Diagnosticada com um tumor cerebral aos 13 anos, em 2014, Isadora Ribeiro recebeu força de onde poucos imaginavam para vencer a doença: no futebol amador de Gravataí, cidade onde mora. Seu desejo após a primeira cirurgia foi ir ao campo do time do coração, o Grêmio Esportivo Três Estrelas, de onde tiraria energia para reiniciar a vida, mesmo contrariando a recomendação médica de permanecer em casa. Foi recebida como um troféu de Copa do Mundo: entrou nos braços de um jogador, virou mascote do time e música que não sai da cabeça dos torcedores.
"Dá-lhe ô, dá-lhe ô, Isadora, dá-lhe ô", cantava o grupo Bicho Papão, torcida organizada do Três Estrelas, com as batidas graves do bumbo e secas do tarol compondo a trilha sonora.
A menina entrou em campo com 32 pontos na cabeça, máscara cirúrgica, toucas e luva. Um ano depois do episódio que uniu clube, comunidade, família e a menina, o diagnóstico médico foi de que a doença foi controlada. Foi assim que nasceu a história que ficou conhecida na região como "a lenda de Isadora".
Aos 16 anos, Isadora segue sendo torcedora fanática do time, que é presidido por seu pai, Vagner dos Santos, o Didu, 36 anos. A união dos jogadores em torno dela será para sempre lembrada pela adolescente, como no dia em que todos os atletas rasparam os cabelos para ficarem parecidos e quando fizeram surpresa ao esperarem por ela na saída de uma sessão de quimioterapia. Ou nas vezes em que o time doou gasolina e dinheiro para ajudar no seu tratamento. Ou ainda em sua festa de 15 anos, comemoração que jogadores e torcedores ajudaram a realizar.
— Eles me deram toda a força que precisava. Foi de onde eu tirei coragem para acreditar que eu poderia vencer — resume a garota.
O clube, fundado em 1963, é o maior campeão do torneio municipal de Gravataí, com 11 títulos na categoria principal. Apesar das conquistas, o nome Três Estrelas ganhou repercussão estadual após um episódio de violência em 12 de julho. Em um domingo, criminosos abriram fogo contra um homem que estava na sede do clube após um jogo. O campo, aos finais de semana, se torna ponto de referência do bairro e havia uma comemoração com torcedores e jogadores. Segundo o relato de testemunhas, o alvo correu em direção à multidão para buscar refúgio. O atentado acabou com duas pessoas mortas e oito feridas.
Isadora havia saído da sede do clube instantes antes do tiroteio e perdeu uma de suas amigas, a professora Maiara Emili Silveira da Silva, 20 anos.
— Eu estava sentada com ela, a Maiara, pouco antes de tudo acontecer comendo trufas de chocolate. Como sempre, ela tava muito feliz e sorrindo. Disse para ela: vou sair, mas volto. Estava caminhando e ouvi os disparos. Aquilo me derrubou — conta.
Menina é homenageada em taça
O clube está organizando a Taça Isadora Ribeiro de Futebol. Será no dia 7 de setembro, como nas outras três edições. Todo o dinheiro será revertido para alguma criança com câncer, que será escolhida por Isadora. Ela costuma ir à Santa Casa, onde fez o tratamento, e doar para quem tem poucas condições financeiras. Além disso, também já começaram as tratativas para a corrida que leva o nome da menina. A inscrição são cinco brinquedos novos para doação. Ainda não foi definida data, e a família busca patrocinadores.
O objetivo da mãe, Angélica Ribeiro, 35 anos, é não deixar que seja esquecida "a lenda de Isadora":
— O amor cura e o carinho consola. Foi realmente isso que aconteceu. A semana toda os jogadores passavam nos ajudando, com roupa, comida. Agora podemos ajudar a outras pessoas.