A descoberta de pesquisadores europeus de que o uso de medicamentos antirretrovirais pode evitar a transmissão de HIV durante o sexo entre homens reforçou a crença de que a ciência marcha firme para indicar formas de conter a propagação do vírus.
O estudo, realizado por oito anos com mil casais de homens na Europa, mostrou que o parceiro que tinha HIV recebia tratamento para suprimir o vírus e, mesmo fazendo sexo sem preservativo, não foram registrados casos de transmissão ao parceiro que não tinha aids. Os pacientes foram selecionados em hospitais e clínicas de mais de 14 países europeus, conforme o estudo publicado na revista Lancet na quinta-feira (3).
— Já havia a convicção de que o uso de retrovirais era eficiente em impedir a transmissão do vírus entre casais heterossexuais, agora surgem elementos que sugerem que que este efeito ocorre também no sexo entre homens, em que o risco de transmissão é maior — explica Eduardo Sprinz, infectologista do Hospital de Clínicas de Porto Alegre.
A descoberta reforça a importância dos testes de HIV frequentes, o que poderia reduzir drasticamente a transmissão do vírus no futuro. Ela indica que, caso os dados sejam revisados e comprovados em análises posteriores, se todos os portadores do HIV forem tratados com medicamentos, não haverá mais infecções por via sexual.
— Esses dados devem servir de base para o avanço de políticas públicas na área da saúde para identificar pessoas infectadas e tratá-las — reforça Sprinz.
Caminho para melhorar a vida das pessoas que vivem com o vírus
A descoberta pode mudar radicalmente a forma como se relacionam casais em que apenas um dos parceiros tenha o vírus HIV. Conforme o infectologista Paulo Ernesto Gewehr Filho, do serviço de imunizações do Hospital Moinhos de Vento, até agora, as pesquisas indicavam que o uso de retrovirais pelo parceiro saudável era a forma de evitar contágio na relação sexual com o infectado (além do uso de preservativos), método chamado Profilaxia Pré-Exposição.
— O problema deste método é que não protege em 100% dos casos e ainda há os efeitos colaterais do medicamento. Caso as novas pesquisas sejam comprovadas, irão dispensar o uso de retrovirais pelo parceiro saudável e eliminar bastante o medo de contágio quando o preservativo romper, por exemplo — afirma.
Para Gewehr, os dados podem ser um caminho para reduzir o isolamento social dos portadores do vírus da aids, uma vez que muitas pessoas da família ou do trabalho ainda têm medo de serem contaminadas em situações do convívio diário, ainda que esteja comprovado elas não transmitem aids.
O assunto interessa muito Porto Alegre, que é a capital com a maior taxa de detecção de infecções pelo vírus em 2017, com 21,1 casos a cada mil nascidos vivos, três vezes mais do que a segunda colocada, Florianópolis, com 7,1 casos. Em 2017, quase 40 milhões de pessoas no mundo viviam com HIV, sendo que 21,7 milhões estavam em tratamento com antirretrovirais.