O Hospital Universitário de Santa Maria (HUSM) está acompanhando 12 mulheres que contraíram toxoplasmose durante a gravidez. Sete delas são de Santa Maria e as outras cinco de municípios vizinhos. Os casos, confirmados em exames, são referentes ao período entre janeiro e 15 de abril, e não estão incluídos entre os 14 informados na quinta-feira em entrevista coletiva pela prefeitura e Secretaria Estadual de Saúde.
Os números ainda podem aumentar. Nos últimos dias, profissionais que atuam no setor de gestações de alto risco notaram um aumento significativo na quantidade de grávidas que chegam ao hospital com os sintomas típicos da doença. Apenas na noite passada, foram três mulheres, com quadro de febre, dor muscular e dor articular. Elas foram submetidas a exames para confirmação.
A incidência em gestantes é o grande pesadelo do surto de toxoplasmose que atinge Santa Maria e que foi oficialmente reconhecido pelas autoridades na quinta-feira — a prefeitura municipal e a Secretaria Estadual de Saúde, no entanto, não haviam revelado a existência de gestantes infectadas. Quando a infecção acontece durante a gravidez, há risco de aborto, microcefalia e doenças neurológicas para o feto. Os casos do HUSM, segundo profissionais da instituição, reforçam a gravidade da situação.
— Todos os dias estão chegando pacientes. O número vem crescendo, está acima do normal. Esse quadro vem há mais ou menos um mês. Temos muitos casos agudos há pouco tempo. Há um aumento na demanda, com certeza. É bem provável que tenha relação com o surto que está ocorrendo na cidade — afirma Francisco Gallarreta, supervisor da medicina fetal do hospital.
Ainda não é possível saber se os fetos das 12 mulheres em acompanhamento podem sofrer sequelas. Gallarreta explica que, para constatar se o toxoplasma atingiu o bebê, é preciso realizar um procedimento invasivo, com retirada de líquido amniótico, o que só é feito após a 18ª semana de gestação:
— Agora que vamos começar a fazer. É bem incipiente. Ninguém nasceu ainda.
Quando a toxoplasmose atinge apenas a gestante, o tratamento é com um antibiótico que não chega ao feto e que tem resultados excelentes. Se o toxoplasma chegou ao feto, o antibiótico é outro — e os resultados podem não ser tão positivos. O risco é maior quando a infecção ocorre no começa da gravidez.
— Se fazemos o tratamento antes de o feto ter estigma, sequela, o tratamento é efetivo. Se o feto já tem infecção, cerebral, hepática ou muscular, alguma coisa que determine sequela, aí o tratamento pode não ser tão efetivo. O período entre o início da doença e o início do tratamento é fundamental — diz o médico.
Ao todo, 36 mulheres foram investigadas neste ano no HUSM. Das 12 confirmações, há, além dos sete casos de Santa Maria, mulheres de Jaguari, São Sepé, Quevedos, Dona Francisca e São Francisco de Assis. O hospital não informou exatamente quando os casos foram registrados e não forneceu dados comparativos com anos anteriores.
Por se tratar de uma região rural, a toxoplasmose é endêmica na zona – a literatura estima em de 40% a 80% a proporção da população que já teve contato com o protozoário. No caso de uma gestante, o melhor cenário possível é já ter sido infectada, porque uma reinfecção não ocorre. O grande problema é quando o primeiro contato com o toxoplasma ocorre justamente durante a gravidez — caso das 12 mulheres em acompanhamento.
As informações sobre o surto têm provocado uma corrida de gestantes aos serviços de saúde de Santa Maria – o HUSM entre eles. As grávidas estão alarmadas com o risco. Na manhã de ontem, Sabrina Trindade, 31 anos, 38 semanas de gestação, compareceu a uma consulta no hospital carregada de perguntas para fazer ao obstetra. Ela contou ter reforçado os cuidados nos últimos dias, mas continua a se sentir insegura com a falta de informações:
— Começamos a comprar água mineral e a ferver a água, mas a gente ainda não sabe detalhes da questão da comida. Nosso bairro teve muitos casos de crianças com febre, diarreia, estamos bem preocupados. Na realidade, estou bem desinformada, o que sei é o que vi na internet. A gente não sabe de onde isso surge, o pessoal não explicou muito.
Gallarreta afirma que a atual situação torna ainda mais importante que as gestantes que nunca tiveram toxoplasmose tomem medidas preventivas.
Novo boletim deve atualizar número de casos
Segundo a secretária municipal de Saúde de Santa Maria, Liliane Mello Duarte, os casos de gestantes do HUSM infectadas não foram contabilizados no boletim oficial da quinta-feira porque ainda não passaram pela confirmação no Laboratório Central do Estado (Lacen), que é usado como referência. Conforme a secretária, além dos casos do HUSM, houve outros 59 que deram positivo para toxoplasmose em laboratórios locais e foram notificados. A secretaria procurou esses pacientes, fez novas coletas e encaminhou o material ao Lacen. Na quinta-feira, foram divulgados os resultados dos primeiros 17 exames – com 14 confirmações. Todos eram jovens, com quadros de evolução positiva.
Apesar de os dados sobre as gestantes do HUSM não terem sido contabilizados, Liliane afirma que elas representam a prioridade no momento. A secretária informa que vai ser feita uma investigação para saber se os números do hospital estão dentro do padrão para uma região endêmica ou se extrapolaram a média. Também vai ser analisado o caso das cinco gestantes de municípios do entorno, para saber se trabalham ou costumam ir com frequência a Santa Maria.
– Temos de ver o perfil dessas gestantes. São os casos que mais preocupam, os que temos de cuidar em primeiro lugar – afirmou.
No final da tarde, a prefeitura deve divulgar um novo boletim, com números atualizados sobre o surto.
– Acredito que vai dar uma mudança importante – diz Liliane.