As marcas da pandemia na fila do Sistema Único de Saúde (SUS) em Porto Alegre são profundas, principalmente, para consultas especializadas. Dados mais recentes da Secretaria Municipal de Saúde (SMS) mostram que até novembro de 2021, 92.396 solicitações aguardavam atendimento na Capital. O número é o maior desde janeiro de 2018, há quatro anos, quando havia 92.706 solicitações acumuladas.
Olhando somente para o período da pandemia, a fila cresceu 117,40%. Quando intensificou-se o isolamento social em março de 2020, eram 42.500 requisições aguardando chamado. Atualmente, o conjunto é mais que o dobro deste tamanho.
A fila do SUS na Capital atualmente se divide em 175 especialidades. Algumas, claro, são para o mesmo setor, mas com pequenas variações, como nutrição adulta e pediátrica. A oncologia, por exemplo, tem 21 filas diferentes.
Na comparação mensal, em abril de 2020, a fila chegou a reduzir, ainda intocada pelos efeitos do isolamento social. Mas, a partir de maio daquele ano, foram nove meses seguidos crescendo, até atingir as 64,7 mil solicitações acumuladas em janeiro de 2021. Depois de uma leve queda em fevereiro e março, a fila voltou a crescer no mesmo mês de abril, mas agora em 2021. Desde então, foram oito meses seguidos de alta. Nas comparações mensais, o maior salto do ano passado foi entre junho e julho, quando o número de requisições acumuladas cresceu 8,36% – de 69.535 para 75.350.
Durante todo o período de pandemia, o maior salto mensal na fila do SUS da Capital ocorreu entre junho e julho de 2020, quando houve acréscimo de 10,19%, indo de 43,8 mil solicitações em junho, para 48,3 mil em julho. O salto na fila entre o segundo e o terceiro trimestre de 2020 demonstram como a redução nos atendimentos durante um dos primeiros picos da pandemia começou a acumular demandas.
Entretanto, os dados de 2021 também preocupam. Os oito meses seguidos de alta no ano deixaram a fila 42,52% maior – eram 64.828 pedidos de consulta especializada em abril, ante os 92,3 mil de novembro. Só no segundo semestre, entre julho e novembro, o crescimento foi de 22,62%. O número chama atenção porque nesse período a pandemia já estava bem menos grave do que na mesma época do ano passado ou até do que no primeiro semestre de 2021.
Pedidos para oftalmologia se destacam
Em números absolutos, as duas maiores filas são para atendimento em oftalmologia. O primeiro lugar fica com a oftalmologia geral adulto, com 13.269 pedidos de atendimento acumulados. O tempo médio de espera para casos menos prioritários supera os 590 dias – cerca de um ano e sete meses. Depois, aparece a oftalmologia triagem visual, com 7.307 solicitações. Neste caso, os atendimentos menos prioritários podem demorar mais de 170 dias – pouco menos de seis meses. Também aparecem entre as especialidades com grande tempo de espera por atendimento a saúde mental transexualidade, tratamento da dor e a polissonografia.
A fila do SUS na Capital passou por um extenso processo de revisão e gerenciamento ao longo de 2018 e 2019, o que culminou em patamares de 40 mil solicitações acumuladas. Esse era o número que vinha se mantendo até o início de 2020, quando a pandemia teve importante presença no revés que se formou. Agora, resta saber de que forma o município pretende tratar do assunto. Voltar aos patamares do início de 2018 ou buscar um gerenciamento que faça esse número reduzir ao que era no início da pandemia?
Afastada do trabalho de higienização no Hospital da Restinga por razões de saúde, Núbia Ventura Dutra, 59 anos, entrou na fila da oftalmologia geral há pouco mais de um mês. E por isso, teme pelo tempo que pode demorar até ser chamada para atendimento. Isso porque há cerca de cinco anos, ela precisou fazer um cirurgia de catarata, na mesma especialidade. Na época, a espera foi superior a um ano. Aliás, esse ainda é o tempo de espera para casos menos prioritários na fila oftalmologia catarata.
– Fui encaminhada pelo posto de saúde Macedônia, aqui da minha região. Ainda não tem nenhuma previsão, não sei nem pra qual hospital vou ser encaminhada – afirma Núbia.
Pacientes estão retornando ao sistema, diz SMS
Em nota, a Secretaria Municipal de Saúde (SMS) creditou o crescimento de 10% entre setembro e novembro do ano passado ao arrefecimento da pandemia, quando “as pessoas voltaram a procurar assistência aos seus problemas de saúde das mais diversas tipologias”. A SMS diz que “mesmo com a retomada da oferta pelos prestadores, a demanda por consultas especializadas supera o quantitativo pré-pandemia”.
O aumento de 117% na fila durante a pandemia precisa ser combatido com a oferta de consultas e exames que consigam atender que está represado na fila e também as novas solicitações que chegam. Por isso, a SMS explica que “está trabalhando em ações conjuntas com o Estado para ampliar a oferta de consultas, exames e procedimentos”.
Um dos pontos de atenção é a área da oftalmologia, que representa 31,5% de todas as solicitações, segundo a SMS. “A predominância absoluta nesta especialidade é de transtorno de refração, são consultas simples para avaliar a necessidade de óculos. Estamos trabalhando na ampliação significativa da oferta de consultas em oftalmologia”, afirma a nota da pasta.
Para demais pontos, como a demora em algumas filas com número baixo de solicitações, a prefeitura diz que há desequilíbrio entre a oferta e a demanda e que estão sendo feitas análises para verificar a possibilidade de aumento na oferta junto aos prestadores.