Depois de alterar ao menos cinco vezes o cronograma de entrega de vacinas para covid-19, o Ministério da Saúde decidiu que não irá mais divulgar a previsão de doses que espera receber a cada mês. A mudança foi confirmada ao Estadão pela pasta, que argumenta que esses dados devem ser coletados, agora, diretamente com os fabricantes.
O governo está sob pressão para ampliar o ritmo de vacinação. Por falta de doses, algumas cidades interromperam a campanha de imunização. A prefeitura de Belo Horizonte informou na quinta-feira (8) que aguarda novos lotes para voltar a aplicar vacinas. No começo da semana, o governo do Distrito Federal fez o mesmo.
Os primeiros cronogramas de entrega de vacinas foram divulgados em fevereiro, quando o ex-ministro da Saúde Eduardo Pazuello tentava esfriar críticas sobre a demora do governo federal em apresentar essas projeções. As versões iniciais desse documento já se mostravam inviáveis.
Ao prever o número de doses fornecidas mês a mês a Estados e municípios, a Saúde ignorava atrasos na entrega de insumos farmacêuticos ativos (IFA) para a produção de vacinas na Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) e no Instituto Butantan. Também somava dados da Sputnik V e Covaxin, imunizantes que ainda sem aval da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa).
Pela previsão de fevereiro, o Brasil encerraria o mês de março com 68 milhões de imunizantes distribuídos. Segundo dados de quinta-feira (8), foram entregues 45,2 milhões de doses.
O governo chegou a desdenhar da demora na compra das vacinas.
Para que essa ansiedade? — disse Pazuello em dezembro de 2020.
No mês seguinte, o mesmo ministro declarou que o governo iria receber uma "avalanche" de propostas de vacinas e que o Brasil iria ultrapassar a campanha dos Estados Unidos já em fevereiro, o que até agora não ocorreu. Apenas em dezembro um crédito de R$ 20 bilhões foi aberto para contratação das doses, quando o governo já havia rejeitado ofertas para compra da Pfizer e do Instituto Butantan.
Já o presidente Jair Bolsonaro passou meses, em 2020, rejeitando propostas de compra da CoronaVac, imunizante que ele apelidou de "vachina", por causa da origem chinesa, e "vacina de João Doria", em referência ao governador paulista, seu inimigo político. Bolsonaro afirmou ainda que não compraria esta vacina mesmo após o registro do produto na Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). Ele atribuiu a decisão a não ter "segurança" sobre a vacina por causa da origem chinesa.
Em março, o Ministério da Saúde procurou justamente a Embaixada da China para pedir socorro. A pasta apontou risco de a campanha de imunização parar no país "por falta de doses, dada a escassez da oferta internacional", e pediu a compra de 30 milhões de vacinas da Sinopharm.
Pressionado pela queda de popularidade, o presidente modulou o discurso e passou a defender a vacina, além de negar que um dia rejeitou os imunizantes. Em 24 de março, compartilhou um cronograma de entregas, que não se cumpriu. A tabela mostra cerca de 560 milhões de doses contratadas, mas já previa importação da Covaxin, fabricadas na Índia, já em março. A Anvisa negou a entrada do imunizante no Brasil.
Os principais acordos do Brasil são com Butantan e Fiocruz, que entregam a CoronaVac e vacina de Oxford/AstraZeneca. A produção desses laboratórios depende principalmente da entrega do IFA ao país.
O Butantan afirma que concluirá a meta de entregar ao governo federal 46 milhões de vacinas até o fim deste mês, somando o volume já distribuído (38,2 milhões). Já a Fiocruz espera enviar 26,5 milhões de vacinas até o começo de maio, também considerando as 8,1 milhões de unidades já fabricadas.