Depois da confirmação de três mortes por gripe A no Estado, aumentou a correria nas clínicas de vacinação particulares – que já veem os estoques acabarem. Nem mesmo o preço, a partir de R$ 70, afasta a população assustada com casos fatais antecipados da doença. Na contramão dessa mobilização, o secretário estadual da Saúde, João Gabbardo dos Reis, disse que as pessoas fora do grupo de risco não precisam se vacinar. Seguindo uma linha parecida, grupos contrários às diversas imunizações preconizadas pelo Ministério da Saúde defendem a não vacinação por motivos ideológicos e religiosos.
Diante da confusão de informações, é importante lembrar que a vacinação é comprovadamente eficiente para redução de internação em até 80% dos casos de H1N1. Ao contrário do que disse o secretário em entrevista à Rádio Gaúcha, a presidente da Sociedade Riograndense de Infectologia, Lessandra Michelin, sugere que as pessoas que desejarem, procurem a vacinação em clínicas:
– Não temos dúvidas de que as vacinas são grandes armas que a gente tem contra as doenças imunopreveníveis (que podem ser prevenidas por imunização). Isso de ele dizer que é contraindicado para pessoas fora do grupo de risco é uma posição dele. Na literatura, a gente orienta a vacinação para todas as faixas etárias. Qualquer pessoa tem o direito de escolher se quer ou não ser vacinada.
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Do lado oposto às campanhas de vacinação, que buscam uma cobertura cada vez maior para uma série de doenças e já conseguiram eliminar algumas enfermidades importantes como poliomielite e rubéola do país, grupos antivacina pipocam pelo mundo. Com mais atuação na Europa – e ainda um pouco tímidos no Brasil –, os movimentos ganharam força depois que um artigo foi publicado em 1998 na conceituada revista The Lancet. De autoria do médico britânico Andrew Wakefield, o texto relacionou a vacina tríplice viral – que protege contra sarampo, caxumba e rubéola – com os casos de autismo. Era o que faltava para que esse movimento tivesse argumentos para defender a não imunização.
Entretanto, em 2010, foi descoberto que Wakefield havia forjado os dados da pesquisa, o que resultou na sua perda de registro para atuar e em um processo criminal.
– Vários estudiosos buscaram encontrar essa relação causal entre a vacina e o autismo e nenhum deles conseguia, até que culminou na descoberta de que era um trabalho fraudado. Graças a esse indivíduo, a gente teve a redução na cobertura vacinal por anos. Hoje, ainda há resquícios disso – diz a presidente da Sociedade Brasileira de Imunizações (SBIm), Isabella Ballalai, reforçando que essa cultura provoca um problema de saúde pública mundial.
Ainda sem confiar plenamente na revelação, o movimento europeu foi atrás de uma pesquisa particular, que também levou por terra a teoria de que a vacina estaria relacionada ao autismo.
Diferentemente do Brasil, onde a vacinação é um direito assegurado pelo Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), e não uma obrigação, nos Estados Unidos, há uma rigidez maior em relação a esse tipo de imunização. Por lá, famílias eram liberadas de imunizar as crianças por motivos religiosos.
No entanto, observou-se que muitas pessoas usavam isso como justificativa para fugir das vacinas. O resultado foi um surto de sarampo ocorrido no fim de 2014 na Califórnia. Depois da disseminação da doença, todas as crianças passaram a ser obrigadas a receber as doses estipuladas, sob pena de não poderem frequentar escolas, caso a carteira não estivesse em dia.
Casos de morte eram do grupo de risco
Embora não faça parte do calendário oficial de vacinação brasileiro, todos os anos é feita uma larga campanha de imunização para os chamados grupos de risco contra a gripe A. Idosos, crianças de seis meses a cinco anos, gestantes, pessoas com doenças crônicas, obesidade, diabetes, asma, hipertensão e HIV, pacientes com câncer e transplantados, profissionais da área de saúde, indígenas, detentos e funcionários do sistema carcerário têm gratuidade na vacina, e a orientação é de que eles a tomem. Aqueles indivíduos que não se enquadram nesse grupo podem optar pela vacinação particular.
– A influenza é uma doença potencialmente grave para os grupos de risco. Na população geral, ela não costuma matar e hospitalizar. Deve-se procurar a prevenção, sim, mas não vejo motivo para desespero – avalia a presidente da Sociedade Brasileira de Imunizações (SBIm), Isabella Ballalai.
Só neste ano, já foram confirmadas pela Secretaria Estadual da Saúde três mortes por gripe A. Os pacientes pertenciam ao grupo de risco: uma criança de sete anos, que estava internada no Hospital Materno Infantil Presidente Vargas, e um homem de 35 anos, que sofria de uma doença que afeta a imunidade, que veio a óbito no Grupo Hospitalar Conceição. A terceira morte foi confirmada ontem, de um morador de Flores da Cunha, 64 anos, cardiopata e diabético, que estava internado em um hopital privado. Outro caso em investigação é de um motorista do Paraná que foi internado no domingo no Hospital de Vacaria e morreu na terça-feira. A Secretaria Estadual da Saúde diz que ainda não há comprovação laboratorial de que se trata de H1N1.
Nesta quinta-feira deve ser divulgado o boletim semanal do Estado. A vacinação no RS pela rede pública começa no dia 25.
Na tarde desta quarta-feira, ZH entrou em contato com 12 clínicas particulares de vacinação de Porto Alegre a fim de verificar quais ainda disponibilizavam doses para a gripe A. Oito estabelecimentos foram contatados, e destes, apenas a Clínica Previne (Rua Coronel Bordini, 380) afirmou ainda ter vacina disponível – tetravalente a partir dos três anos, a custo de R$ 120.