Um aumento generalizado das internações em leitos clínicos por covid-19 no Rio Grande do Sul na última semana, combinado à chegada da nova variante mais transmissível do coronavírus e à proximidade do final das férias, deixa especialistas em alerta sobre os rumos da doença no Estado.
O temor é de que esses sinais preliminares de agravamento da pandemia, refletidos em um salto de 22,5% na quantidade de pacientes com covid-19 em enfermarias em apenas uma semana, piorem ainda mais. Um salto na ocupação de leitos clínicos pode resultar, em um segundo momento, em maior demanda por unidades de terapia intensiva (UTIs) e, mais adiante, em elevação dos óbitos.
O receio é de que esses números sejam inflados pela disseminação da nova cepa P.1 — descoberta em Manaus (AM) e observada pela primeira vez em solo gaúcho em Gramado, na sexta-feira (12)—, e por dois fenômenos sociais: aglomerações que vêm ocorrendo no Carnaval em pontos como o Litoral Norte e o iminente final das férias — o que tende a aumentar a mobilidade e, consequentemente, a circulação do vírus.
— A descoberta da P.1 na Serra se conjuga com o aumento de hospitalizações nessa região. Foi apenas um caso, mas tudo indica que deve haver outros, já que a amostragem para sequenciamento é pequena — observa o professor de infectologia da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) Alexandre Zavascki.
Conforme o mais recente Boletim de Hospitalizações da Secretaria Estadual da Saúde (SES), ao longo de uma semana (até o sábado, dia 13), as internações em alas clínicas por coronavírus cresceram 38,4% na Serra. Essa região ficou atrás somente da Centro-Oeste, onde o salto foi de 57%. Mas todas as sete macrorregiões gaúchas registraram crescimento dos atendimentos nesse setor, que funciona como uma “porta de entrada” dos hospitais (veja números detalhados mais abaixo).
— Vários componentes nos levam a esperar um agravamento da pandemia no Estado, infelizmente. A presença dessa nova variante, festas mais intensas agora do que na virada do ano e o retorno à vida normal, em breve, são preocupantes — observa Zavascki.
O infectologista aponta que, embora a sociedade brasileira de forma geral tenha dificuldade para aceitar lockdowns, seria importante adotar alguma forma de restrição de mobilidade para conter uma disparada de casos — além de reforçar os cuidados tradicionais como uso de máscaras, distanciamento e higiene das mãos.
— Temos de decidir se vamos apenas ficar olhando ou fazer alguma coisa — alerta.
Zavascki chama a atenção ainda para o fato de que os últimos dias já começaram a demonstrar também elevação nas internações em UTIs. Eram 781 pacientes no domingo anterior (7) em todo o Estado, contra 876 neste sábado (13), última data do boletim mais recente da SES, após seis dias de aumentos consecutivos.
Contaminação se intensificou no Brasil após descoberta da P.1
Os gaúchos têm motivo para se preocupar com uma eventual proliferação da recém-chegada cepa de Manaus do coronavírus. Análises feitas pelo doutor em matemática e professor da UFRGS Álvaro Krüger Ramos indicam que a taxa de contaminação pela covid-19 cresceu cerca de 50% no país após a disseminação da também chamada P.1 do Amazonas para outros Estados.
— Até dezembro, esse coeficiente ficava sempre entre 1,9 e 2,5 (um valor mais alto indica mais contaminação). Hoje, passou para um valor entre 3 e 3,6 — afirma Ramos, explicando que o número é fruto de uma modelagem matemática que leva em consideração a quantidade de novos casos da doença e outros indicadores.
O doutor em matemática explica que fatores comportamentais também podem ter interferido na piora do cenário, como aglomerações durante o Carnaval. Mas ele acredita que a maior transmissibilidade da nova variante — já comprovada em laboratório — é um dos ingredientes desse avanço recente da pandemia no Brasil.
A Secretaria Estadual da Saúde informou que pretende ampliar o número de análises em amostras de pacientes com coronavírus da Serra, onde a linhagem de Manaus foi registrada pela primeira vez no Rio Grande do Sul, para tentar mapear de forma mais detalhada a disseminação da nova variação do vírus no Estado e seus possíveis impactos.
Aumentam internações em leitos clínicos por covid-19
Pacientes em camas de enfermaria no RS (que depois podem elevar demanda por UTI)
- 31/1: 958
- 1/2: 961
- 2/2: 965
- 3/2: 919
- 4/2: 928
- 5/2: 933
- 6/2: 957
- 7/2: 957
- 8/2: 963
- 9/2: 998
- 10/2: 1.071
- 11/2: 1.137
- 12/2: 1.196
- 13/2: 1.172
Crescimento em uma semana: 22,5%
Média móvel de sete dias
- Entre 31/1 e 6/2: 946
- Entre 7/2 e 13/2: 1071
- Variação: 13%
Pacientes com coronavírus em UTIs
Demanda de doentes graves também registra aumento nos últimos dias
- 31/1: 804
- 1/2: 805
- 2/2: 815
- 3/2: 794
- 4/2: 822
- 5/2: 826
- 6/2: 813
- 7/2: 781
- 8/2: 783
- 9/2: 787
- 10/2: 802
- 11/2: 831
- 12/2: 849
- 13/2: 876
Crescimento em uma semana: 7,8%
Média móvel de sete dias
- Entre 31/1 e 6/2: 813
- Entre 7/2 e 13/2: 816
- Variação: 0,3%
Demanda por leito clínico cresce em todas as regiões do RS
Aumento da ocupação por doentes com diagnóstico de covid-19 ao longo de uma semana
- Centro-Oeste: 57,1%
- Serra: 38,4%
- Norte: 35%
- Vales: 23,3%
- Metropolitana: 14,9%
- Sul: 9,1%
- Missioneira: 7,5%
Fonte: Boletim de Hospitalizações da SES