Os próximos dias são considerados fundamentais, por integrantes do Comitê de Dados que monitora a pandemia no Rio Grande do Sul, para indicar com mais clareza qual o rumo do coronavírus no Estado.
A emissão de avisos de risco a 17 das 21 regiões gaúchas por conta da covid-19 foi uma surpresa porque a elevação de 102% no ingresso de novos doentes nos hospitais em um intervalo de 10 dias não se refletiu na mesma medida no total de pessoas hospitalizadas até o momento – número que também depende da quantidade de altas e de óbitos registrada no período. Esta e a próxima semana poderão confirmar se o Estado está diante de uma eventual nova onda de infecções impulsionada pela variante Delta ou de uma variação pontual.
O Piratini conta com duas fontes de dados informatizados para analisar o impacto do vírus sobre os hospitais. Um deles, federal, é o Sistema de Informação da Vigilância Epidemiológica da Gripe (Sivep-Gripe), que também notifica casos de covid-19. A ferramenta contabiliza quantos novos pacientes foram admitidos em leitos clínicos e de tratamento intensivo (UTI) em um determinado período. Foi por esse recurso, não disponível para consulta pública em tempo real, que o Piratini observou uma elevação no acumulado semanal de doentes de um patamar próximo a 800, até 24 de julho, para cerca de 1,6 mil até terça-feira (3), e decidiu lançar um sinal amarelo.
A outra ferramenta abastece os boletins oficiais de hospitalizações e de monitoramento do Sistema 3As e mede o chamado “estoque” de doentes internados. Ou seja, o número de pacientes sob tratamento a cada dia, somadas as novas internações e subtraídas as altas hospitalares e os óbitos. O que se enxerga é quem está sob tratamento naquele momento.
Por esse instrumento, cujos dados são divulgados diariamente, o Estado demonstra uma interrupção na tendência de queda da demanda por leitos clínicos – mas apenas nos últimos quatro dias, e sem sinalização de crescimento tão significativo até esta quinta-feira (veja gráfico logo abaixo). Oscilou de 656 hospitalizados com coronavírus no domingo (1º) para 660 até as 16h de quinta. Uma das possíveis explicações para isso, ainda sem confirmação oficial, é de que o número de altas e de óbitos tenha compensado a elevação no ingresso de novos doentes no mesmo prazo.
Nas UTIs, que demoram mais tempo para sofrer os efeitos de eventuais reversões de tendência por receberem casos mais graves, se mantém uma leve curva descendente de ocupação.
— O que vemos pelo Sivep-Gripe é um grande aumento nas novas hospitalizações. Mas, pelo sistema da Secretaria de Saúde, o que percebemos é uma desaceleração da queda. Analisando em conjunto, decidimos pela emissão dos avisos. Mas os próximos dias serão fundamentais para demonstrar com mais clareza se teremos um agravamento da pandemia que vai se refletir também no total de pacientes em tratamento, se foi apenas um repique ou um alarme falso — observa o coordenador do Grupo de Trabalho Saúde do Comitê de Dados, Pedro Zuanazzi.
A pesquisa sobre sintomas de covid-19 realizada pelo Facebook em parceria com a Universidade de Maryland, outra fonte de análise do comitê, por demonstrar precocemente reversões de tendência, também não apontou variação que explicasse a alta de novas hospitalizações, segundo Zuanazzi. Por isso, será tão importante seguir monitorando os variados indicadores.
— A vantagem do Sivep é que fornece informações muito mais detalhadas. A desvantagem é que, por ser uma ficha mais completa, os hospitais nem sempre preenchem em tempo real. Como os dados são contabilizados pela data de registro (no sistema), se houver algum atraso (na notificação), isso pode gerar uma falsa impressão de aumento depois. Mas não soubemos de nenhum problema nesse sentido nas últimas semanas — avalia o coordenador do grupo de trabalho.
Novos casos
A taxa oficial de novos casos também não indica viés de alta. Desde o começo do mês, variou de 155 novos registros acumulados na semana por 100 mil habitantes para 138 por cem mil na quarta-feira (4). A professora de Epidemiologia da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) Suzi Camey pondera que o índice de novos casos deve ser observado com cautela porque o Estado alterou o critério de notificação há duas semanas, quando foram incluídas 63 mil ocorrências represadas de uma vez só.
— Esse foi um dos motivos pelos quais passamos a prestar mais atenção no número de novas internações pelo Sivep, uma vez que a média móvel de casos ficou alterada pela inclusão de registros mais antigos. Os 17 avisos foram emitidos também como precaução pelo que estamos vendo a variante Delta provocar em outros países, como os Estados Unidos, onde as pessoas começaram a relaxar cuidados como uso de máscara e distanciamento — afirma Suzi.
Nesse momento, o cálculo da média móvel de sete dias já deixou de contabilizar as 63 mil inclusões tardias. Se o cenário indicado pelo Sivep-Gripe se confirmar, nos próximos dias o Estado deverá perceber com mais nitidez um aumento no universo de pacientes hospitalizados em leitos clínicos e em UTIs, o que, em um momento posterior, também pode voltar a elevar o patamar de óbitos.
Na quarta-feira (4), um novo boletim da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) indicou tendência de reversão na queda de casos de síndromes respiratórias graves em todo o país (que incluem covid-19), com possibilidade de crescimento em Estados como o Rio Grande do Sul.