Com o sucesso do livro da ganhadora do Prêmio Nobel da Medicina de 2009, Elizabeth Blackburn, O Segredo Está nos Telômeros, um best-seller do The New York Times, o termo explodiu em popularidade. Por meio da obra, pessoas comuns que nada têm de expert em genética passaram a imergir no universo das células do corpo humano.
O motivo? Estudos da australiana mostram que a condição dos telômeros, pequenas estruturas dos cromossomos (veja mais abaixo), pode indicar como você vai envelhecer e se terá uma longevidade ativa e livre de doenças. Ainda que cientistas tenham visões distintas sobre a importância de saber como anda a saúde dos telômeros – teste que é possível fazer por apenas US$ 89 nos Estados Unidos – e se é possível reverter um possível quadro ruim, a publicação levantou o debate: o quanto a genética influencia no envelhecimento e como podemos fazer para que ela funcione a favor da saúde?
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Duas pessoas da mesma idade podem ter aparências totalmente diferentes. Imagine dois homens de 50 anos lado a lado: enquanto um sofre com cansaço e dores nas pernas frequentemente, o outro esbanja disposição para viajar e visitar os filhos aos finais de semana. Alguém pode dizer: é a genética que leva a tantas diferenças. Outros podem apontar para as escolhas feitas ao longo da vida. Elizabeth afirma que é a interação entre esses dois fatores que faz a diferença. Apesar de cada um nascer com um conjunto de genes, é possível ter algum controle sobre a forma como eles vão se manifestar.
Mara Hutz, geneticista do Departamento de Genética da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), concorda que a genética não é algo determinante. Algumas pessoas nascem com genes que as tornam predispostas a certas doenças. Mas a forma como elas vivem e o ambiente em que estão inseridas podem fazer esses genes se expressarem ou não. Para a doença de Parkinson, por exemplo, já há importantes evidências disso.
– Quanto menor o componente genético, mais o ambiente interfere. São os genes e o ambiente que determinam o quanto cada um vai viver. Pessoas que vivem em ambientes pouco favoráveis ao conforto, sem alimentação adequada, vão envelhecer mais rápido do que uma pessoa que tem acesso a várias comodidades. A longevidade é programada pela genética, mas isso pode ser alterado – afirma Mara.
Por isso, a especialista reforça a importância dos hábitos de vida saudáveis:
– As pessoas têm de viver bem, se alimentar bem, sem se preocupar se o telômero está curto ou não.
Para Rodrigo Calado, professor do departamento de clínica médica da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto (FMRP) da USP, autor de artigo publicado no New England Journal of Medicine sobre o alongamento de telômeros para a cura de doenças, a associação do comprimento dessas estruturas com o envelhecimento ainda não é clara. Segundo ele, os telômeros encurtam ao longo do tempo, fenômeno que não necessariamente atua como condutor do processo de envelhecimento.
– O encurtamento telomérico não causa o envelhecimento em si. Existem doenças que reduzem o tamanho dessas estruturas, mas as pessoas que sofrem desses problemas não envelhecem mais rápido do que as outras. O que há é o comprometimento da função de alguns órgãos, como o pulmão, assim como maior risco de câncer como decorrência dos telômeros mais curtos – afirma o professor.
O que são os telômeros:
Em 2009, Elizabeth Blackburn ganhou o Prêmio Nobel de Medicina por descobrir como os cromossomos são protegidos pelos telômeros e pela enzima telomerase, que regenera essa estrutura. Em conjunto com a psiquiatra Elissa Epel, a médica publicou o livro O Segredo Está nos Telômeros, que condensa anos de pesquisa científica, para explicar por que manter essa estrutura intacta ajuda a retardar sinais e doenças relacionadas ao envelhecimento.
Elizabeth usa a metáfora dos cadarços de um tênis para explicar o que são e por que os telômeros importam. Os cromossomos, estruturas compostas de DNA que carregam os genes de cada ser humano e ficam dentro das células, seriam os cadarços. A ponta de plástico nas extremidades do tecido, que evita que ele se esfiape, seriam os telômeros. Quando essa proteção do cadarço se desfaz, ele fica inutilizável.
