A fumaça dos incêndios florestais registrados na Amazônia, no Pantanal e em países vizinhos, como Paraguai, Argentina e Bolívia, já paira sobre o Rio Grande do Sul e tem deixado o céu acinzentado ao longo dos últimos dias. A exposição ao ar contaminado pode trazer prejuízos à saúde e demanda cuidados para evitar agravos respiratórios, conforme especialistas.
A Secretaria Estadual da Saúde (SES) monitora doenças respiratórias por meio do painel de Síndrome Respiratória Aguda Grave (Srag), com notificações de covid-19, influenza e vírus sincicial respiratório, mas não há detecção de índices de adoecimento especificamente pela qualidade do ar.
No Hospital de Clínicas, ainda não houve atendimentos por essa razão. Na emergência, as causas de atendimento e internação são variadas, e também não houve registro de aumento de problemas respiratórios em geral até o momento.
No Hospital São Lucas da PUCRS, não foi observado aumento em relação à pneumonia e outras doenças respiratórias – o índice segue a tendência normal do inverno. O Hospital Moinhos de Vento também não registrou aumento de casos respiratórios por inalação de fumaça no serviço de emergência. Em relação a doenças respiratórias em geral, na emergência pediátrica, foram 1.015 atendimentos em julho de 2023, em comparação a 1.335 em julho de 2024. Já o número de internações variou de 141 para 137. Na emergência adulto, houve variação de 974 atendimentos em julho de 2023 para 1.139 em julho de 2024. O número de internações aumentou de 125 para 170.
Chefe do Serviço de Pneumologia da Santa Casa, Adalberto Rubin afirma que o cenário atual é típico do inverno: emergências superlotadas, em instituições públicas e privadas. A grande maioria dos atendimentos na Santa Casa, neste momento, é por doenças respiratórias, principalmente pneumonia, bronquite, asma e complicações de enfisema.
Contudo, não há como identificar a causa, nem associar diretamente à fumaça das queimadas. Por outro lado, sabe-se, por dados nacionais e internacionais, que o índice de doenças respiratórias aumenta nesses casos.
— Toda vez que surgem queimadas dessa magnitude, aumentam as visitas à emergência e internações respiratórias. Certamente aqui vamos ter algum impacto, em menor dimensão. Baseado em dados de São Paulo e Estados do Centro-Oeste, isso está bem documentado, e deve estar acontecendo aqui no momento, mas não deve estar documentado — aponta.
Impactos da fumaça na saúde
Estudos realizados nos Estados Unidos, que costumam enfrentar incêndios florestais, mostram o impacto da exposição ao material particulado fino, que é menor e mais prejudicial, pontua Igor Benedetto, pneumologista do Hospital Moinhos de Vento. O material é inalado diretamente para o pulmão, gerando um dano inflamatório.
O material é responsável por sintomas respiratórios e agravamento em doenças respiratórias crônicas, principalmente entre pacientes com doença pulmonar obstrutiva crônica (DPOC), asma, bronquite, entre outros. Nelas, a inalação aumenta a inflamação e, consequentemente, a tosse, o chiado no peito e a falta de ar. Crianças com menos de cinco anos e idosos também são populações de risco.
Pessoas saudáveis também podem sofrer impacto, que dependerá da quantidade de exposição – na região mais próxima aos incêndios, certamente será maior, afirma Benedetto. Em grande quantidade, também pode gerar sintomas respiratórios como tosse, chiado no peito e falta de ar, semelhantes a uma crise de asma. Se a quantidade não for significativa, pode ser imperceptível, sem sintomas, principalmente em regiões com menos exposição, como o RS.
— O material particulado dessas queimadas irrita as vias respiratórias e reduz os mecanismos de defesa pulmonar. O monóxido de carbono interfere na captação do oxigênio. Então essas duas situações são as que mais afligem o sistema respiratório de pessoas expostas a fumaças de incêndios — acrescenta Rubin.
Cuidados especiais e uso de máscara
O pneumologista da Santa Casa recomenda que pessoas com doenças respiratórias redobrem os cuidados e mantenham o tratamento de manutenção e todas as vacinas em dia. O médico do Moinhos de Vento alerta para a necessidade de seguir as recomendações de órgãos oficiais. Não há consenso entre especialistas sobre o uso de máscara no Rio Grande do Sul, já que o Estado não é diretamente afetado pelas queimadas.
Rubin ainda não recomenda o uso de máscara para a população gaúcha em geral, apenas para pessoas idosas com doenças respiratórias. O item deve ser utilizado somente fora da residência.
O uso de máscara específica para filtrar partículas finas (N95, e não a cirúrgica) é mais importante para grupos de risco em casos em que há necessidade de exposição, segundo Benedetto. Contudo, isso dependerá de monitoramento e do nível de exposição – se a pessoa está em uma região exposta à fumaça visível e há algum alerta de órgãos oficiais.
No caso do Rio Grande do Sul, contudo, o risco é menor, avalia o médico do Hospital Moinhos de Vento, e o uso, mesmo por grupos de risco, ainda não é necessário. A medida será importante se houver fumaça circulando na região e algum órgão emitir uma recomendação, que deverá ser seguida.
Por ora, a recomendação da Secretaria Municipal de Saúde (SMS) de Porto Alegre é de que “o uso de máscaras pode reduzir a exposição às partículas maiores presentes no ar em áreas onde há concentração de neblina de fumaça”. A SES, por sua vez, informou que não há um protocolo estadual sobre o uso, mas reforça a indicação de "máscaras do tipo cirúrgica para reduzir exposição às particulas grossas".
Orientações de órgãos oficiais
O Ministério da Saúde (MS) e a SMS de Porto Alegre recomendam as seguintes orientações para a população:
- Aumentar a ingestão de água e líquidos para manter as membranas respiratórias úmidas
- Evitar atividades em ambiente aberto enquanto durar o período crítico de contaminação do ar pela fumaça. Reduzir o tempo de exposição, durante o dia ou à noite
- O MS recomenda que se permaneça dentro de casa, em local ventilado, com ar condicionado ou purificadores de ar
- Segundo a SMS, o uso de máscaras pode reduzir a exposição às partículas maiores presentes no ar em áreas onde há concentração de neblina de fumaça. Conforme o MS, o uso de máscaras de modelos respiradores tipo N95, PFF2 ou P100 é adequado para reduzir a inalação de partículas finas
- Deixar portas e janelas fechadas, para diminuir a entrada da poluição
- Se houver sintomas respiratórios, buscar atendimento médico
- Crianças menores de cinco anos, idosos maiores de 60 anos, gestantes, pessoas com doenças crônicas como asma, diabetes e hipertensão também podem ter mais complicações e devem redobrar a atenção para as recomendações descritas acima
Pessoas com problemas cardíacos, respiratórios, imunológicos, entre outros, devem:
- Buscar atendimento médico para atualizar seu plano de tratamento
- Manter medicamentos e itens prescritos pelo profissional médico disponíveis para crises agudas
- Avaliar a necessidade e segurança de sair temporariamente da área impactada pela sazonalidade das queimadas, segundo o MS
- Buscar imediatamente atendimento médico se apresentar sinais ou sintomas de piora das condições de saúde após exposição à fumaça