Uma manifestação de moradores da Vila Boa Esperança em frente à reitoria da UFRGS pediu a preservação de suas moradias, onde vivem 96 famílias. A universidade pede reintegração de posse da área onde fica a vila, no bairro Agronomia. O ato foi feito durante o Ufrgs Portas Abertas, que reúne estudantes de escolas de diferentes cidades para conhecer a universidade. Cerca de 40 pessoas participaram da manifestação.
Os moradores dizem que a ocupação da vila ocorreu no início da década de 1960, quando a área pertencia à família do general José Antônio Flores da Cunha. As primeiras famílias se fixaram ali em razão do trabalho na empresa de mineração e extração de saibro, que na época explorava o local. Alegam que a UFRGS tomou posse do solo em 1984, quando já havia moradores no local.
Em dezembro de 2016, a UFRGS entrou com processo de reintegração de posse, e os moradores reclamam não haver um projeto de reassentamento.
Acompanhado de tambores e com apoio de estudantes, o grupo gritava frases como "O seu reitor, que covardia, Boa Esperança tem direito à moradia" e "UFRGS, UFRGS, não tem arrego. Tirou nossa casa, nós tiramos teu sossego".
- Simplesmente não podemos sair de lá - disse o morador Ivanor Cruz da Silva.
- Queremos mostrar que não fizemos invasão. Já havia outras famílias lá.. A gente quer morar lá sempre de maneira organizada e legítima. Queremos inclusive receber e pagar serviços que não recebemos hoje - acrescentou Danilo Emerson Rieger, que conheceu sua mulher há 13 anos no local (ambos já viviam lá) e tiveram um filho que está com 10 anos.
- Temos direitos claros, só queremos viver nas nossas casas e vamos continuar lutando por isso - afirmou Cleuton Lima, primeiro-secretário da associação dos moradores.
O processo movido pela UFRGS tramita na 6ª Vara da Justiça Federal de Porto Alegre. No mês passado, depois de ser procurada por moradores da Boa Esperança, a Defensoria Pública da União exigiu na Justiça a suspensão do processo pelo prazo de um ano até a definição de um pedido de concessão à universidade – feito pela própria defensoria – de uso especial para fins de moradia. Segundo a defensora regional de Direitos Humanos no Estado, Ana Luisa Zago de Moraes, o pedido de concessão é inédito na DPU e baseia-se na moradia como um direito social, amparado pela Constituição Federal e seu princípio da função social da propriedade, inclusive prevendo a concessão de uso de imóveis públicos.
– Algumas famílias vivem no local há mais de 50 anos e muitas delas dependem de renda de programas de assistência social, sem condições de adquirir uma nova moradia. Em nenhum momento, na documentação da universidade, há notícia de conflito no local ou de perturbação das atividades desenvolvidas pela instituição de ensino em virtude da ocupação daquele espaço. Assim sendo, o processo é absolutamente prejudicial aos moradores que ali se encontram, em nada contribuiria para a sociedade e os fins aos quais a administração pública está voltada – argumenta Ana Luisa.
Por meio de nota, a Ufrgs informou que está com processo de reintegração de posse desde 2009, quando o Ministério Público exigiu informações quanto a possíveis ocupações irregulares na Universidade.
A partir de um mapeamento que identificou os limites de suas áreas, foi constatada a ocupação irregular. Segundo o comunicado, "a UFRGS não tem intenção nem poderá fazer nenhuma obra no local, tendo em vista que área traz grandes riscos de desmoronamento (instabilidade geológica) e também abriga parte de uma Área de Proteção Permanente (APP)".
A área, segundo a universidade, "constitui-se em importante corredor ecológico unindo o Morro Santana aos demais morros em direção à zona sul da cidade". Além disso, "nunca houve autorização por parte da UFRGS para que fosse ocupada".
A universidade acrescenta que parte das moradias irregulares se localiza em área de intervenção de projeto exigido pelo Ministério Público Federal relativo à construção de um muro de arrimo e que, "como se trata de área de risco, do ponto de vista legal, não existe a possibilidade de regularização, pois apresenta clara ameaça de deslizamentos da encosta e, principalmente, à integridade das pessoas".