No topo de uma escada de dois metros de altura, preso por uma corda que conecta-o pela cintura a um delgado poste de luz, Claudio Pohlmann esbanja serenidade enquanto trabalha à beira de um pequeno abismo: às costas, há uma queda de mais de cem metros de altura.
O eletrotécnico de 57 anos já está acostumado a integrar a cena que, na melhor das hipóteses, provocaria vertigem em muita gente. Há quase três décadas, ele é o responsável por trocar as lâmpadas de sinalização e fazer a manutenção do para-raio do Edifício Santa Cruz, o mais alto de Porto Alegre.
De tempos em tempos, Pohlmann sobe ao terraço da construção de 107 metros de altura, localizada na Rua dos Andradas, para substituir uma das quatro lâmpadas utilizadas como sinalizadores de obstáculo para aviões ou para apertar os conectores do para-raio instalado no local.
O serviço não leva mais do que alguns minutos, mas requer sangue frio: todos os reparos exigem o auxílio de uma escada e são executados muito perto das bordas do Santa Cruz, de onde se avistam prédios históricos de Porto Alegre, como o Centro Administrativo, o Mercado Público e a Casa de Cultura Mario Quintana, além do município de Guaíba, do Morro da Polícia, do Morro Santa Tereza e das ilhas do Delta do Jacuí.
Do alto do prédio de 34 pavimentos erguido na década de 1950, os pedestres que circulam pelo emblemático calçamento da Praça da Alfândega não passam de minúsculas silhuetas que mais lembram formigas. De estatura mediana e corpo franzino, o eletrotécnico se agiganta enquanto, calmamente, tira proteção plástica vermelha para trocar a lâmpada no topo de um poste de mais de cinco metros. O processo é tão natural que não entende o que causa espanto na sua atividade:
— Eu subo só dois metros...— diz, referindo-se à escada utilizada para acessar a lâmpada, cuja ligação é ativada por fotocélula.
Para realizar o serviço, adota medidas de segurança em diferentes níveis. Primeiro, amarra a escada ao poste e, quando no alto, utiliza um cinto de segurança para prender a si mesmo e ficar com as mãos livres. Dispensa uniforme, mas usa capacete e trabalha sempre de bota emborrachada.
O eletrotécnico de temperamento sereno considera que tranquilidade é característica indispensável para realizar a arriscada tarefa, que até hoje não delegou a nenhum outro funcionário da empresa, especializada em serviços de elétrica e automação.
— É um serviço simples, não tem por que se apressar. E poucos têm o privilégio de vir aqui. É muito bonito. A vista alivia a tensão — diz o homem, que mora com a esposa em um sobrado.
Apenas um funcionário do Santa Cruz detém a chave que dá acesso ao topo do edifício famoso — nem mesmo os moradores são autorizados a subir no local. Para chegar ao terraço, depois do elevador, há escada metálica cujos degraus só acomodam o pé de lado.
Apreciador de belas paisagens — quando viaja de avião gosta de sentar à janela para curtir a vista —, Pohlmann aproveita para, sempre que possível, registrar no celular o nascer ou o pôr do sol de ângulos inacessíveis a boa parte dos porto-alegrenses.
Medo de altura, obviamente, nunca foi problema para o eletrotécnico, que descobriu logo no começo dos estudos na Escola Técnica Parobé que passaria boa parte da vida bem longe do chão — a manutenção de fios elétricos, de modo geral, costuma ocorrer no topo de postes e edificações. A boa relação com lugares altos, no entanto, limita-se ao ofício e à contemplação.
— Uma vez andei naquele barco viking. Parecia que o coração ia sair pela boca! Montanha russa também. Esses dão frio na barriga. Eu prefiro altura quando tenho certeza de que estou seguro — conta.