O total de mortes anuais por Acidente Vascular Cerebral (AVC) no mundo poderá aumentar 50% e chegar a quase 10 milhões até 2050 se ações de monitoramento e prevenção não forem aprimoradas. O alerta é parte de um estudo feito pela Organização Mundial do AVC e publicado nesta segunda-feira (9) no periódico científico Lancet Neurology.
A estimativa prevê que o número de vítimas da condição poderá passar dos 6,6 milhões registrados em 2020 para 9,7 milhões em 2050, com um aumento superior em países de renda baixa e média, grupo do qual o Brasil faz parte. Os dados de 2020 indicam que 86% dos óbitos daquele ano ocorreram nos países mais pobres. Em três décadas, esse porcentual deverá chegar a 91%, dizem os pesquisadores, e as mortes ficarão ainda mais concentradas nessas nações.
De acordo com a projeção, o cenário também levaria a um aumento de mais de 100% nos custos diretos e indiretos do AVC. Estima-se que os gastos com tratamento e reabilitação, somados às perdas de renda causadas pelas pessoas mortas e com sequelas, passe de U$ 891 bilhões (R$ 4,5 trilhões) para U$ 2,3 trilhões (R$ 11,8 trilhões) entre 2020 e 2050.
Os pesquisadores ressaltam que o AVC, que já é a segunda causa de morte no mundo, vem aumentando "de forma alarmante" entre pessoas jovens e de meia-idade (abaixo dos 55 anos). Os cientistas também ressaltam que o problema é ainda a terceira causa de incapacidade e uma das principais causas de demência.
De acordo com o estudo, entre as principais explicações para o aumento de mortes por AVC, em especial nos países de renda média e baixa, estão o alto número de casos de hipertensão arterial não diagnosticada ou não controlada, dificuldade de acesso a serviços de saúde de qualidade, investimentos insuficientes em prevenção dos fatores de risco, poluição do ar e estilo de vida pouco saudável.
Além disso, a alta prevalência de doenças infecciosas agudas que ainda atingem países mais pobres gera uma sobrecarga no sistema de saúde que dificulta a assistência adequada a pacientes com doenças crônicas que aumentam o risco de um AVC porque o sistema nem sempre consegue dar conta de atender os pacientes com os dois tipos de enfermidades.
Neurologista do Hospital Alemão Oswaldo Cruz, Leandro Gama lembra ainda que, em todo o mundo e também no Brasil, o acelerado envelhecimento populacional também aumenta a chance de ocorrência do AVC. "Quanto mais idosa a população, maior o risco. Como a expectativa de vida está aumentando, a gente vê o aumento do número de AVCs", diz o especialista, que ressalta que a idade avançada somada ao aumento de fatores de risco agrava o cenário.
Principais fatores de risco para o AVC
Especialistas explicam que cerca de 80% dos acidentes vasculares cerebrais são do tipo isquêmico, caracterizado pela obstrução da circulação sanguínea em artérias do cérebro. Os outros 20% são do tipo hemorrágico, quando um vaso sanguíneo se rompe.
Em especial para o AVC isquêmico, há fatores de risco claros que, se controlados, diminuem bastante o risco do problema:
- Pressão alta
- Diabetes
- Colesterol alto
- Obesidade
- Dieta não saudável
- Sedentarismo
- Tabagismo
— A principal formas de reduzir o risco é o controle rigoroso dos fatores, com check up regular para controle da pressão arterial, diabetes; evitar o tabagismo e o sedentarismo, e aí entra a questão da atividade física, que é uma das principais formas de evitar o AVC, tanto a aeróbica quanto a musculação — diz Gama.
No estudo, os especialistas destacam ainda a necessidade de políticas públicas em quatro pilares: monitoramento, prevenção, cuidados de urgência e emergência e reabilitação para os pacientes com sequelas.
No campo da prevenção, além das recomendações para autocuidado e conscientização dos indivíduos sobre fatores de risco, os pesquisadores ressaltam a importância de medidas governamentais para frear o aumento dos fatores de risco. Entre elas, está maior taxação de produtos alimentícios não saudáveis, como sal, álcool, bebidas açucaradas e gorduras.
"Um dos problemas mais comuns na implementação das recomendações de prevenção e cuidados do AVC é a falta de financiamento. ...Essa tributação não só reduziria o consumo destes produtos – e, portanto, levaria à redução do AVC e de outras doenças não transmissíveis importantes – mas também geraria uma grande receita suficiente para financiar programas e serviços de prevenção do AVC e de outras doenças graves", afirmou, em nota à imprensa, a Valery L. Feigin, professora da Universidade de Tecnologia de Auckland, Nova Zelândia, e copresidente da comissão autora do estudo.
No Brasil, segundo dados do Ministério da Saúde disponíveis no portal Datasus, o número de mortes por AVC chegou a 106,9 mil no ano passado, aumento de 6% em relação aos 100,2 mil óbitos registrados dez anos antes, em 2012.
Sinais e sintomas do AVC
De acordo com a Sociedade Brasileira de AVC, os principais sinais e sintomas de um acidente vascular cerebral, que exigem o socorro imediato, são:
- Fraqueza ou formigamento na face, braço ou perna, especialmente em um lado do corpo
- "Boca torta" ao falar
- Confusão mental, alteração da fala ou "fala enrolada"
- Alteração da visão, com embaçamento ou visão dupla, em um ou ambos os olhos
- Alteração súbita do equilíbrio ou da coordenação / tontura ou desequilíbrio para andar
- Dor de cabeça muito forte, súbita, sem histórico de dor anterior
A recomendação médica, ao identificar os sintomas acima, é a busca imediata por um hospital. A intervenção rápida é fundamental para salvar o paciente e evitar sequelas.
No caso do AVC isquêmico, o mais comum, é feito o tratamento com o uso de medicamentos anticoagulantes ou realização de um cateterismo, com o objetivo de dissolver o coágulo formado nos vasos cerebrais e normalizar a circulação sanguínea. As chances de sucesso, no entanto, são maiores quando a intervenção é feita em até quatro horas após o início do problema.