Dois meses depois do Laçador, outro gigante de Porto Alegre está passando por um check-up ao longo desta semana. A análise do monumento a Júlio de Castilhos antecede o restauro da obra e dá início aos trabalhos de revitalização da Praça da Matriz.
O diagnóstico é comandado pela engenheira metalúrgica Virgínia Costa e pelo restaurador de esculturas metálicas francês Antoine Amarger. Os especialistas e sua equipe contam com o auxílio de uma plataforma hidráulica, que os eleva até a altura das peças para o exame visual. Uma técnica chamada de fluorescência de raios X ainda deve ser utilizada – trata-se de um equipamento parecido com um secador de cabelo que ajudará a descobrir qual é a composição do bronze.
A equipe entregará um relatório com o diagnóstico ao final da análise, mas a engenheira adianta:
– Por dentro das peças, há uma série de armaduras e parafusos. Talvez tenha de se trocar alguma coisa que enferrujou e envelheceu antes da estrutura.
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Virgínia e Amarger também já constataram que o bronze está em boas condições e não tem muitos poros ou fissuras. Mas as fixações no granito apresentam problemas. A estátua que fica no topo do obelisco é a que mais chama atenção – os especialistas buscam entender de que forma ela foi encaixada para determinar se há risco de queda.
– Não é nada muito grave, mas tem coisas que precisam ser feitas para evitar o pior – tranquiliza a engenheira.
Amarger deve retornar ao Brasil para o restauro do Monumento a Júlio de Castilhos, previsto para começar em setembro. O especialista, que já trabalhou para museus como Louvre, Rodin, Picasso e Matisse, foi também o responsável pelo diagnóstico do Laçador em março. Sem polemizar, ele não aponta um preferido entre as obras de Caringi e Décio Villares.
A intervenção integra a primeira etapa de obras na Praça da Matriz, que inclui também a limpeza do granito e as reformas nas imediações do monumento – como a recolocação do piso de basalto, o realinhamento das escadas e o restauro das luminárias e dos balaústres (muretas laterais). O orçamento fica em torno de R$ 1,1 milhão, que vem do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) por meio do PAC Cidades Históricas.
A requalificação do restante da praça deverá ocorrer no próximo ano, na segunda etapa de obras.
Obra de importante momento político do país
A construção do Monumento a Júlio de Castilhos foi definida por lei em 1903, pouco depois da morte do político. As esculturas foram modeladas e fundidas em bronze e ferro na França, e a inauguração ocorreu em 1913. A obra é de Décio Villares, carioca que estava radicado na França.
O professor de escultura José Francisco Alves considera a obra um dos monumentos políticos mais importantes do Brasil. No livro A Escultura Pública de Porto Alegre, ele explica que o monumento atua como um verdadeiro discurso político dos ideais de Castilhos e de grande parte das elites governantes gaúchas entre o final do Império e a Revolução de 1930.
Saiba o que significam os elementos que o compõem, de acordo com a publicação de Alves:
– A figura de Júlio de Castilhos está no centro do monumento, segurando, na mão direita, o livro com os ensinamentos de Augusto Comte.
– Em torno dele, estão retratadas as virtudes pelas quais sua vida foi erguida: uma figura masculina seminua segurando em uma das mãos um ramo de louros, que representa a coragem; uma escultura feminina que aponta para o vulto do dragão aproximando-se da escadaria aos pés do monumento, que representa a prudência; uma sentinela em veste militar, meio romana e meio medieval, representando a firmeza; um homem de porte atlético e feições de velho, que representa a experiência; e a alegoria do civismo empunhando a Bandeira Nacional.
– No topo do obelisco de pedra, está a estátua Marianne, que representa a República. Ela está sentada sobre um globo com 21 estrelas, fazendo alusão aos Estados brasileiros de então.
– O monumento ainda é composto por uma estátua de um jovem que oferece um exemplar do jornal A Federação, órgão fundado com participação de Castilhos, um típico peão empinando o cavalo e saudando a República com seu chapéu, fazendo alusão à agropecuária, e duas estátuas de cães junto às escadarias de acesso ao conjunto, sentinelas que possivelmente simbolizam a atenção e a vigilância.