Depois de uma série de reviravoltas e de um recuo que parecia definitivo, o governo de Sebastião Melo conseguiu aprovar em primeiro turno na Câmara de Vereadores nesta quarta-feira (23), por 24 votos a 11, o projeto de emenda à Lei Orgânica da reforma da previdência. A proposta eleva a idade mínima de aposentadoria para os servidores municipais e cria regras de transição para quem está próximo de se aposentar.
A votação não estava prevista para o dia, mas entrou em pauta depois que o vereador Airto Ferronato (PSB) indicou que votaria a favor do texto. A posição de Ferronato, que tem ligação histórica com setores do funcionalismo, era considerada decisiva. Até então, ele se recusava a dar 24º e decisivo voto para a aprovação.
Com a garantia do apoio necessário, o líder do governo, Idenir Cecchim (MDB), protocolou requerimento para incluir o projeto na ordem do dia, o que foi acolhido pelo plenário, em que a base aliada tem maioria.
O vereador do PSB disse que mudou de ideia porque, sem a aprovação deste projeto, o governo investiria em outra proposta, que aumenta a alíquota de contribuição dos servidores, que hoje é de 14%, para até 22%.
— Meu 24º voto é o voto do bem, e o voto do bem é evitar um mal maior — afirmou Ferronato na tribuna, em discurso dirigido aos servidores.
De acordo com a prefeitura, a reforma é necessária para conter o déficit no sistema previdenciário municipal. O aporte previsto para este ano na previdência é de R$ 1,3 bilhão, o que representa mais de 17% da receita municipal.
Ao receber o resultado, o prefeito Sebastião Melo agradeceu aos vereadores e ao grupo de servidores que aceitou negociar com o governo:
— A cada centavo que deixarmos de aportar para a previdência, vamos aportar para as áreas sociais da cidade de Porto Alegre. Muito obrigado de alma, sentimento e coração a todos os vereadores, aos servidores e aqueles que, dentro do governo, lideraram esse processo — declarou Melo.
Reviravolta
A decisão de Ferronato em apoiar o projeto, que abriu caminho para a aprovação, ocorreu após uma semana de intensa pressão por parte do funcionalismo. Enquanto os servidores ligados ao Sindicato dos Municipários (Simpa) o pressionavam a manter a posição contrária, associações que representam algumas categorias pediam que revisse a posição, com receio de arcar com a alíquota de até 22%.
O projeto que elevaria a alíquota seria votado na próxima semana. Como dependeria de apenas 19 votos para ser aprovado, o governo teria vitória folgada. Com a aprovação da reforma, a prefeitura desistirá de alterar a alíquota de contribuição.
A votação nesta quarta-feira pegou de surpresa entidades e vereadores contrários à proposta. Na semana passada, o líder do governo havia solicitado a retirada do projeto da ordem de priorização, visto que não havia obtido os votos necessários.
Líder da oposição, o vereador Pedro Ruas (PSOL) disse que a reforma é "nefasta" e que o governo promoveu uma chantagem com os vereadores ao indicar que, sem a aprovação, insistiria no aumento das alíquotas.
— Isso é garganta, é fake news. Não teria valor a votação, qualquer ADI (ação de inconstitucionalidade) acabaria com essa legislação sem sentido. Não existe projeto de aumento de alíquota por vingança.
Aliado de Melo na Câmara, Clàudio Janta (SD) respondeu:
— Nós não queremos aumentar a alíquota dos servidor. Ninguém está fazendo chantagem nenhuma. Os dois projetos estão tramitando.
Todos os vereadores governistas votaram a favor do projeto. Foram contra os dois independente do PDT e nove dos 10 vereadores da oposição, formada por PT, PSOL e PCdoB. Natasha Ferreira (PSOL) não votou, em forma de protesto.
O texto será votado em segundo turno em um prazo de, no mínimo, dez dias. Só depois de aprovado novamente é que se tornará lei.
Principais alterações
O que muda para os servidores com a reforma da previdência municipal:
Idade mínima
Atualmente, mulheres se aposentam com 55 anos e homens com 60 anos. O projeto eleva as idades para, respectivamente, 62 e 65 anos para os novos servidores. Os funcionários também terão de somar no mínimo 25 anos de contribuição, sendo ao menos 10 anos no serviço público e cinco anos no cargo em que for concedida a aposentadoria. Professores podem ir para a inatividade com cinco anos a menos de trabalho.
Pedágio*
Para servidores próximos da aposentadoria, o pedágio (período adicional de contribuição) será de de 50% do tempo de contribuição faltante para aqueles que estão a menos de cinco anos de atingir o tempo mínimo de contribuição. Ou seja: se faltam dois anos de contribuição para a inatividade, com a nova regra, o funcionário terá de trabalhar três.
O percentual aumenta para 70% se o tempo faltante for de cinco a oito anos e para 100% se o tempo faltante for acima de oito anos.
Regra de pontos*
Para se aposentar, funcionários que ingressaram até 2003 deverão atingir um índice no sistema de pontuação que soma a idade e o tempo de contribuição de, no mínimo, 86 pontos para mulheres e 96 para homens. O índice aumentará um ponto por ano, até chegar em 95 para mulheres e cem para homens. Para professores, o limite seria de, respectivamente, 87 e 95 pontos.
Para quem ingressou depois de 2003, o limite seria de até 100 pontos para mulheres e 105 para homens. Para professores, respectivamente, 92 e 100 pontos.
Cálculo dos benefícios (para quem ingressou depois de 2003)**
Atualmente, os servidores se aposentam com a média das 80% maiores contribuições, descontadas as 20% menores. Com a reforma, serão 90% das maiores contribuições, descontadas os 10% menores.
*Servidores em atividade poderão escolher entre a regra de pontos e o pedágio para o cálculo da aposentadoria
**Quem ingressou antes de 2003 têm direito à paridade e à integralidade salarial