Com um crachá do Banco Central pendurado no pescoço, uma mulher bate à porta de uma idosa e, com toda a educação, pede para verificar todas as cédulas que ela guarda. Dando a justificativa de que precisa anotar os números de série das notas, a suposta servidora aproveita um momento de distração da dona da casa para trocar o dinheiro verdadeiro por um montante falso.
Repetido em Rio Grande, no sul do Estado, pelo menos seis vezes nos últimos seis meses, esse tipo de crime motivou a abertura de seis inquéritos de investigação pela Polícia Federal (PF). As suspeitas - em princípio três mulheres - ainda não têm nome, mas, por meio de três retratos-falados divulgados pelos policiais, faz-se ideia de suas feições. É uma fraude comum, segundo o delegado Gabriel Cavalheiro Leite:
- Ocorreu isoladamente em outras cidades do Estado, como Pelotas e Camaquã, e estamos checando se há conexão entre as quadrilhas. Por enquanto, ainda não sabemos dizer.
Em Pelotas, há registro de pelo menos outros seis casos. A polícia também não tem informações sobre o prejuízo total que as criminosas causaram em Rio Grande. Uma das vítimas, em entrevista a Zero Hora, teve perda de R$ 350.
- Eu tinha recém sacado esse dinheiro para pagar a fatura de um cartão - lamenta a senhora de 82 anos, que não quis se identificar.
Excepcionalmente naquela tarde de dezembro, ela estava sozinha em casa (normalmente, a filha lhe faz companhia) quando uma mulher - definida pela vítima como loira, de cabelos ondulados, bem vestida e gentil - tocou a campainha. O crachá que supostamente lhe credenciava ao Banco Central serviu como um passe livre para que a dona de casa permitisse sua entrada.
- Ela pediu para ver o que eu tinha de dinheiro. Tirei da carteira uma nota de R$ 50 e uma de R$ 20. Perguntou se eu tinha mais. Busquei os R$ 350 que estavam guardados e mostrei. Enquanto ela olhava as notas, outra pessoa bateu à porta. Fui atender e não havia ninguém lá. Achei estranho, mas voltei para a sala. A moça agradeceu e foi embora - conta.
Só dois dias depois, relatando a visita à filha, a aposentada se deu conta de que havia sido vítima de golpe.
- Me senti péssima, uma trouxa - desabafa, ao salientar que as notas irregulares eram bem parecidas com as verdadeiras.
Em outros casos, conforme a PF, as cédulas eram grosseiramente falsificadas: muito mais espessas que as originais e sem marca d'água ou fio de segurança.
Vítimas escolhidas a dedo
O delegado afirma que as criminosas não batem em qualquer porta:
- Existem fortes indícios de que essas mulheres acompanham a rotina das vítimas. Elas aparecem em momentos muito específicos, quando a idosa está sozinha ou quando recém-sacou dinheiro do banco, por exemplo.
O número de casos registrados na polícia, alerta ele, é mínimo.
- Muita gente não denuncia porque tem vergonha de ter caído em um golpe como esse. É o que acontece também com as vítimas do conto do bilhete premiado - compara.
A perícia pela qual deve passar o dinheiro falso deve dar pistas à polícia (após a análise, as cédulas são encaminhadas ao Banco Central - o de verdade -, encarregado de destruir notas irregulares). Os retratos-falados apurados pela PF são bons caminhos, mas não são determinantes para elucidar os crimes:
- Não são 100% precisos porque uma pessoa de idade tem dificuldade de driblar o nervosismo e fazer as descrições corretamente.
Quando localizadas e acusadas, as farsantes podem pegar pena de três a 12 anos de prisão. Se for constatada formação de quadrilha, o tempo de detenção pode aumentar em até três anos.
Crime não é novo
Em 2005, um golpe semelhante lesou idosos em Santa Maria, no centro do Estado. Fingindo ser servidores do Banco Central, homens diziam que havia problemas em um lote de cédulas de R$ 50 e pediam para verificá-las. Em alguma desatenção da vítima, trocavam o dinheiro verdadeiro por falsos.
O que fazer se for vítima do golpe
A primeira orientação do delegado Leite é que se faça o registro na Polícia Federal, que é responsável por investigar esse tipo de crime. Ele ressalta que é preciso "resistir à tentação de não ficar no prejuízo" e, de forma alguma, passar as cédulas falsas adiante, pois isso também é crime. Quem tenta colocar dinheiro falso em circulação pode pegar de seis meses a dois anos de prisão.
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