Um projeto desenvolvido pela Secretaria da Saúde de Viamão para combater o avanço de aids no município conseguiu mais do que alertar o público local: despertou o interesse do Programa Conjunto das Nações Unidas sobre HIV/aids (Unaids). Nesta terça-feira (10), uma delegação chefiada pela diretora do Unaids no Brasil, Georgiana Braga-Orillard, conheceu de perto a experiência. A cidade da Região Metropolitana tem uma das maiores taxas de detecção no Estado, com 47,7 casos por 100 mil habitantes — mais do que o dobro da média nacional (18,5 casos por 100 mil habitantes).
— A ideia de visitar o projeto Prevenção: #TôDentro - Viamão mais forte contra a AIDS é a de certificar a importância dessa iniciativa para o combate à doença. Gostaria que a parceria entre saúde e educação fosse levada para o resto do Estado e para outros lugares do país — comentou Georgiana, depois de visitar por duas horas as cinco estações que fazem parte do projeto.
Instalada em cinco contêineres na Praça da Matriz, no centro de Viamão, a exposição interativa guiada por atores e profissionais de saúde convida os jovens a conhecerem mais sobre a doença, proporcionando experiências sensoriais relacionadas ao uso do preservativo, e teste rápido de HIV como estratégia de prevenção, vulnerabilidade e preconceito. Também há distribuição e informação sobre o uso correto dos preservativos masculino e feminino, tudo numa linguagem que envolve tecnologia e até uma balada fictícia num dos espaços da proposta. Convidado pelo Unaids para conhecer a experiência de Viamão, o estudante de Farmácia Rafael Arcanjo, 30 anos, de Manaus (AM), aprovou o #TôDentro.
— É totalmente diferente do que se vê em outros lugares. A linguagem é de fácil compreensão, e a proposta de interação é muito próxima dos jovens de hoje. Achei maravilhoso! — afirmou.
Iniciada em 2016, a experiência itinerante dentro do município já foi visitada por 7 mil estudantes da rede pública de ensino de Viamão. A meta é transformar os participantes em multiplicadores das informações divulgadas. A decisão da Secretaria Municipal da Saúde de impactar os mais jovens está baseada em dois dados do Ministério da Saúde: o número de casos novos entre pessoas de 15 a 19 anos cresceu 81% nos últimos 10 anos e a menor adesão ao tratamento no país está entre jovens. Para tornar realidade o #TôDentro, o município investiu R$ 150 mil. Cada montagem para 2 mil alunos custa aos cofres públicos cerca de R$ 19 mil — hoje, um paciente com HIV custa ao município cerca de R$ 18 mil por ano.
— A aids não tem CEP. Está em todos os lugares, mas há uma sensação de que a doença está controlada. Isso é um grande erro. É fundamental encontrar outras formas de falar com os jovens, para que eles possam ter a percepção do quanto estão vulneráveis à epidemia e passem a ser protagonistas da sua prevenção — explicou a médica Maria Letícia Ikeda, coordenadora da Política de HIV/aids e Hepatites Virais do município.
Viamão se comprometeu a eliminar a epidemia até 2030
Desde 2015, Viamão é uma das 15 cidades gaúchas — que inclui também Porto Alegre, Alvorada, Cachoeirinha, Canoas, Caxias do Sul, Esteio, Guaíba, Gravataí, Novo Hamburgo, Rio Grande, Santana do Livramento, São Leopoldo, Sapucaia do Sul e Uruguaiana — a comprometer-se oficialmente junto à Organização das Nações Unidas (ONU) a eliminar a epidemia de aids até 2030. As 15 cidades representam 70% das pessoas vivendo com HIV ou aids em solo gaúcho.
— Iniciativas como a Viamão são muito interessantes porque a saúde não pode trabalhar sozinha. Aqui, vemos ela de mãos dadas com a educação, com os jovens mais vulneráveis. Numa conversa muito franca, com a linguagem deles. E isso tem um impacto diferente. Ainda temos no Brasil 40 mil novas infecções por ano e cerca de 12 mil mortes anuais. As pessoas estão chegando tarde ao tratamento. Precisamos trabalhar como sociedade, não dá para ficar apenas no posto de saúde. Precisamos envolver as escolas, os líderes comunitários e as comunidades — reforçou Georgiana.
Nesta quarta-feira (11), a comitiva do Unaids participará de uma reunião do Grupo Temático Ampliado das Nações Unidas sobre HIV/aids (GT Unaids), no Palácio Piratini. O encontro contará com a presença do governador do Estado, José Ivo Sartori, e de autoridades da área de saúde dos municípios gaúchos que assinaram a Declaração de Paris.
Os números no Estado
- A taxa de detecção de aids em 2016 no Rio Grande do Sul foi de 31,8 casos/100 mil habitantes, havendo uma redução de 9,4% em relação ao ano anterior.
- Porém, ainda representa quase o dobro da taxa do Brasil (18,5 casos/100 mil habitantes), sendo a segunda taxa mais elevada entre os Estados brasileiros.
- A maior concentração dos casos de aids no RS está em indivíduos com idades entre 30 e 34 anos (17,7%), seguida pela faixa etária dos 35 aos 39 anos (15,9%).
- A Capital, embora também com elevadas taxas de detecção, vem apresentando nos últimos seis anos diminuição da ocorrência de novas infecções na população em geral, mas ainda mantém a primeira posição no ranking de capitais com a maior taxa de detecção (65,9 casos/100 mil habitantes), seguida de Florianópolis (61,5 casos/100 mil habitantes) e Belém (55,4 casos/100 mil habitantes) em 2016.
Fonte: Secretaria Estadual da Saúde — Coordenação de IST/aids
O que os visitantes encontram em Viamão
Primeira estação: Laboratório da Informação
No que seria um laboratório de ciências — com tubos de ensaio, monitores touch screen, águas com corantes e gelo seco —, o cientista lança ao visitante um breve histórico da epidemia, os grupos que mais têm sido infectados e formas de transmissão, prevenção e tratamento para o HIV e sífilis.
Segunda estação: Camisinha: não tem desculpa para não usar
Numa bancada com diferentes próteses penianas e vaginais, os visitantes acompanharão a experiência correta de colocação do preservativo. Depois, usando um preservativo numa das mãos, como se fosse uma luva, o visitante é convidado a colocá-la em diferentes nichos onde poderão sentir diferentes texturas e temperaturas. A ideia é mostrar que a camisinha não muda a experiência sensorial.
Terceira estação: Vivendo com HIV
Os visitantes assistem, em cabines individuais, vídeos com depoimentos de jovens vivendo com HIV. Ao final do vídeo, os participantes, de frente para um espelho, são estimulados, por meio de áudios nos fones de ouvido, a refletirem sobre preconceito e prevenção.
Quarta estação: O cupido me flechou e informou
Numa balada, uma atriz com roupa de cupido, fará uma dinâmica com o grupo com os participantes para que eles possam refletir o quanto são vulneráveis a contrair infecções sexualmente transmissíveis (IST) e como podem proceder para gerenciar o risco.
Quinta estação: Uma picadinha não dói
Enfermeiros da Secretaria Municipal da Saúde ilustram como é feito o teste rápido para HIV/sífilis, focando na importância de cada visitante saber da sua sorologia. O objetivo é desmistificar o teste de HIV e torná-lo um exame de rotina. Ao final, os visitantes são convidados a fazerem o teste na unidade móvel instalada ao lado dos contêineres.