Para mim, Páscoa não tem só sabor de chocolate. Tem gostinho também de medialuna, doce de leite, parrilla, chipirones e de um bom tannat ou albariño. Explico: a proximidade do feriado me fez lembrar de um vizinho de respeito, o mais alfabetizado da América Latina. Desde que meus filhos nasceram, esse pequeno país (menor do que o RS) vem recheando nossas lembranças de viagem em família. Somos fãs de carteirinha do Uruguai. Que gaúcho não é, certo?
Adoro Rivera, Colonia del Sacramento, Montevidéu e Carmelo. Entretanto, Punta del Este é frequentemente o nosso destino eleito para viajar de carro durante a Semana Santa. A longa distância sempre desmotivou os meus filhos, mas a atenuamos com brincadeiras, músicas de Jorge Drexler, a passagem pela reserva do Taim e, principalmente, com a promessa de compras nos freeshops do Chuy.
Durante os 700 quilômetros a partir de Porto Alegre, vamos enganando a fome dentro do carro com besteiras. O objetivo é nos preservamos para o que está por vir: a divina parrilla que dá aquela sensação de "enfim, chegamos ao Uruguai" (antes que alguém me crucifique, normalmente chegamos antes da Sexta-feira Santa, ok?). Os aperitivos matambrito de cerdo (matambre de porco) e as mollejas (glândula do timo) são os nossos favoritos. Para o prato principal, bife ancho com osso e assado de tiras. Um bom tinto uruguaio acentua as boas-vindas ao sossegado país que mora ao lado. El Palenque, El Novillo Alegre, La Milonguera e La Balancita são alguns dos restaurantes eleitos para o nosso assado.
Após matar a fome da carne uruguaia, percorremos o lado doce do balneário: churros do Manolo, waffle do L' Auberge, sorvete sabor dulce de leche tentación (da Volta) ou o de frutas del bosque (do Arlecchino) e um muy rico flan con dulce de leche (recomendo o do Medio y Medio em Portezuelo). Ah, para quem é fã de medialunas doces (como eu), indico os seguintes endereços: La Coruñesa, Blas Cafe (antigo El Grego) e La Linda. Para empanadas, confira o Las Charruitas. No giro gourmet por Punta del Este, não deixo faltar duas visitas. A primeira é ao supermercado onde fazemos um estoque de queijos, iogurtes e doce de leite (Narbona e Conaprole con crema). Dica: leve na mala a farinha uruguaia (a qualidade é infinitamente melhor do que a da brasileira). A segunda é ao Porto da Península, onde o Rio da Prata se encontra com o Oceano Atlântico. E, além das águas, o Porto também é ponto de encontro das caminhadas dos turistas, de um bom clericot no pôr do sol e do colorido das bancas de frutos do mar pela manhã.
Com sorte, o tempo colabora e dá até para pegar uma prainha em pleno mês de abril saboreando um milho doce, tão característico do Uruguai. Melhor ainda se o dia ensolarado for com o pé na areia do Parador La Huella em José Ignácio, onde a vibe é única. O ideal é reservar com muita antecedência a mesa pelo site do restaurante. Peça chipirones, pescado e reserve um espaço para o vulcão de doce de leite. A boa gastronomia aliada ao charme rústico colocam o La Huella entre os melhores restaurantes do prêmio Latin America's 50 Best Restaurants (em 2016, foi o 23º colocado).
Torta pasculina, alfajores, galletas... enfim, a lista de sabores uruguaios é um convite para fugir da toca no feriado religioso e dar um pulinho nesse país de estilo e ritmo próprio, retrô, educado, seguro e bem resolvido. Aliás, a grama mais verde desse vizinho é um destino perfeito para esconder o ninho de Páscoa.