As células do corpo se dividem constantemente para mantê-lo saudável. É um processo que renova os tecidos – quando você se corta, por exemplo, elas se dividem para que ocorra a cicatrização. A cada divisão celular, os telômeros se encurtam. Quando eles ficam curtos demais, as células perdem a capacidade de se dividir. No momento em que há um grande número de células que não conseguem mais fazer a divisão, os tecidos do corpo começam a envelhecer.
Por isso, proteger os telômeros e mantê-los maiores, segundo Elizabeth, é uma das maneiras de viver bem e evitar que as doenças cheguem mais cedo. E mais: ainda que o envelhecimento seja ligado à genética, é possível controlar esse fenômeno.
Influências do ambiente
Sabe-se que a genética influencia o tamanho dos telômeros mas, de acordo com a pesquisa de Elizabeth, é possível ajudá-los a manterem-se compridos por mais tempo. Algumas variáveis são importantes para que isso aconteça: o ambiente em que se vive, a dieta, a prática ou não de exercícios físicos e até a forma como se lida com o estresse.
Estudos mostraram, por exemplo, que cuidadoras de pessoas com doenças crônicas – uma tarefa altamente estressante – e indivíduos que passam por períodos longos de estresse crônico têm telômeros mais curtos. Quem segue uma dieta à base de vegetais, grãos integrais e legumes tem telômeros mais longos. Praticantes de meditação e técnicas de atenção plena também teriam essas estruturas dos cromossomos mais compridas.
Mesmo que muitos desses hábitos já sejam comprovadamente relacionados a uma boa saúde, Elizabeth defende que as pesquisas com telômeros são cruciais, pois provam de forma concreta o impacto de certas atitudes no organismo.
A geneticista Mara Hutz diz que ainda não está claro para a ciência se é possível alongar naturalmente os telômeros por meio do estilo de vida saudável. Mas há evidências concretas de que o encurtamento dessas estruturas pode ocorrer devido a consumo de drogas, por exemplo.
– Sabe-se que as drogas encurtam os telômeros. Hábitos como o tabagismo também poderiam encurtar as células e fazer com que elas vivam menos. Há mais evidência de encurtamento do que de alongamento – afirma Mara.
Como ajudar sua genética
As duas autoras do livro O Segredo Está nos Telômeros listam diversas situações e hábitos que estão associados ao tamanho dos telômeros. Com base em estudos epidemiológicos, genéticos e sociológicos, elas mostram o que fazer para viver uma vida melhor e mais longeva.
Exercício físico
A prática de atividade física moderada e regular é boa para os telômeros. Não é preciso ser um maratonista para viver melhor e bem: os telômeros de atletas de resistência e corredores amadores, que correm pouco a pouco todos os dias, não apresentam tanta diferença.
Alimentação
Entre os inimigos das células estão a inflamação, a resistência à insulina e o estresse oxidativo – e a alimentação exerce um papel fundamental no combate a esses problemas.
A glicose absorvida de carboidratos refinados como pães, massas e doces chega muito rapidamente à corrente sanguínea, aumentando as citocinas pró-inflamatórias, substância mensageira das inflamações, que são relacionadas ao risco de desenvolvimento de diabetes, por exemplo. Ou seja, quanto menos você consumir desses alimentos, melhor.
Já o estresse oxidativo ocorre quando há muitos radicais livres e poucos antioxidantes nas células, fazendo com que elas envelheçam mais rápido. As vitaminas C e E podem combater essa condição. Morangos, amoras, framboesas, maçãs, ameixas e vegetais de folhas verdes são exemplos de alimentos que ajudam no combate ao estresse oxidativo.
