O Rio Grande do Sul prevê receber mais 36 pacientes com covid-19 da Região Norte, entre esta segunda (1°) e a terça-feira (2), cercado de medidas de segurança destinadas a reduzir o perido de contágio por eventuais novas cepas do coronavírus.
Embora não seja possível garantir risco zero no manejo de pacientes, a Secretaria Estadual da Saúde (SES) e especialistas em infectologia avaliam ser mais provável que novas linhagens sejam importadas por pessoas assintomáticas do que por doentes sob precauções de biossegurança.
Foi prevista a chegada de 18 pacientes de Manaus (AM) na segunda (para Porto Alegre e Canoas), e outros 18 no dia seguinte, os quais serão conduzidos a Santa Maria. Uma das mais preocupantes linhagens recém-descobertas da covid surgiu justamente no Amazonas. Mas, para o diretor de Regulação da SES, Eduardo Elsade, a transferência dos doentes não deve ser vista como ameaça.
— A nova cepa (do vírus) vai chegar de qualquer jeito (ao Estado). É impossível evitar porque não temos divisas fechadas entre os Estados, e as pessoas seguem circulando de carro, caminhão, avião. Na verdade, o menor risco de transmissão é por meio desses pacientes, já que eles vêm com uma série de cuidados de biossegurança — sustenta Elsade.
A regra fundamental da estratégia destinada a reduzir a possibilidade de contágio é isolamento. Os doentes que chegam do Norte, sem a companhia de amigos ou familiares, são recebidos por equipes de saúde que vestem um macacão especial (que cobre todo o corpo) e transportados por ambulâncias individualmente aos hospitais — onde permanecem em alas clínicas separadas de todos os outros internados, inclusive daqueles com covid-19.
Hoje, hospitais da Capital já atendem a uma primeira leva de 18 pessoas transferidas desde Rondônia. Um dos médicos que cuida dos hospitalizados no Conceição é o infectologista André Luiz Machado da Silva.
— Não há um risco significativo porque eles vêm em um contexto de ambiente controlado — opina Silva.
O infectologista chama a atenção para outro fator: os pacientes deslocados costumam chegar na chamada “fase inflamatória” da doença. É quando o vírus acomete os pulmões de forma mais significativa, e surge a dificuldade respiratória.
— Essa fase, que costuma ocorrer em 15% a 20% de quem contrai o vírus, aparece de sete a 10 dias depois dos primeiros sintomas. Nessa etapa, a quantidade de vírus no trato respiratório já é menor, e isso torna essas pessoas menos infectantes — explica o médico.
É importante exercitar o princípio da solidariedade, mas resguardando aspectos técnicos
RONALDO HALLAL
Infectologista
O epidemiologista e professor da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) Paulo Petry lembra que, apesar de todos os esforços, é impossível garantir "risco zero":
— Se houvesse como eliminar o risco, não teríamos tantos profissionais da saúde contaminados. É uma preocupação que pacientes possam trazer novas linhagens do vírus. Mas, no momento, é uma questão humanitária.
Integrante do Comitê de Covid-19 da Sociedade Riograndense de Infectologia, Ronaldo Hallal observa que o ideal é que todos os Estados tivessem se preparado, ao longo de quase um ano de pandemia, para reduzir as taxas de transmissão e atender seus pacientes. Mas, dado o cenário atual, avalia que as transferências são justificáveis:
— O ideal é que não ocorresse grande circulação de pessoas infectadas, e que os Estados tivessem lançado mão de medidas de prevenção como isolamento, uso de máscaras, diagnósticos e acompanhamento. Mas, diante da situação de alguns Estados como Amazonas, Pará e Rondônia, é importante exercitar o princípio da solidariedade, resguardando aspectos técnicos para prevenir a contaminação.
Tire suas dúvidas sobre a transferência de pacientes para o RS
Quantos pacientes do Norte o Rio Grande do Sul está recebendo?
Originalmente, o governo gaúcho ofereceu 50 vagas para pessoas com coronavírus de Estados do Norte afetados pela sobrecarga do sistema de saúde. Vieram de início 18 pacientes de Rondônia. Nesta segunda estão previstos mais 18 de Manaus (AM) para Porto Alegre e Canoas, e, na terça, outros 18 para Santa Maria.
Quais os cuidados para evitar contaminações?
Os pacientes chegam por via aérea acompanhados por um médico e cinco enfermeiros. Ao desembarcar, são recebidos por profissionais de saúde locais que vestem um macacão especial isolante e proteção facial destinados a reduzir o risco de contaminação. Poucas pessoas participam dessa recepção, incluindo pessoal do Samu, um representante da Saúde do município para onde serão levados, e o diretor de Regulação da Secretaria Estadual da Saúde, Eduardo Elsade, que supervisiona a operação.
Como é feito o transporte para os hospitais?
Cada paciente é levado em uma ambulância. Os veículos recebem escolta ao longo do trajeto.
Quais as medidas de precaução tomadas nos hospitais?
Os pacientes são encaminhados diretamente para a ala onde ficarão internados, sem passar por quaisquer outros setores como Emergência. Eles ficam em um espaço isolado de todos os demais, inclusive dos outros pacientes com covid-19, para reduzir ainda mais o risco de contágio. As medidas de segurança adotadas pelos profissionais de saúde que os atendem são as mesmas aplicadas a outros setores de atendimento a pessoas com coronavírus, com uso de equipamento completo de proteção individual.
Quais os hospitais que recebem esses doentes?
Em Porto Alegre, são Conceição, Clínicas e Vila Nova. Os pacientes que chegam nesta segunda serão encaminhados para o Conceição e para o Hospital Universitário de Canoas. Na terça, um novo grupo será encaminhado para Santa Maria (hospitais Universitário e Regional).
Eles são atendidos por equipes de saúde exclusivas?
Conforme a SES, em parte, sim. Mas parte dos profissionais costuma atuar em mais de um setor de cada hospital. Nesse caso, usam todos os equipamentos de proteção necessários ao ingressar na ala dos pacientes transferidos, e trocam a roupa e os equipamentos de proteção ao sair.
Os pacientes que chegam de fora são testados para outras cepas do coronavírus?
Sim, por regra todo doente transferido da Região Norte para o Estado é examinado para se verificar se foi infectado por alguma variante do coronavírus. Segundo o setor de Regulação da SES, o sequenciamento do vírus é feito no Hospital de Clínicas de Porto Alegre.
Já foi identificada a nova variante de Manaus do coronavírus nos pacientes que o Estado está recebendo?
Até o momento, segundo a SES, não foi identificada a nova variante nos doentes atendidos. Exames seguem sendo feitos.
As pessoas transferidas são acompanhadas por familiares?
Não. Todo paciente vem obrigatoriamente sozinho, conforme regras estabelecidas pelo Ministério da Saúde. É também uma medida de precaução para evitar a proliferação da doença. Por isso, alguns doentes acabam recusando deixar seu Estado de origem.