Enquanto Porto Alegre não solta o freio quando o assunto é a construção de ciclovias, o Plano Diretor Cicloviário Integrado completa 10 anos nesta segunda-feira (15). Com lei sancionada em 15 de julho de 2009 pelo então prefeito José Fogaça, os estudos que serviram de base apontaram 495 quilômetros de vias para receber ciclovias e ciclofaixas. Hoje, há 48 quilômetros reservados às bikes no município, e a justificativa é falta de recursos.
Os estudos para a elaboração do plano de Porto Alegre ocorreram entre 2005 e 2008. Alessandra Both, coordenadora de Projetos de Mobilidade Sustentável da EPTC, relata que foram levados em consideração fatores como acidentes envolvendo bicicletas e projeção de demanda futura. Não foi dado prazo para a realização – até porque, como ressalta Alessandra, parte do traçado previsto contava com a realização de obras como alargamentos ou desapropriações, que não aconteceram até hoje.
Foram entregues 3,1 quilômetros de ciclovias e ciclofaixas nos primeiros anos da gestão Nelson Marchezan, contra 19,4 dos dois anos anteriores. As contrapartidas, uma das principais ferramentas para implantar rede cicloviária sem dinheiro em caixa (representam um terço do total), não têm dado o resultado esperado – houve menos empreendimentos executados. O restante foi feito com recursos da prefeitura ou financiamento, como da Corporação Andina de Fomento (CAF).
– A implantação não tem acontecido conforme o esperado, mas os projetos continuam. Estamos buscando recursos – justifica Alessandra.
Além da finalização nas avenidas Nilópolis e Nilo Peçanha, também estão previstos neste ano trecho na Voluntários da Pátria (próximo ao DC Shopping) e 1,7 quilômetro na Ipiranga, ambos por contrapartida.
Em outras capitais, perspectivas e números são mais positivos. Com área e população não muito diferentes de Porto Alegre, Curitiba tem estrutura cicloviária de 208,5 quilômetros. A meta é de praticamente dobrar a extensão da malha cicloviária até 2025. De acordo com o Instituto de Pesquisa e Planejamento Urbano de Curitiba (Ippuc), boa parte do investimento vem de recursos da prefeitura, mas também há verbas do governo do Paraná – não há investimento privado.
Já a maior cidade do país tem malha cicloviária de 503 quilômetros. Durante a gestão de Fernando Haddad (PT), de 2013 a 2016, a quilometragem de ciclovias em São Paulo foi multiplicada por sete. Agora, o prefeito Bruno Covas (PSDB) toca um plano para fazer a conexão de ciclovias e ciclofaixas entre si e com terminais de ônibus, estações de metrô e trens, prevendo construção de ao menos 173 quilômetros e melhoria na infraestrutura de 310 quilômetros da malha existente, com verba total de R$ 325,7 milhões para o biênio 2019 e 2020.
Outra capital com resultados muito superiores a Porto Alegre é Brasília, com 466,6 quilômetros disponíveis em quase todas as regiões administrativas, construídos ao longo de 20 anos com recursos do governo, segundo a Secretaria de Transporte e Mobilidade. O Distrito Federal tem hoje mais de cem quilômetros em projetos executivos.
Um quinto das viagens diárias feito com bikes
Sócio fundador da empresa TCUrbes, coautor do livro A Bicicleta e as Cidades e consultor em planejamento de mobilidade sustentável, o arquiteto e urbanista Ricardo Corrêa coordenou a elaboração do estudo que deu origem ao Plano Diretor Cicloviário em Porto Alegre após pedalar cerca de 1,5 mil quilômetros na Capital.
Ele lembra que o documento foi realizado após exigência do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID): para financiar a construção da Terceira Perimetral, havia a cobrança de construção de uma ciclovia, mas ela não foi feita. Então, foi exigida a criação de um plano cicloviário e iniciada a sua aplicação.
Natural de Porto Alegre, Corrêa lamenta que o plano não tenha sido implantado, e ressalta o grande potencial da cidade para o transporte por bicicletas, por razões como o clima (que, fora semanas atípicas, se mantém ameno em comparação com outras capitais brasileiras) e o fato de maior parte do território ser relativamente plano.
– Acho que há potencial para ter mais de 20% das viagens diárias feitas de bicicleta na cidade se o plano fosse implementado. Isso é uma coisa muito grande, traria muitos benefícios econômicos e sociais – ressalta.
Sobre a justificativa de falta de verba, uma das sugestões que dá à prefeitura é a elaboração de uma parceria público-privada – sua empresa de consultoria está desenhando propostas nesse sentido para outras cidades.
– O plano deveria ser aprimorado a cada cinco anos. Daqui mais 10 anos, vão estar todos andando de bike elétrica, a bike vai ter tirado lugar do carro e vai ser cômico não ter implantado uma gestão cicloviária como era previsto – diz Corrêa.
Rotas e ciclovias mais seguras
- Avenida Ipiranga tem 9,4 quilômetros de ciclovia e a prefeitura busca verba por meio de contrapartidas para implantar o trecho de 1,7 quilômetro entre a Avenida Lucas de Oliveira e a Rua Salvador França, completando assim toda a extensão da via. Os projetos já estão prontos.
- Orla do Guaíba, entre o Gasômetro e a região do antigo Estaleiro Só, junto à Fundação Iberê Camargo.
- Ciclovia Ipanema (Ciclovia Ayrton Senna da Silva), com 1,2 quilômetro de extensão.
- Ciclovia da Diário de Notícias, com dois quilômetros de extensão, na Avenida Diário de Notícias.
- Ciclovia da Restinga, com 4,6 quilômetros de extensão.