A resistência de insulina, substância que controla as taxas de glicose no sangue, pode ser causada pelo consumo de bebidas adoçadas, como sucos industrializados e refrigerante, e alimentos com muito açúcar refinado. Quando você toma um refrigerante, por exemplo, o pâncreas libera mais insulina para ajudar a glicose a entrar nas células. Essa glicose se acumula na corrente sanguínea, e o sangue fica com nível mais alto de açúcar. Em uma hora, o nível cai e o organismo "pede" mais açúcar para recuperar essa queda. Quando o corpo passa frequentemente por esses processos, pode desenvolver resistência à insulina.
Sono
As horas de sono, de acordo com as autoras, estão ligadas ao comprimento dos telômeros. Pesquisas mostram que pessoas que dormem pelo menos sete horas por noite, especialmente as mais velhas, têm telômeros maiores. Mas não é apenas a duração do sono: a qualidade também importa. Alguns fatores que parecem bobagem para um sono melhor têm seus malefícios comprovados. Um deles é usar smartphones ou outros dispositivos com tela antes de dormir. Em uma pesquisa, constatou-se que quem usava e-readers, os leitores digitais, levava mais tempo para adormecer e sentia-se menos desperto pela manhã.
É possível até deixar o celular de lado, mas, e os pensamentos? Esses também atrapalham o sono. Técnicas de meditação e atenção plena são aliadas na busca por uma sensação de tranquilidade e pelo foco no presente ao deitar – sem preocupações com o dia seguinte. Uma dica é anotar as tarefas do próximo dia. Visualizando o que precisa ser feito, pode-se aliviar o esforço mental que mantém o indivíduo no modo de vigilância e antecipação. Se ainda assim os pensamentos persistirem, ler um livro impresso – que não seja cheio de aventuras e reviravoltas – ajuda a transferir o foco dos pensamentos, que passa a ser destinado ao conteúdo do texto, fazendo a transição de uma mente muito ativa para um estado de atenção absorta. Prezar pela tranquilidade da mente favorece uma noite de sono mais tranquila. Por isso, não pense duas vezes antes de criar um ritual que acalme o corpo e a mente antes de adormecer.
A resposta ao estresse
Situações de estresse são inevitáveis, mas a forma como se lida com elas pode causar mais ou menos estrago. Em pequenas doses, o estresse cria "músculos" para lidar com novos desafios, o que não é prejudicial. Já uma dose alta de estresse crônico causa danos. Pesquisas mostram que é possível moldar a maneira de encarar os problemas para que o estresse seja uma fonte de combustível e não de envelhecimento.
Elizabeth e Elissa defendem que, em vez de olhar para situações estressantes sempre como uma ameaça, deve-se encará-las como um desafio. O corpo e os pensamentos reagem automaticamente diante de acontecimentos estressantes. Supõe-se que uma pessoa tem como responsabilidade a entrega de um trabalho em pouco tempo.
A musculatura fica tensa, a frequência cardíaca e a respiração mudam como resposta ao estresse. Mas, em vez de ver a situação como ameaçadora, pense naquela tarefa como um desafio. Isso pode ajudar a moldar a resposta do corpo para gerar mais energia, dilatando mais vasos sanguíneos e levando mais sangue para o cérebro.
Meditação
Conter o estresse e manter a atenção no presente, sem ruminações ou preocupações, é bom para as noites de sono, mas não somente para elas: o corpo também se beneficia. Meditações concentradas na respiração – utilizando técnicas com foco na inspiração e expiração, por exemplo – ajudam nessas funções e equilibram o corpo e a mente. Em pesquisas, constatou-se que as pessoas que faziam mindfulness, prática baseada na atenção na e consciência plenas, aumentavam em 17% a sua telomerase (a substância que mantém os telômeros saudáveis) em um período de três meses.
Ambiente social
Os relacionamentos e os lugares em que vivemos fazem a diferença para a saúde. O próprio bairro influencia: em um lugar onde a sensação de segurança é menor, os moradores estão sempre em estado de vigilância, o que colabora para os níveis de estresse psicológico. Os laços entre as pessoas que vivem próximas umas das outras, e se elas mantêm uma relação de confiança, também influenciam o envelhecimento celular.