Populares no Brasil, os anticoncepcionais orais podem não ser o método contraceptivo mais eficaz para a maioria das mulheres com idade entre 20 e 29 anos. Segundo um estudo realizado pela farmacêutica Bayer em nove países, com apoio da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) no Brasil, quase 60% das jovens que optam pela pílula não a utilizam corretamente.
A pesquisa, realizada com 4,5 mil usuárias e apresentada na última semana de setembro, apontou que as brasileiras são as que mais esquecem de tomar a pílula: 58% admitiu ter falhado pelo menos uma vez no último mês. Considerando o último ano, o número salta para nove entre 10 mulheres. Mais da metade das entrevistadas que se esquece disse que isso ocorre pelo menos uma vez por semana.
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Entre as jovens brasileiras ouvidas pelos pesquisadores, 58% não costumam tomar a pílula no mesmo horário todos os dias. E quase 40% das entrevistadas afirmaram não considerar o cuidado com o relógio necessário.
– É importante que se discuta bastante com o ginecologista a respeito do método anticoncepcional para que se chegue à escolha mais adequada às necessidades e ao dia a dia. Muitas mulheres utilizam a pílula, mas não fazem o uso mais correto – disse a doutora em medicina reprodutiva e ginecologia endócrina Marta Finotti.
A médica explica que fatores como a variação de horários e o esquecimento podem comprometer a eficácia do método. E os deslizes se refletem em dados: se fazendo o uso ideal as chances de uma gravidez indesejada são de três a cada 1 mil casos, o chamado uso típico (com falhas) do anticoncepcional oral aumenta esse percentual para nove em cada 100 usuárias.
Conforme o estudo, os hábitos e a rotina atribulada são os principais fatores que levam as jovens a não tomarem a pílula diariamente. As razões mais apontadas para o esquecimento são não tomar o anticoncepcional todo dia no mesmo horário (32%), não deixá-lo em lugar visível (21%), estresse no trabalho ou nos estudos (20%) e agenda cheia (17%). Mais de 60% das brasileiras entrevistadas se consideram mais propensas a esquecer a pílula quando estão preocupadas.
Mudança de método pode ajudar
Questionada por seus potenciais impactos na saúde das mulheres – e por aumentar o risco de doenças como a trombose venosa – a pílula, que ainda é o método anticoncepcional mais usado no Brasil, pode perder terreno para outros também por questões de conveniência. Das mulheres ouvidas pelo estudo, 74% disseram considerar a utilização de métodos contraceptivos que não precisam ser tomados diariamente.
A mudança pode ser uma saída para jovens que querem fazer uso de anticoncepcionais, mas, por diversos motivos, não querem atrelar sua rotina ao uso da pílula. Além disso, outros tipos de métodos que podem evitar a gravidez têm mostrado maior eficácia e, de modo geral, apresentam maior duração (alguns valem por até 10 anos). Nesses casos, o principal empecilho pode ser financeiro.
– Nos EUA, uma pesquisa com mulheres que puderam optar pelo método que quisessem sem custo algum mostrou que os métodos anticoncepcionais de longa duração (Larcs) tendem a ser os preferidos, e mais eficazes para prevenir uma gestação indesejada. A OMS recomenda que os serviços de saúde disponibilizem esses métodos, mas no Brasil ainda há somente o DIU – diz o professor de ginecologia e obstetrícia da Faculdade de Medicina da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Agnaldo Lopes Silva Filho.
Entre os chamados Larcs, que não dependem da disciplina da usuária e podem ser retirados caso a mulher queira engravidar, estão os dispositivos intrauterinos (DIU) e os implantes subcutâneos. No Brasil, o contraceptivo mais utilizado depois da pílula anticoncepcional é o DIU, de acordo com dados da Pesquisa Nacional de Demografia e Saúde da Criança e da Mulher (PNDS). Ele dura até cinco anos no caso do hormonal e de 10 anos no de cobre, e ambos têm índice baixo de falha – entre 0,2% e 0,8%. É o único Larc disponibilizado pelo SUS, e de forma restrita: é distribuído aos municípios com população igual ou superior a 50 mil habitantes.
Mitos e verdades sobre a pílula anticoncepcional
Aumenta o risco de trombose: parcialmente verdade
Pílulas que combinam estrogênio e progesterona podem aumentar os riscos de trombose, mas o percentual é muito pequeno. Se em circunstâncias normais a doença afeta cinco a cada 10 mil mulheres, fazendo o uso do anticoncepcional oral combinado, esse número passa para 10 a 15 a cada 10 mil. Nesses casos, é importante levar em conta outros hábitos da mulher, como o tabagismo (que pode elevar os riscos) antes de bater o martelo. No caso das pílulas à base exclusivamente de progesterona, o risco é o mesmo de uma mulher que não utiliza o método.
Tem de ser tomada sempre no mesmo horário: parcialmente verdade
No caso das pílulas à base de progesterona, cuja dosagem hormonal costuma ser menor, o rigor com o horário deve ser observado e pode ser determinante para a eficácia do contraceptivo. Já as pílulas combinadas permitem uma certa margem de erro. Uma variação de duas a três horas do horário habitual não costuma afetar a eficácia.
Anticoncepcional oral engorda: mito
Não há estudo que comprove que o uso da pílula influencie o peso. O único método anticoncepcional que já se mostrou inimigo da balança é o injetável trimestral. Nesse caso, o ganho de peso é mais frequente em mulheres que já têm tendência a engordar.
Os dados da pesquisa
Esqueceu de tomar a pílula no último mês
Alemanha 24%
Espanha 27%
Itália 28%
França 39%
México 41%
Bélgica 42%
Irlanda 42%
EUA 54%
Brasil 58%
Por que as brasileiras não tomam a pílula no mesmo horário todos os dias
Não considero necessário 37%
Agenda atarefada 17%
Dois dias seguidos nunca são iguais 31%
Com que frequência as usuárias brasileiras se esquecem de tomar a pílula
Uma vez por semana 30%
Algumas vezes por semana 25%
Uma ou duas vezes por mês 45%