prisão preventiva decretada, ele foi levado para o Presídio Central na madrugada de sexta-feira.
Apontado como atirador se entrega em foro na Capital
De acordo com os relatos à polícia de Fabrício Farias, preso ainda na quinta-feira, e do motorista do Palio sequestrado pelo suspeito e outros dois ladrões, o disparo que ceifou a vida de Cristine Fonseca Fagundes foi efetuado por Tiago Oliveira da Silva, 30 anos, um dos comparsas que portava um revólver calibre 38. No banco do carona, era ele quem descia do Palio para atacar as vítimas – foram pelo menos oito até a vendedora ser morta. Segundo os depoimentos, na última investida, após o estampido, Silva voltou ao Palio dizendo que teria atirado "sem querer".
Por volta das 17h de sexta-feira, ele se apresentou no Foro Central de Porto Alegre. Teria entrado correndo no local antes de se entregar, muito assustado. Foi atendido pela Defensoria Pública, a quem relatou sofrer ameaças de morte. Ele tem antecedentes por receptação, ameaça, tráfico de drogas e por outros três roubos cometidos em 2015.
No foro, a juíza Rosália Huyer acatou o pedido da defensoria, e por volta das 18h, Silva foi encaminhado à Penitenciária de Alta Segurança de Charqueadas (Pasc) "por motivos de segurança". Mas o delegado Alexandre Vieira, da 9ª Delegacia de Polícia, pediu à Justiça para tomar o depoimento do suspeito. A solicitação foi aceita, porém Silva só será ouvido na segunda-feira em razão de a decisão ter sido proferida na noite de sexta.
Um dos assaltantes continua foragido
Acompanhando Farias e Silva durante a tarde de crimes na quinta-feira, Rafael Silveira Santa Helena, de idade não confirmada, estaria na direção do Palio vermelho que roubaram para cometer os delitos. A perícia confirmou a participação dele e de Silva.
As digitais dos dois foram encontradas no carro. A Justiça também decretou a prisão preventiva de Santa Helena, com antecedente por agressão, que seguia foragido até a noite de sexta-feira.
Os suspeitos
Fabrício Farias, 20 anos (preso): um roubo em novembro de 2015 e outro em julho de 2016.
Rafael Silveira Santa Helena, 26 anos (foragido): respondeu a termo circunstanciado de agressão contra mulher.
Tiago Oliveira da Silva, 30 anos (preso): receptação em 2004, ameaça em 2008, tráfico de drogas em 2012 e três roubos em 2015.