Natural do interior de Goiás, mas de forte identificação com a cultura gaúcha, Sebastião Melo (MDB) recebeu a chave da prefeitura de Porto Alegre em cerimônia realizada nesta sexta-feira (1º) em local simbólico: no Largo Jornalista Glênio Peres, rodeado pela Praça XV de Novembro, pelo Mercado Público e pela Praça Montevideo.
Ao ar livre e no chamado coração do Centro Histórico da capital, Melo recebeu a transmissão de cargo do ex-prefeito Nelson Marchezan (PSDB), que se despediu da prefeitura após quatro anos.
Melo enfatizou a disposição de agir com responsabilidade para salvar vidas na pandemia, mas sem voltar a fechar a economia. Em uma frase contundente, assegurou que nenhum empresário “vai ser surpreendido com decreto de madrugada”, o que chegou a ocorrer no governo do antecessor.
O prefeito discursou em favor da justiça social, da escola pública de qualidade na periferia, da ampliação dos restaurantes populares e da rede de acolhimento aos moradores de rua. Frisou a obsessão pelo desenvolvimento social, eleito como carro-chefe da gestão, com a desburocratização e a facilitação para a abertura de novos empreendimentos.
Em nenhum momento da manifestação de 25 minutos, contudo, Melo subiu tanto o tom de voz como quando falou do combate à corrupção. A ação do prefeito ocorreu após a despedida de Marchezan, que disse ter vencido a “corrupção histórica” no seu mandato, o que pode ser lido como uma crítica indireta a governos anteriores liderados ou com a participação do MDB na prefeitura de Porto Alegre.
– Transparência, rigorismo, foco e verdade é o que vamos fazer na prefeitura de Porto Alegre. O dever da ética não pertence a um, pertence a todos nós. Tenho 12 anos de vereador, 4 anos de vice-prefeito, dois anos de deputado. Desafio nesta cidade e neste país quem possa dizer se eu desviei um alfinete na vida pública – disse Melo, repetindo o bordão “tolerância zero com a corrupção”.
Na cerimônia, Melo também deu posse ao secretariado. Nos últimos dias, seja em manifestações públicas ou em reuniões fechadas, o prefeito enviou recados diretos ao time de secretários, exigindo deles unidade e lealdade. O emedebista tem dito que os auxiliares de primeiro escalão terão liberdade para fazer contrapontos e manifestar convicções, mas com o alerta de que cobrará fidelidade às deliberações finais de governo.
Melo disse que, junto do seu vice-prefeito Ricardo Gomes (DEM), implementará um governo de tomada de decisões. Fez diversas afirmações neste sentido, como o envio da reforma da previdência dos servidores municipais para ser votado na Câmara Municipal.
Outra deliberação firme foi feita quando o prefeito falava em melhorar o Centro de Porto Alegre e apontou para o edifício inacabado há décadas quase à esquina das ruas Marechal Floriano Peixoto e Otávio Rocha, com tijolos à vista e sujeira que parecem reproduzir uma cicatriz no rosto da Capital.
– Ou os proprietários arrumam o prédio, ou ele virá para o chão. Assim não vai ficar – prometeu Melo, referindo-se ao imóvel como “esqueletão”.
Posse na Câmara de Vereadores
Antes da cerimônia de transmissão de cargo, Melo foi empossado prefeito em sessão na Câmara. Na Casa em que exerceu três mandatos de vereador, ele se manifestou pela primeira vez como chefe do Executivo porto-alegrense. Acompanhado do vice-prefeito, ele ingressou no plenário às 16h45min, ficando de fora dos momentos de tensão entre os vereadores na eleição à Mesa Diretora da Câmara.
– É preciso levantar o otimismo. A cidade vive momento de grande depressão, perdemos muitos empregos, muitas empresas não voltam mais. É preciso equilibrar desenvolvimento econômico com proteção social – discursou Melo diante dos vereadores recém-empossados.
O prefeito afirmou que economia e saúde caminharão juntas para que “a cidade não volte a fechar”. Ele disse que a vacina contra a covid-19 é a iniciativa mais importante a ser buscada no momento, firmando crença de que o governo federal irá disponibilizar o imunizante.
– Se o governo federal não der sinais claros, vamos fazer um consórcio metropolitano para comprar a vacina. A vida em primeiro lugar – afirmou o prefeito, que agradeceu a dedicação dos profissionais de saúde no enfrentamento da pandemia.
Ele defendeu o liberalismo, a desburocratização para a abertura de negócios, emissão de alvarás e de licenças, mas assegurou que não abrirá mão de políticas de “proteção social”. Também ressaltou que irá fortalecer o Orçamento Participativo, programa que foi uma marca inicial das gestões do PT na cidade.
– Vivemos tempos difíceis, precisamos ampliar os restaurantes populares, as parcerias com as igrejas e ONGs que trabalham nessa área. Precisamos de políticas públicas de acolhimento aos moradores de rua. E vamos fazer o programa de microcrédito – disse Melo, ressaltando que as medidas dependem de desenvolvimento econômico para saírem do papel.
O emedebista declarou que não enviará projetos de aumento de impostos nos quatro anos de governo e anunciou que, nos próximos dias, remeterá a proposta de cancelamento dos aumentos de IPTU previstos para ocorrer entre 2022 e 2025.
– Teremos diálogo com esta Casa para enfrentar temas importantes, como a reforma da previdência, que é para o bem dos servidores (municipais) – anunciou Melo, tocando em uma das pautas que ele já definiu como prioritárias para 2021.
Reconhecido pela habilidade no diálogo e pelo trânsito entre diferentes campos políticos, Melo prometeu manter relação democrática e propositiva com a Câmara. Ele mandou diversos recados sob medida para agradar a base aliada.
– Convivi na minha vida com muitas divergências, mas as divergências que tive sempre foram em busca de uma vida e uma cidade melhores. Vocês terão de mim um prefeito de diálogo, que respeita profundamente as diferenças e sabe conviver com elas. Vamos dialogar permanentemente com a base do governo, mas vou respeitar a oposição. Quero dialogar e visitar as bancadas de oposição para conversar – declarou.
Melo arrematou ao dizer que o governo estará de portas abertas para receber pedidos e sugestões de vereadores a qualquer tempo.
– A demanda que vem do vereador é legítima também. Ele foi eleito para melhorar a vida da cidade. Quando um vereador visita um bairro e vê coisa errada, ele tem legitimidade para pedir correções. Nossos secretários serão orientados para recebê-los. Vereador não tem hora e não tem dia para entrar no Paço Municipal. Esse é o meu jeito de trabalhar – avisou Melo.
Neste sábado (2), Melo reunirá o secretariado pela manhã e, à tarde, terá a primeira agenda externa após a posse ao visitar o bairro Mario Quintana, na zona norte, um dos mais vulneráveis de Porto Alegre, para ouvir a população e levar serviços como limpezas de arroio e de bocas de lobo, além da poda de árvores.