Logo após a abertura dos portões do Mercado Público, pontualmente às 8h30min, um dos espaço mais icônicos do local voltou a ser visitado. A encruzilhada central dos quatro principais corredores é considerada a morada do Orixá Bará. Com o fechamento do mercado, há um mês, o local ficou sem receber as manifestações que ocorrem ali todos os dias e marcam a religiosidade afro-brasileira na cidade de Porto Alegre.
A primeira a visitar o local nesta manhã foi Silvia de Iemanjá. Descalça e deitada com o rosto rente ao mosaico, ela comemorou a reabertura do mercado.
— O Bará foi a primeira coisa plantada aqui, faz parte da nossa raiz, nos dá o caminho para seguir a vida. Eu agradeci o que ele me deu de bom, pedindo que me dê saúde, prosperidade e caminhos abertos.
Quem é o orixá Bará?
Bem no centro do Mercado Público, indicado por um mosaico com imagens de chaves no chão, é o local considerado morada do Orixá Bará. Ele tem o poder de abrir caminhos, segundo as religiões afro-brasileiras — o objeto em que a divindade está assentada, chamado de ocutá, teria sido enterrado bem no cruzamento dos quatro quadrantes.
O ponto recebe uma manifestação religiosa chamada Passeio, marca histórica da territorialidade negra e da religiosidade afro-brasileira na cidade de Porto Alegre. A iniciação em muitas religiões deve começar com esse ritual, nas ruas do Mercado. Caminha-se atirando moedas e balas de mel pelo chão, como oferenda.
O Mercado e as religiões de matriz africana
Considerado um dos mais importantes templos do sul do país, o Mercado Público faz parte dos rituais cumpridos pelos praticantes das religiões afro-brasileiras, que acreditam estar ali um ponto de convergência de energias, além de ser a morada permanente do orixá Bará.
Durante a restauração mais recente, um mosaico foi montado no chão como um monumento para marcar a localização do objeto sagrado. Em busca do axé deste Bará, os devotos iniciam-se na vida religiosa no local. Também acreditam que, comprando os produtos com os quais cumprem seus rituais nas lojas (chamadas por eles de floras) do Mercado, carregam nas compras a energia do Bará.
Reunido junto aos fiéis no Largo Glênio Peres na manhã desta sexta-feira, do lado de fora, o presidente do Conselho Estadual do Povo de Terreiro do Estado do Rio Grande do Sul, Baba Diba de Iemanjá, comentou a importância da reabertura do mercado.
— Nós sempre questionamos muito o fechamento. Grandes redes de supermercados estão abertas, recebendo muitos clientes. Por que essa fiscalização tão intensa? — comentou.
A prefeitura de Porto Alegre pretende repassar a gestão do espaço à iniciativa privada pelos próximos 25 anos. A medida não agrada os permissionários, muito menos a entidade comandada por Baba Diba. Eles temem que a concessão restrinja a circulação e manifestação das religiões de matriz africana no espaço. Um protesto está marcado para a próxima terça-feira (11), quando a 1ª Câmara do Tribunal de Contas do Estado (TCE) analisará recurso da prefeitura da Capital para que seja retomado o processo de concessão.
— Iremos fazer um tamborzaço e vamos em direção ao Tribunal de Contas do Estado. Convidamos os permissionários, para que nos acompanhem nesse protesto — informou.
A entrada no local está sendo controlada por seguranças e mediante a medição da temperatura corporal. Somente uma pessoa por família é permitida ingressar.