A chuva e as enchentes em diversas cidades gaúchas criaram um cenário atípico no Rio Grande do Sul. Com isso, pessoas portadoras de doenças que precisam de tratamento contínuo, como câncer, por exemplo, enfrentam dificuldades para manter a rotina em dia. Para os especialistas, é essencial que esses pacientes conversem com seus médicos de confiança para receber orientações específicas.
Segundo levantamento da campanha Força Onco RS, muitos pacientes oncológicos relataram perda de medicamentos ou receitas, dificuldade para chegar aos hospitais e necessidade de remarcar consultas ou sessões de tratamento. Na maioria dos casos, segundo os oncologistas, pausar esses recursos terapêuticos por conta das atuais circunstâncias não será prejudicial.
— É muito cedo para ter uma noção de quanto tempo essa situação irá durar. Atrasar o tratamento em uma semana ou 10 dias, por exemplo, é completamente razoável e, na maioria dos casos, não terá graves consequências. Mas é necessário que esse paciente entre em contato com a equipe de saúde para que essa decisão seja mais individualizada — afirma Carlos Barrios, médico oncologista da Oncoclínicas RS.
Em alguns casos, porém, falta de medicamento ou de sessões de tratamento pode significar o agravamento dos sintomas. De acordo com Sérgio Roithmann, chefe do Serviço de Oncologia do Hospital Moinhos de Vento, pacientes com leucemia ou com sintomas mais preocupantes, como dor, sangramento e alterações neurológicas devem procurar alternativas.
— Se não conseguem chegar até Porto Alegre, por exemplo, esses pacientes precisam procurar uma assistência mais próxima para serem encaminhados. Além disso, é importante ressaltar que existe tecnologia para nos ajudar nesses momentos. Podemos fazer teleconsultas ou prescrever medicamentos online — explica.
Apesar de o Gabinete de Crise da Secretaria da Saúde do RS ter emitido, na sexta-feira (10), um comunicado que permite que hospitais e demais estabelecimentos de saúde gaúchos possam suspender consultas, exames e cirurgias eletivas até 30 de maio, os especialistas não acreditam que os pacientes oncológicos vão ficar tanto tempo sem tratamento.
— Pacientes com sintomas como falta de ar, que precisam de internação hospitalar ou que estejam com dor certamente precisam ser vistos com rapidez. Os médicos que estão atendendo em abrigos vão identificar imediatamente e encaminhar essas pessoas com prioridade — garante Barrios.
Já Roithmann defende que a questão dos medicamentos também pode ser resolvida com agilidade.
Insegurança sobre o tratamento
Desde 2018, o aposentado Getúlio Valls, 67 anos, faz quimioterapia mensalmente para tratar uma vasculite. A doença autoimune é considerada grave, uma vez que pode provocar inflamação nas paredes dos vasos sanguíneos. O serviço onde Valls aplica essa medicação continua funcionando normalmente, mas o problema é que o procedimento, que dura cinco horas, é realizado em Porto Alegre e o aposentado vive em Capão da Canoa.
— Estou bastante preocupado porque, se eu não receber o medicamento, posso entrar em crise e ter que baixar hospital. Tenho aplicação na quarta-feira (próximo dia 15), mas não sei quais estradas ou ruas estarão abertas. Eu preciso ir, nem que seja de barco — relata.
O medo de ficar sem medicamentos ou sem consultas não é exclusivo de pacientes oncológicos. Segundo Roithmann, essa insegurança pode ser vivida por pessoas com outras condições que exigem tratamento contínuo, como Valls. Pacientes com doenças graves já são vulneráveis e, em contextos extremos, podem ficar ainda mais.
— Nesse momento, temos que tentar nos colocar no lugar dessas pessoas que estão bem equilibradas nos seus tratamentos e agora precisam passar por isso. Por isso, enfatizo que qualquer pessoa fazendo um tratamento contínuo precisa entrar em contato com os serviços médicos. Alguns tratamentos podem ser reorganizados. Mas, acima de tudo, os médicos podem tranquilizar os seus pacientes — pontua o chefe do Serviço de Oncologia.