Moradores de diferentes bairros de Porto Alegre têm reclamado sobre cobranças de luz por estimativa, muitas vezes com valores destoantes. O cálculo da fatura por meio de média dos 12 meses anteriores é uma prática de companhias como a CEEE quando o leiturista não consegue acesso ao relógio — embora alguns síndicos aleguem que o funcionário não foi até o prédio.
Na Rua Bento Martins, no Centro Histórico, o artista Daniel Camargo, 37 anos, recebeu na caixa de correio uma notificação dizendo que a companhia não conseguiu acesso para fazer a leitura do medidor no seu prédio em agosto, o que levaria ao cálculo pela média. Para a surpresa, no box de dívidas apareceu, na sequência, R$ 400 por um consumo de 514 kwh – de uma fatura que nem recebeu, segundo ele. Os valores são muito acima do que ele costuma gastar com energia: consome uma média de 120 kwh por mês.
— Moro há mais de 15 anos na cidade e não havia me acontecido.
No bairro Farroupilha, a analista de qualidade de softwares Renata Rigol, 43 anos, teve uma situação semelhante no ano passado. Gastava cerca de R$ 120 de energia elétrica no apartamento da João Pessoa, mas uma conta chegou a R$ 600. Descobriu que estavam fazendo leitura pela média, embora ela, síndica na época, alegue que o funcionário da companhia tinha a chave do condomínio para fazer as medições. A CEEE afirma que a orientação é que apenas o morador de um apartamento forneça o acesso para o leiturista.
Renata começou uma cruzada contra a cobrança por estimativa. Fez uma pesquisa no bairro, conversou com gente de outras regiões da cidade, com outros síndicos, e ouviu relatos de leitura por média acrescida de valores chamativos — e descobriu que muita gente não reclamava por não saber como.
Ela se queixou com a CEEE, mas não conseguiu a resposta que queria. Então foi ao Procon, à Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) e até com o Ministério Público buscou ajuda.
— Nem todo mundo sabe usar internet, muitos pensam: não vou me incomodar. Mas nós temos de buscar o que está acontecendo, saber por que é assim.
No prédio da secretária executiva Cátia Rosa da Silva, 52 anos, no bairro Tristeza, a síndica costumava colocar cartazes acessíveis ao leiturista perto da grade, indicando o consumo de cada imóvel. Mas a leitura foi feita pela média em junho, e ela notou uma sequência de oscilações de valores. Se em agosto a conta era de R$ 229, em setembro, por estimativa, foi de R$ 437. Chega perto de uma conta do começo do ano, quando estava usando ar-condicionado a todo vapor, mas nada a ver com o consumo para essa época do ano. Na fatura de outubro, porém, veio bem menos que o normal: R$ 49. Claro que foi um alívio, mas ainda assim preocupa.
— A gente se programa para pagar um valor, programa as coisas do mês, e daqui a pouco dá um pulo.
A síndica profissional do prédio de Catia também presta serviços nos bairros Menino Deus e Independência e afirma que acontece de o funcionário não ir ao local para atualizar a leitura
Na Rua Vasco Alves, no Centro Histórico, a aposentada Anita Piglionica Teixeira, 66 anos, também recebeu uma conta exorbitante. Pelo começo da pandemia, começou a ter cobranças muito abaixo do normal e, de uma hora para outra, veio um débito de R$ 502 referente ao mês de setembro.
— De onde saiu esse valor eu não sei, não explica em nada o que aconteceu.
A CEEE checou esses casos da matéria e foi até os prédios para avaliar nesta terça-feira (3). Afirma que são situações pontuais, que acontecem quando não há acesso. “Como não houve alteração nos procedimentos da CEEE Distribuição ou das empresas contratadas para leitura, não há nenhuma tendência de maior ocorrência para esse tipo de situação”, respondeu, por meio de assessoria de imprensa.
A situação foi mais frequente no início da pandemia, quando os moradores estavam com receio em deixar os colaboradores das Firmas de Leitura acessarem alguns condomínios e residências. Mesmo assim, na CEEE-D o faturamento pela média em área urbana representa menos de 3% do faturamento das UCs.
A companhia relata que, no caso de Daniel e de Renata, pode ter ocorrido “acúmulo de consumo devido à falta de acesso, de responsabilidade do cliente”.
No caso da moradora do Tristeza, segundo a CEEE, teve também a questão do informe equivocado do valor do relógio. E, no último caso, foi cobrada a taxa mínima por falta de acesso por um período e, quando o funcionário teve acesso ao medidor, foi possível fazer a cobrança compensando os meses sem acesso.
Como fazer para que evitar cobranças pela média
A CEEE dispõe de um serviço de autoleitura via mensagem de texto, onde o responsável pela conta envia SMS para o úmero 27307, a partir de 10 dias antes da data de leitura prevista (disponível na última fatura). É necessário escrever a palavra LEITURA, seguido do número de UC (Unidade consumidora, que está na conta de luz) e o valor da leitura do medidor. Também é possível fazer pela agência virtual da CEEE.
Em caso de dúvida ou reclamações, o cliente pode entrar em contato pelo 0800 721 2333 ou na agência virtual em www.ceee.com.br.
O que diz o Procon de Porto Alegre:
Via de regra, as leituras de consumo devem ser realizadas a cada 30 dias, mas Resolução Normativa da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) prevê a realização de leitura em intervalos diferentes no caso de "situação de emergência ou de calamidade pública, decretadas por órgão competente, ou motivo de força maior, comprovados por meio documental à área de fiscalização”.
Em uma situação normal, a cobrança por média somente é realizada em caso de "impedimento de acesso" e pelo período máximo de três meses - devendo a distribuidora de energia, tão logo caracterizado o impedimento, comunicar o consumidor, por escrito, sobre a obrigação de manter livre o acesso.
Caso a distribuidora não possa efetuar a leitura por motivo de situação de emergência ou de calamidade pública, decretadas por órgão competente, ou motivo de força maior, comprovados por meio documental à área de fiscalização da Aneel, o faturamento deve ser efetuado utilizando-se a média aritmética dos valores faturados nos doze últimos ciclos de faturamento.
Para evitar a cobrança por média, o consumidor pode informar à CEEE a leitura do seu medidor, através do site da CEEE ou envio de SMS.
O que o Procon aconselha ao cliente que se sente injustiçado?
O consumidor deve sempre procurar resolver suas reclamações diretamente com a empresa e procurar o Procon caso não tenha tido sucesso na solução.
É aconselhável que, mesmo não achando justo, a pessoa pague a conta primeiro e depois busque tomar providências?
O ideal é contestar a fatura antes da data do vencimento. Mas para evitar eventual incidência de juros e multa, mesmo que realizado o pagamento é possível dar prosseguimento a reclamação, com abatimento futuro do valor pago a maior. Importante ter cuidado com a inadimplência em sucessivos meses, o que pode pode acarretar a suspensão do fornecimento de energia elétrica.
Quais os canais de acesso ao Procon?
O canal de contato com o Procon é o site. Os atendimentos presenciais estão suspensos por causa da pandemia e serão retomados a partir de 16 de novembro, por agendamento no site.