Quem reparou foi Jacinta Schmitz, moradora do bairro Moinhos de Vento que visita o parque de mesmo nome em dias alternados e conhece todos os patos, pois deu nome para cada um deles. Há pouco mais de um mês, ao menos cinco aves desapareceram do laguinho do Parcão. É cerca de 10% da população de patos.
– Além da Titi, dei falta da Moreninha, da Dália, da Marrequinha e da Little. Deveria ter uma ronda, para que as pessoas sentissem que o parque está sendo cuidado. Adoro esses patos e, vendo o que está acontecendo, fico muito revoltada e triste – relata Jacinta enquanto é perseguida por Alemão, um dos maiores e mais amistosos habitantes do laguinho, que abana o rabo feito cachorro para ganhar milho debulhado da visitante.
Titi é citada separadamente por ser um caso especial. Jacinta testemunhou a patinha encurralada por dezenas de cágados famintos. Receosa de que, assim que desse as costas, a ave fosse virar jantar dos répteis – predadores naturais de filhotes –, Jacinta não se aguentou e levou a ave para casa.
Pesquisou como alimentá-la e ficou com ela por cerca de um mês dentro do apartamento. Ela pesava 34g quando foi resgatada e 850g ao retornar. Jacinta costumava visitá-la e aproveitava para distribuir milho às demais aves que foram ganhando nomes de acordo com a plumagem – um macho de penugem grisalha, por exemplo, recebeu o nome de Richard Gere. Algumas, ela alimenta com a palma da mão. Outras, mais arredias, têm grãos arremessados até o bico. Titi foi vista pela última vez às vésperas do Natal.
Denúncias de desaparecimento de patos do Parcão não são novidade e a suspeita recai sobre frequentadores noturnos do parque, que capturariam animais para consumo. A Secretaria Municipal do Meio Ambiente, Urbanismo e Sustentabilidade (Smamus), responsável pelo laguinho e sua fauna, declara que não tem subsídio para afirmar que os patos viraram ceias natalinas, mas afirma que patos adultos são animais domésticos, não nativos, e só aparecem ou somem dali por ação humana. Até prática de tiro ao alvo já foi denunciada à prefeitura.
A Smamus, todavia, desaconselha fortemente qualquer influência no ecossistema do parque, inclusive alimentar os patos por conta própria. Os animais dali – que incluem também peixes, cágados e saracuras – recebem ração diariamente às 7h de servidores da prefeitura. Os patos podem parecer famintos, mas são glutões por natureza.
– O Parcão é um dos principais pontos de abandono de patos e cágados de Porto Alegre. As pessoas adquirem esses animais pequenos e acham que eles não crescem. Quando o animal cresce e fica inviável a permanência na casa, os moradores acabam se desfazendo dele em parques. A orientação é que a população não alimente, não maltrate e não abandone os animais de forma indevida – declara o diretor de Áreas Verdes da Smamus, Alex Souza.
Por ora, o sumiço dos patos não preocupa a secretaria. Medidas de segurança como um reforço no cercamento do laguinho são rejeitadas por atrapalhar a reprodução dos cágados, que precisam colocar os ovos distantes da água e retornar ao local (alguns chegam a atravessar a Goethe). A prefeitura estuda um novo plano de manejo do lago, sobretudo para retirada do lodo que aparece em tempos de estiagem, e repetir o censo em parceira com a UFRGS que, em 2013, mapeou os animais do parque.
Sobre a população de aves, ela tem se mantido estável em torno de 47 patos. Quando há superpopulação, alguns são transferidos para outros parques, como o Vinte de Maio, na Zona Norte. Mas, conforme a secretaria, não houve transferência recente. De modo que o paradeiro de Titi e companhia segue desconhecido.
Sobre os patos
Patos como os do Parcão não são animais nativos. Foram colocados ali por ação do homem, mas se adaptaram e se reproduziram. A reprodução ocorre na água, a partir dos sete meses de idade. Um pato macho acasala com até quatro fêmeas, o que gera cerca de 50 patinhos. O choco é de 32 dias. Se não receberem ração, se alimentam de vegetação aquática, insetos e peixes. Podem viver entre 10 e 20 anos, conforme a raça e o ambiente.